Originalmente publicado em 8 de dezembro de 2009
Perdi o gosto por comer. Perdi o gosto por ler. Perdi o gosto por reclamar. O que acontece quando se perde o gosto até pela obrigatoriedade de cagar? Hoje parece cada vez mais nítido que é demandado que eu não leia a fim de ainda viver respeitosamente. Comer, não precisamos estar tão a fim, podemos até nos empanturrar de cara feia. Eu até acho que cheguei ao absurdo do insípido e da indiferença: tanto faz meu pai ser um tolo. O que me move adiante é a inércia da reação automática e o princípio da equivalência. O conformismo é um pragmatismo ou “o”, porque o não-cumprimento é uma implosão. Dor de estômago crônica, parte já de mim, garganta ferrada… quanto tempo até expelir pus, complicar de fato? Sobreviver também é “secundário”; a missão, outra coisa que não importa, relativamente, vem à frente. Viver o presente. A riqueza e a beleza dum momento interminável indecifrável impoetizável. E a dor muscular e aquela vontade de fenecer, nem sei se respeito minha própria fadiga, minha própria necessidade fisiológica de sexo, meu remoto interesse por remoer sonhos. Que há? Nunca vi desbotado tão colorido. É o fim-meio de uma estações. Penso também na leveza pós-opressão. Na deposição dessa carcaça chamada curso. Aliás, de vivos e mortos, e de latrinas ambulantes. Melhor do que ver que já esqueceram da minha presença é saber que eu ainda me antecipo e os supero na má educação. Resignar-se até a uma das constatações mais duras, a da ausência de um amor, rompimentos que geram rompimentos, saber que as primeiras foram as últimas e matar a esperança de fome – pra ter indícios de que ainda vale a pena, pois ninguém me sufoca. A preocupação máxima é estilística: se vocês vão gostar, se vão parar.