LEWIS CARROLL #SérieOsÚltimosPolímatas

polímata

(po·lí·ma·ta)

adjetivo de dois gêneros e substantivo de dois gêneros

Que ou quem estudou e sabe muitas coisas ou muitas ciências (ex.: Santa Hildegarda era uma freira polímata; os polímatas são peritos em muitas áreas do conhecimento). = POLÍMATE, POLÍMATO

<polímata>, in Dicionário Priberam da Língua Portuguesa [em linha], 2008-2023, https://dicionario.priberam.org/pol%C3%ADmata.”

Traduzido do wikipedia English com algumas (muitas!) liberdades autorais…

Lewis Carroll

From Wikipedia, the free encyclopedia

 

Carroll em junho de 1857

Nascimento

Charles Lutwidge Dodgson
27 de janeiro de 1832
Daresbury, Cheshire, Inglaterra

Morte

14 de Janeiro de 1898 (aos 65 anos)
Guildford, Surrey, Inglaterra

Restos mortais

Mount Cemetery, Guildford, Surrey, Inglaterra

Ocupações

  • Escritor (atingiu a excelência)

  • Ilustrador

  • Poeta (atingiu a excelência)

  • Matemático (atingiu a excelência)

  • Fotógrafo (atingiu a excelência)

  • Professor

  • Inventor

Educação formal

Gêneros literários

  • Literatura fantástica

  • Literatura infantil

  • Matemática > Álgebra linear

  • Matemática > Lógica

  • Poesia

  • Política > Teoria do voto

  • Nonsense

Pais

Charles Dodgson (pai)

Família

 
 

O inglês Charles Lutwidge Dodgson (1832–1898), mais conhecido por seu nome de autor Lewis Carroll, foi escritor de prosa e poesia, matemático e fotógrafo, principalmente. Seus maiores trabalhos são Alice no País das Maravilhas (1865) e sua continuação (…) Através do espelho (1871). Se o considerava talentoso para os jogos de palavra, raciocínio lógico e criações fabulosas e imaginativas. Seus poemas em Jabberwocky (1871) e The Hunting of the Snark [ver tradução melhor] (1876) são considerados precursores da literatura do não-senso.

Carroll vem de uma família tradicional de anglicanos, tanto que toda sua educação formal se deu na Christ Church, onde também morou e lecionou a maior parte de sua vida.

Alice Liddell (1852-1934) – filha de Henry Liddell, o reitor de Christ Church – é quase tão famosa quanto Carroll e quase unanimemente identificada como a principal inspiração para seu personagem mais celebrado. Em vida, entretanto, Carroll negava veementemente que a Alice dos livros fosse inspirada por ou apenas pela menina dos Liddell.

Um ávido montador e propositor de quebra-cabeças, Carroll criou o jogo de word ladder (que ele chamava “doublets”, uma espécie de jogo de adivinhação de palavras, ou melhor, associação lógica de palavras),¹ publicados semanalmente em sua coluna da revista Vanity Fair (revista vitoriana que durou quase meio século) entre 1879 e 1881.

¹ Já podemos dizer que esse aparato é mais sofisticado que qualquer “metodologia” pseudanalítica de um século mais tarde.

(…)

Infância

(…) Maioria de seus antepassados masculinos eram oficiais do exército ou pastores da igreja. Seu bisavô chegou a bispo de Elphin no interior da Irlanda. Seu avô paterno, outro Charles, foi capitão do exército, morto em combate em 1803, quando o pai e os tios de Carroll não passavam de bebês. (…) Talento nato para a matemática, igual se mostraria o filho, o professor Dodgson poderia ter escolhido o caminho exclusivo do bacharelado. Em vez disso, ele preferia uma vida mais seclusa. Casou com a prima Frances Jane Lutwidge em 1830 e se tornou um modesto pároco de província.

Dodgson (Lewis) era a terceira de onze crianças do casal, sendo o primeiro menino. Aos 11 anos, mudou-se para Yorkshire devido a uma promoção de seu pai. Esta foi sua casa pelos próximos 25 anos de sua vida. Seu pai era um religioso extremamente ortodoxo e chegaria ainda ao cargo de Arqui-deão/Arqui-decano de Richmond. Era um polemista em questões de moral e cismas religiosos. O maior ídolo do homem era John Henry Newman (polímata e santificado pela igreja católica em 2019!), líder do Tractarian movement (a redação de um número de panfletos que queria dogmatizar a igreja anglicana especificamente inglesa à parte de outras conformações, como a da Irlanda).

Seu filho homem mais velho, nem precisamos dizer, não herdou todas as concepções ortodoxas e aristocráticas de seu progenitor, tendo preferido ser autor e professor de matemática antes de deão. Aos 7, Carroll, segundo anotações da família, lia livros para adultos – posto que montados sobre complicadas alegorias – como The Pilgrim’s Progress (…) de Bunyan. Ele e vários de seus irmãos e irmãs eram gagos, o que limitava suas perspectivas sociais. (…)

Auto-retrato circa 1856, aos 24.

Alegadamente, segundo seu diário, no período de 3 anos em que estudou na Rugby School Dodgson (e todos os mais jovens ou novatos), sofreu bullying. (…) Seu sobrinho Stuart Collingwood escreveria mais tarde: “Muito embora seja difícil de figurar meu tio como alguém diferente dessa persona meiga e retraída que todos conhecem, é também verdade que, mesmo anos depois de deixar de ser um estudante, seu nome era ainda recordado como o de alguém que sabia usar os punhos em auto-defesa dos mais fracos quando necessário”, referindo-se principalmente a lutas em que Lewis defendia não a si mesmo mas as outras vítimas de assédio da escola.

Em matemática, nunca vi alguém tão dotado em todos os meus anos na Rugby School quanto Dodgson”, escreveu o professor da instituição R.B. Mayor. (…) Seus estudos nesta instituição duraram de 1846 a 1849, no que poderíamos equivalê-los ao nosso ensino médio. Em maio de 1850 Dodgson já estava matriculado em Oxford na disciplina que tanto notabilizou não só a ele, mas a sua família como um todo, como se corresse no sangue. Apenas dois dias após o início das aulas, Lewis foi convocado para voltar ao lar: sua mãe havia morrido de uma “inflamação no cérebro”, talvez decorrente de um surto de meningite, ou um derrame, provocado ou não por alguma forte pancada. Ela tinha apenas 47 anos.

Seus anos na academia transitaram, segundo ele mesmo em seus diários, entre corresponder ao status de gênio que lhe era imputado pelos mais velhos e uma incrível capacidade de distração e “desleixo” para com a seriedade excessiva do ambiente. Em 1852 ele obteve uma menção honrosa como um dos mais destacados alunos da Universidade. Isso valeu-lhe uma bolsa oferecida pelo amigo de seu pai, o cânone da igreja Edward Pusey. Em 1854, imediatamente antes de se formar, adquiriria outra menção honrosa.

(…) Quando não atuava, de forma contínua ou intermitente, como professor da instituição na qual se formou, Lewis desempenhava uma miríade de cargos honoríficos, como o de sub-bibliotecário da própria Christ Church, algo parecido com a reitoria ou pró-reitoria da instituição.¹ (…)

¹ Assim como a denominação secretário, bibliotecário sofreu, no mundo profissional e na língua portuguesa, grande “baque” ou “recessão”…

Personalidade e aparência

Problemas de saúde

Fotografia de 1863 por Oscar G. Rejlander

Charles Dodgson, uma vez adulto, tinha cerca de 1.83m e era muito magro. Tinha cabelo encaracolado castanho e olhos entre azul e cinza (difíceis de definir conforme cada testemunho diferia). Foi descrito em seus anos finais como um “senhor excêntrico”, assimétrico, um tanto falto de harmonia e bizarro. Suspeita-se que esse quadro não seria veraz, dadas indicações de que também já havia possuído porte atlético, não fosse por uma lesão crônica no joelho que adquiriu à meia-idade.

Quando era criança sofreu de uma febre que o deixou surdo de um ouvido. Aos 17, teve um ataque severo de coqueluche, o que talvez explique a fraqueza de seus pulmões durante toda a vida madura. Sua gagueira permaneceu oscilante e relativamente controlada, mas de modo geral incurada, hoje um de seus traços mais conhecidos. A principal instância desse fato está auto-parodiada pelo Dodo (animal extinto no mundo real e que repetia sílabas, já no nome) de Alice no País das Maravilhas.

(…)

Lewis viveu em tempos em que a “alta sociedade” exigia certa fluência oratória, quando não talento lírico para as músicas e serões em grupos e bailes. Mas parece que Lewis não era mau cantor, nem se intimidava diante do público, assim como recitar poemas ou predicar a fé não lhe eram situações problemáticas. Outras de suas renomadas especialidades são a mímica e o conto improvisado de estórias (assim começou Alice no País das Maravilhas, inclusive). Melhor ainda, era um grande charadista.

Conexões

Entre seus primeiros escritos e o mega-sucesso da dobradinha Alice, Dodgson participava ativamente de um círculo de intelectuais “pré-rafaelitas” (eruditos e rebuscados, desejosos de disseminar uma cultura que antecedia mesmo o neo-classicismo, ainda que não fosse gótica como a da idade média). Assim foi que ele conheceu John Ruskin¹ em 1857. Em 1863 entabulou relações com Dante Gabriel Rossetti e sua família. Rossetti era outro polímata: poeta, pintor, tradutor. Outras celebridades do círculo eram William Holman Hunt, Arthur Hughes e John Everett Millais. Mas aquele autor com características mais similares as suas talvez fosse George MacDonald, nem que somente por haver se notabilizado pela autoria de obras “para crianças”. Na verdade parece que a entusiástica recepção dos esboços de Alice pelos filhos deste último encorajaram Carroll de forma decisiva para empreender sua reescrita e publicação finais. Carroll, notório fotógrafo, tiraria muitas fotos da família MacDonald e também da família Rossetti em seus jardins em Chelsea.

¹ Mais um polímata britânico do XIX retroativamente acusado pelos acadêmicos de pedófilo.

Política, religião e filosofia

Dodgson seguiu minimamente a tradição de seu pai: era um conservador purista em todos os tópicos sociais, mesmo os do pensamento humano, quando não acabava atingindo verdades póstumas via insights em suas novelas. Martin Gardner descreve Dodgson como um Tory preconceituoso e esnobe com as classes trabalhistas, o que nos causa estranheza. William Tuckwell, em Reminiscências de Oxford (1900), entendia-o como “austero, tímido, preciso, absorvido por demais em esquemas matemáticos, muito autoconsciente de seu senso de dignidade, algo conservador além do que parecia confortável a sua própria natureza, como que por inércia ou razões de família, e, enfim, prisioneiro de preconceitos vitorianos”.

(…)

Dodgson também foi um membro-fundador da Sociedade para a Pesquisa Psíquica, e ele era um claro defensor da teoria da telepatia (em Sílvia e Bruno dedica todo o poder e fé a essas crenças ao seu eu-lírico).

(…)

Na arte

Uma das ilustrações de Carroll

Literatura

Desde a adolescência se dedicou aos poemas e pequenos contos. Havia uma revista da família, Mischmasch, em que contribuía. Quando esses escritos foram revividos por publicações profissionais, obtiveram sucesso moderado. Nos anos 1850 ele se tornaria um autor nacionalmente conhecido (antes de Alice, quando se tornou mundialmente consagrado). Destacava-se mais nas publicações que fossem bem-humoradas, satíricas, etc.

Uma de suas peças de teatro para serem encenadas por marionetes por suas irmãs, nunca publicada em seus tempos, sobreviveu para nosso escrutínio: La Guida di Bragia. Seu primeiro poema realmente famoso foi Solitude (Solidão), num exemplar de The Train, em que Dodgson já usava o alter ego ou pseudônimo Lewis Carroll, a partir dali indissociável de sua carreira literária não-acadêmica. (…) Participou da escolha de seu nome artístico um dos editores de suas obras, Edmund Yates. Ele vetou outros nomes sugeridos por Dodgson: Edgar Cuthwellis, Edgar U.C. Westhill e Louis Carroll!

Os livros de Alice

The Jabberwock, ilustrado por John Tenniel, mais famoso pelas caricaturas dos dois volumes de Alice. Uma parte deste poema, autocontido, está em Através do Espelho.

Em 1856 o autor conheceu Henry Liddell e sua família. Não só o pai da família se tornou seu confidente (e basicamente patrão, pois era figura importante de Oxford) como a esposa Liddell, Lorina, e suas crianças também lhe amigaram muito rápido. Eram três irmãs mulheres, Lorina a Filha, Edith e Alice, a caçula. Em geral a Alice da pena de Lewis não lembra Liddell, realmente, em seus atributos físicos e em grande parte de sua personalidade infantil. É curioso, ainda mais em vista do que diremos a seguir sobre o “escândalo Carroll-Liddell”, que Lorina conste como figura proeminente no epílogo de País das Maravilhas…

Outra “pequena musa” de suas obras foi Gertrude Chataway (já de uma época em que Alice Liddell era uma mulher adulta), a quem dedica um poema com acrósticos no prelúdio de The Hunting of the Snark. Isso não sugere, ao contrário das lendas urbanas muito ou pouco exageradas no caso dos livros de mais fama, que Gertrude tenha sido tal e qual transposta para a narrativa ou tenha sido uma inspiração essencial da obra. Encara-se como uma simples dedicatória, como todo autor tem o direito de fazer, e costumeiramente o faz.

O que não nos permite tecer conclusões cabais de nenhum tipo sobre a força ou intensidade das relações com suas “musas” é que os diários do autor de 1858-62 estão irremediavelmente perdidos para nós. Isso não nos veda o conhecimento de que Lewis era realmente amigo íntimo da família Liddell e passeava de barco/gôndola com as crianças do casal em fins de semana e feriados, por exemplo, nas águas que circundam a Universidade de Oxford. Parece que a amizade com filhos de conhecidos não se mantinha após crescerem, no caso de Dodgson, mas com Alice Liddell a fofoca e as lendas urbanas atingiram o nível máximo na imprensa e nos estudos acadêmicosb.

(…)

Graças ao sucesso do primeiro livro de Alice, Dodgson se viu, pela primeira vez na vida, essencialmente um homem rico e independente. Anedoticamente se conta que a própria Rainha Vitória se enamorou tanto do livro que teria instado o autor a dedicar seu próximo livro a ela, mas este não foi um livro infanto-juvenil, e sim um maciço volume acadêmico chamado An Elementary Treatise on Determinants (Tratado Elementar sobre Determinantes Matemáticas). Mas, como com a frase “os boatos de minha morte foram um tanto exagerados”, podemos suspeitar da veracidade desta lenda: a dedicatória existe, porém não há registro fiável de que a rainha Vitória tenha feito esta súplica de homenagem.

Mesmo com o ganho satisfatório advindo de suas publicações, contudo, Lewis seguiu em Christ Church, como um professor comum. A continuação da primeira parte de Alice (não que a estória tenha terminado inconclusa) demoraria quase uma década, Através do Espelho. É um livro mais sinistro e sério, como aliás seria a tendência para Sílvia e Bruno, dificilmente catalogável, em sua metade “menos élfica” como “livro de crianças”!

Como sempre, os críticos querem encontrar em circunstâncias pessoais os motivos para o tom mais melancólico de uma obra, neste caso uma duologia que, dizem, começa muito mais alegre do que termina: o pai de Lewis morrera em 1868, entre as duas publicações. Fato muito fraco para ser causa de uma mudança de estilística ou de sentimento e humor num autor de grande envergadura.

The Hunting of the Snark¹

¹ Snark é uma criatura mitológica inventada por Carroll, portanto não me cabe traduzir o nome. O restante do livro sim: A Caça ou Caçada ao Snark.

Trata-se de um poema épico eivado de nonsense. Henry Holiday substitui Tenniel como seu ilustrador desta vez. Talvez seja uma releitura do mito de Ahab-Moby Dick. Entre 1876 e 1908 o livro teve 17 reimpressões, outro sucesso incontestável, desta vez noutro gênero. Hoje é comum vê-lo transposto para musicais, óperas, peças e músicae, embora muito menos lido que Alice, o que não é difícil, uma vez que Alice é um dos livros mais lidos de todos os tempos. Ainda falta o filme, bem como um maior reconhecimento para o legado de Sílvia e Bruno. Voltando a Snark, Dante Gabriel Rossetti costumava dizer que o poema era inteiro sobre ele.

Sylvie and Bruno

Como três/duas décadas atrás, eis Carroll produzindo um livro para o público infanto-juvenil em dois volumes mais uma vez, Sílvia e Bruno, um casal de irmãos-fada, numa trama um tanto mais elaborada que as anteriores, embora cheias dos mesmos jogos de palavras e absurdos temáticos encantadores sob a pena de Carroll. Na verdade há duas main plots que se desenvolvem de forma ora paralela, ora complementar, num enredo espiralado e interdependente. Um é o mundo real da Inglaterra interiorana cujo protagonista é um senhor idoso suscetível à crença nas tais fadas (muito parecido com o próprio Carroll em seu temperamento e humor) – este senhor não é chamado por um nome próprio no decorrer de todo o livro. (O Seclusão postará seus principais trechos em poucos dias.) A outra metade é dedicada às desventuras dos pequenos irmãos exilados de Exotilândia, peregrinos de Elfolândia e outros países ou mundos de faz-de-conta que vivem nos interstícios do nosso, neste enredo. A obra tem bastantes mensagens crít(p)icas e conteúdos inapreensíveis para pessoas demasiadamente jovens sem muita semelhança com a precocidade intelectual do próprio Dodgson, o que me permite situá-la na literatura universal do mais alto nível sem constrangimento algum. Mesmo não fazendo tanto sucesso comercial (comparativamente), o livro nunca esgotou seus exemplares ou saiu de circulação, recebendo reimpressões constantes, em mais de um século.

Hobby (em alto nível) da fotografia (1856–1880)

Foto de Alice Liddell tirada pelo próprio Lewis Carroll (1858)

Em 1856 Dodgson descobriu a nova arte da fotrografia e a abraçou por completo, sob influência de um primo, Skeffington Lutwidge, e do colega oxfordiano Reginald Southey. Em pouco tempo ver-se-ia que Carroll não era só um entusiasta da nova tecnologia e meio de expressão artística imagético, tendo muito tato e senso estético para suas imagens, como um fotógrafo vocacionado atual.

Um estudo exaustivo de Roger Taylor e Edward Wakeling conseguiu reunir todos os retratos sobreviventes do autor (https://www.abebooks.com/9780691074436/Lewis-Carroll-Photographer-Taylor-Roger-0691074437/plp). O objeto favorito de Carroll eram garotas pré-púberes (cerca de 50% de suas modelos fotográficas). Estima-se que mais da metade das fotos tiradas por Dodgson foram destruídas pelo autor antes de sua morte ou por seus parentes, talvez mediante pedido do autor em testamento. Ele também fez estudos de paisagens, garotos e homens adultos. Mesmo objetos inanimados: esqueletos, bonecas, estátuas, pinturas (primeiras instâncias de um mélange ou intersemiótica de fotografia e outras artes?); ou então animais, principalmente cães, e a vida vegetal. Sempre que fotografava crianças ele mantinha um dos pais como testemunha em toda a sessão. A famosa foto acima, uma das que nos permite conhecer a fisionomia da Alice “verdadeira”, foi tirada nos jardins da propriedade dos Liddell: era comum àquele tempo ser melhor tirar fotos aproveitando-se da luz solar, pois não havia ainda bons estúdios de fotografia nem lugares fechados com iluminação hoje dita profissional.

The Rossetti Family, Lewis Carroll (1863). L-R: Dante Gabriel RossettiChristina RossettiFrances Polidori e William Michael Rossetti

A fotografia de pessoas célebres também valeu-lhe contatos importantes e dinheiro: John Everett MillaisEllen TerryJulia Margaret CameronMichael Faraday (um dos nossos polímatas da série!)Lord SalisburyAlfred Tennyson.

Em 1880 Dodgson se aposentou da fotografia (foram 24 anos de carreira). Ele tinha um lugar para armazenar seus retratos no sótão de Tom Quad. O aposento constituía um acervo de 3 mil imagens. Como dito, conhecemos hoje menos de mil, então é uma estimativa, no melhor dos mundos. Algumas fotos foram perdidas unicamente pelo desgaste do tempo e não-atendimento dos requisitos de preservação do suporte, não por negligência, mas pela precocidade técnica do trabalho de Carroll.

Como fotógrafo da velha guarda, seu método de revelação estava se tornando obsoleto e ele tinha de perder muito tempo com fotografias, o que o privava das delícias da literatura e da matemática, daí sua “aposentadoria” anunciada, bem antes do fim de seus anos ativos.

Matemática

Pintura-retrato póstuma de Lewis Carroll por Hubert von Herkomer.

Suas sub-especialidades eram os campos da geometria, álgebra linear, álgebra de matrizes, lógica e matemática recreativa (podendo ser considerado o pai da ‘disciplina’), tendo escrito quase uma dúzia de livros no assunto, com seu nome de batismo, não Lewis Carroll.

Dodgson produziu a primeira prova impressa do Teorema de Rouché-Capelli; contribuiu com novas idéias e conceitos em probabilidade e estudos de eleições (“método Dodgson”).

Lógica

Esse é um legado redescoberto somente na segunda metade do século XX. Martin Gardner e William Warren Bartley III parecem ter voltado a situar Carroll no âmbito dos lógicos de relevo. Seu volume II dedicado à lógica é especialmente recomendado.

Álgebra

A condensação de Dodgson é uma maneira de avaliar determinantes. Esses foram os passos iniciais para o desenvolvimento de um novo teorema algébrico.

Matemática como passatempo

Fosse vivo durante a Segunda Guerra, é de supor que Carroll pudesse ajudar os Aliados contra os alemães, pois algumas de suas proposições sobre criptografia seguem bastante atuais. Para um homem que viveu antes dos computadores, essa é uma faceta marcante.

Correspondências

Estima-se que Dodgson tenha escrito e recebido espantosas 98.721 cartas. Poderíamos chamá-lo de Pelé das cartas.

Anos finais¹

¹ Odiaria ter uma página no wikipedia com essa seção contando minha vida.

 

 

Lewis Carroll retratado na terceira idade

Dodgson pouco mudou sua rotina após a fama e a riqueza, como dito. Uma de suas poucas aparições públicas, por exemplo, se deu na estréia de Alice no País das Maravilhas no teatro, no País de Gales, 30 de dezembro de 1886. Parece que a única ocasião em que viajou para fora do Reino Unido foi quando conheceu a Rússia em 1867, numa missão eclesiástica com o reverendo Henry Liddon. Na volta, parece ter feito escalas em cidades da Bélgica, Alemanha, Polônia e França, conforme seus diários. A partir dos 60 anos sua mobilidade foi severamente comprometida pela artrite e a gota. Sua causa mortis foi pneumonia seguida de influenza.

Controvérsias

Sexualidade de Carroll & Algumas considerações sobre o surgimento da arte da fotografia

Biógrafos do fim do século XX, com a pauta finalmente em moda, começaram a se questionar sobre a homossexualidade e a possível classificação de Dodgson como pedófilo, mas é importante ressaltar que para que esse diagnóstico seja válido ao se referir a pessoas de séculos anteriores a documentação comprobatória precisa dar respaldo, mais ainda do que para biografias contemporâneas, com testemunhos, testes, dentre outras evidências muito mais acessíveis. Mais do que trabalho historiográfico, a grande parte do que se publicou sobre o tema até hoje parece jornalismo marrom ou tentativa de vender mais exemplares, alimentando polêmicas anacrônicas. Para exemplos da conduta, vd. Morton Cohen, Lewis Carroll: A Biography, 1995; Donald Thomas, Lewis Carroll: A Portrait with Background, 1995; Michael Bakewell, Lewis Carroll: A Biography, 1996. Veja que todas as biografias são produtos de um tempo (uma década histérica com a Aids, talvez, e de retrocesso nas conquistas de liberação pós-guerra?)

 

 

Fotografia carrolliana de Beatrice Hatch, parente em grau distante de Aldous Huxley.

Circulam fake news de que Dodgson teria pedido a mão de Alice Liddell em casamento, mas essa informação não é encontrada em nenhuma de suas quase 100 mil correspondências, o que deveria servir de alerta ao baixo nível das biografias acadêmicas do autor.

(…)

Do lado dos historiógrafos mais honestos e menos sensacionalistas podemos encontrar Hugues Lebailly (Through a Distorting Looking-Glass: Charles Lutwidge Dodgson’s artistic interests as mirrored in his nieces’ edited version of his diaries; Charles Lutwidge Dodgson’s relationship with the weaker and more aesthetic sex re-examined). A era vitoriana promovia uma espécie de culto divino da infância e da criança, mesmo do corpo a-erótico das crianças. É natural que um homem do período desenvolvesse uma carreira vicária de fotógrafo com estes gostos em mente, e que fotos com roupas de luxo, simulando certa pobreza ou espontaneidade (a criança coberta de farrapos, ou como que em roupa de cama, surpreendida ao acordar) e até mesmo nus completos não produzissem o menor choque social – pelo contrário, era como retratar anjos visíveis. Palavras como pornografia e abuso infantil estavam longe sequer de ser cunhadas ou debatidas.

Longe de ser uma exclusividade de Carroll, muitos profissionais do período e do local são notáveis no campo da Estética por tratar exclusivamente do assunto e contribuir em Estética e Moda das perspectivas infanto-juvenis, como Oscar Gustave Reilander¹ (quem trabalhou com Darwin) e Julia Margaret Cameron (a mãe do close-up, até hoje uma das maiores influenciadoras de nosso imaginário plástico dos maiores gênios que estudamos desde a escola via livros-textos, pois dela são algumas das fotos mais difundidas de ingleses de renome; ataques misóginos no período – que surpresa! – classificavam seus “cliques” atemporais como “borrados e fora de foco” – nem Bernard Shaw² deixou de dizer as maiores asneiras sobre Julia Cameron, ainda que obrigado a reconhecer seu talento… para fotografar homens velhos!). “Nus” de crianças apareciam vulgarmente em cartões postais britânicos a cada comércio de esquina, então não é como se fossem uma commodity para “aficionados” ou “doentes”, como seriam considerados hoje. Não há como condenar Dodgson sem condenar um período histórico inteiro (e ainda assim estar-se-ia correndo o risco de cometer grave injustiça) – disso os biógrafos incautos deveriam ser avisados, se ousam tecer conclusões de longo alcance a fim de vender livros mais facilmente.

¹ A propósito, através dessa página encontrei essa outra e estou aqui gargalhando há 5min: https://en.wikipedia.org/wiki/Victorian_headless_portrait. Etimologia da lenda do cavaleiro sem cabeça (ou um dos epifenômenos dessa obsessão inglesa)?

² Um dos últimos reacionários com cérebro do planeta Terra.

Karoline Leach vai mais longe e entende o retrato (no pun intended) que se faz de Lewis como “desinteressado de mulheres adultas” como uma grande mitologização e falsificação da vida do autor, o que ganhou até nome próprio para larga utilização: O Mito de Carroll. Os primeiros biógrafos erraram sutilmente a esse respeito; os de uma segunda geração, utilizando os primeiros como referência, ampliaram o erro ao entender “eco” como “informação” inquestionável, até que o mercado de biografias de Carroll se tornasse indistinguível do mau jornalismo de superfície, com lupas que magnificavam os erros dos biógrafos precedentes.

Algumas das famosas “amiguinhas” de Carroll, como chamam suas modelos pejorativamente, porque assim ele as tratava nas cartas, sem por isso significar algo jocoso, que os biógrafos que o acusam de pedofilia gostam de citar como “prova”, com as quais ele se correspondia, tinham mais de 18 anos de idade, por exemplo. Imoralidade não deve ser confundida com ilegalidade nesse aspecto idiossincrático – se verdadeiramente idiossincrático – do eminente pastor-matemático-poeta-fotógrafo! Langford Reed, por fim, para citarmos novamente alguém do campo anti[t]ético, propôs em 1932 uma tese um tanto “leonardodicapriana” para os interesses interpessoais de Carroll: ele, alega o autor da biografia dos anos 30 do século passado, descartava suas amizades femininas quando elas chegavam aproximadamente ao aniversário de 14 anos. Como vimos no caso da família Liddell, a razão do “rompimento” pode ser de ordem completamente não-relacionada com o envelhecimento da criança-modelo (inclusive pode ter relação com ciúmes e paranóia dos pais da agora púbere rebenta, num tempo em que se fazia legitimamente a côrte a mulheres assim que elas já haviam visivelmente menstruado – e não falo de jovens de barba espessa, mas de sessentões ou setentões, muitas vezes). Outros defendem que Carroll era homossexual e usava essas correspondências para tentar camuflar o fato, que era contravenção conforme a Inglaterra do período ou pelo menos pecado na consciência de alguém tão religioso, sabendo-se que dificilmente um aristocrata britânico teria de cumprir pena pelo crime do “amor proibido”.

O claustro e não-ordenação

Dodgson deveria ter sido ordenado para viver em claustro cerca de 4 anos após ter completado seus estudos como matemático na Christ Church. Mas essa circunstância foi inúmeras vezes adiada e Carroll acabou sendo sempre um “leigo”, isto é, um pastor comum de sua congregação, e não alguém mais retirado da vida, um “monástico” (a igreja anglicana possui tantos pontos em comum com o catolicismo – vedação do sexo fora ou mesmo dentro do casamento sem fins reprodutivos, quando não do casamento em si – quanto com o protestantismo, dependendo da seita em questão).

Algo dos possíveis tormentos um tanto herméticos e apenas psicológicos de Carroll no que diz respeito a sua condição de pecador pode ser distinguido nas entrelinhas da narração em primeira pessoa da ficção Sílvia e Bruno, que comparado com Alice no País das Maravilhas, livro sem referencial religioso algum (dir-se-ia, bastante pagão), é uma verdadeira gospel novel.

Os diários perdidos

Pelo menos 4 volumes completos e 7 páginas de texto de outros diários estão faltando, num total de 13 volumes dos diários de Lewis Carroll. Não se sabe explicar o desaparecimento. A remoção das páginas aleatórias dentre os volumes preservados, por exemplo: especula-se que seja obra dos herdeiros, a fim de preservar a imagem do autor em pontos sensíveis de sua biografia. Os períodos mais afetados por essas omissões são 1853 a 1863 (dos 21 aos 31 anos de Lewis). Há especulações, no mesmo montante, de que fossem poemas abertos sobre interesses homossexuais, numa análise contextual de em que períodos Carroll mais produziu poeticamente (justamente esse intervalo). Novamente, especulações com algo de razão, porém sem qualquer evidência.

 

Descoberta documental (não-conclusiva) de 1996 (Karoline Leach): mais um indício apoiando que ambas as famílias jamais trataram de propostas matrimoniais entre “Carroll” Lutdwidge e Alice Liddell.

Parece que a principal causa do rompimento havido entre Carroll e a família Liddell (que não foi definitivo, mas que esfriou a relação entre as partes de modo irreversível) tinha razões bem menos nobres, se se confirma a veracidade do conteúdo da imagem exposta acima –– outros diriam: bem menos escandalosas ––, que uma negativa de Alice (na verdade o pai de Alice) em se casar (que sua filha se casasse) com Dodgson. Havia boatos, na casa paterna, de relações entre o escritor e uma certa governanta, ou mesmo com Lorina Liddell, a irmã mais velha de Alice (em idade legal para contrair o matrimônio, a propósito). Na verdade, pior ainda, Lorina podia ser a própria mãe de Alice, já que o nome da primeira filha e da mulher do Sr. Liddell era o mesmo! Affair socialmente escandaloso, sem dúvida, mas absolutório de Carroll no quesito “pedófilo que gostaria de casar com sua principal musa inspiradora” (o que nos importa neste séc. XXI, assumo), para a decepção de muitos tablóides acadêmicos extemporâneos! Caso isso pudesse ser provado efetivamente, e não apenas apontado com um pouco mais de probabilidade (só o que há são “fofocas” provenientes de uma página muito tardia redescoberta, realmente suprimida do diário, mas não-escrita pelo próprio Carroll, mostrando que ele foi alterado entre sua morte e sua divulgação, que bate com a data do rompimento nas relações familiares, em que constam essas explicações mais fundamentadas no senso comum – testes caligráficos apontam para as anotações serem das sobrinhas de Carroll, que alegavam não querer manchar a reputação da governanta para terem suprimido a página depois, enquanto que há outra vertente que acredita na declaração do sobrinho-neto de Carroll de que foi ele o autor da entrada no diário, baseando-se, de qualquer maneira, em ouvir-dizer corrente na família), realmente seria o maior marco ou revolução epistemológica desde que biografias de Carroll começaram a ser escritas, digno de um grande mea culpa dos especuladores em relação a Lewis Carroll! A página acima segue, entretanto, como curiosidade pitoresca sobre esta inútil polêmica.

Enxaqueca e epilepsia¹

¹Esta seção deveria obviamente estar em Problemas de saúde, não como tópico separado.

Na década de 1880 Dodgson descreveu em detalhes suas crises de enxaqueca com aura. Curiosamente, uma vertente de enxaqueca foi batizada de Síndrome de Alice no País das Maravilhas por médicos posteriores, graças aos efeitos visuais lisérgicos decorrentes da crise (há a sensação corpórea, concomitante, de aumento e diminuição do tamanho dos corpos em volta).¹

¹ Eu mesmo padeci de uma dessas crises (embora minhas enxaquecas, sempre com aura, sejam bastante raras) num momento fundamental de minha adolescência em que fui falsamente acusado pelos meus pais de empreender ações horríveis (namorar uma suposta prostituta-cafetã – acusação que na verdade partiu – e foi facilmente crida – de um trote da cunhada má, irmã da difamada, nas quais meus pais caíram como patos sem solicitar qualquer evidência além de uma convicta voz na ligação de telefone, como caem em qualquer conversa para boi dormir, de golpes de cartão a Bolsonaros…).a Com o tempo, o sistema de mentiras que eles (meus pais) erigiram para me difamar voltou-se contra eles, e as doenças auto-imunes também deixaram de me afetar para afetar Nadir Gomes e José de Jesus Ferreira ao invés. Enantiodromia psicossomática hereditária? Somatização enantiodrômica intergeracional? Destino trágico-irônico? Chamem do que quiser! Eu chamo de BBB: burlesco, belo e moral.

a Anos depois, ironicamente, a mesma pessoa (a cunhada caluniosa), com o mesmo expediente (telefonar para os meus pais) conseguiu realizar o efeito contrário na mente deteriorada de meus lamentáveis progenitores: num contexto diferente, em que as duas tinham se reconciliado e eu era “o ex tóxico da estória”, a irmã de minha ex-namorada (quero deixar claro que esta ex-namorada nunca foi prostituta, nem cafetina, nem agia como qualquer dessas coisas, como nas ilações feitas pela própria irmã meses antes!! parece que não só a minha família é um poço de lodo covarde e deletério…) comunicou aos meus pais que me processaria por tê-la eu ofendido no scrapbook do finado Orkut! Meu pai, machão como sempre, disse que se algo assim se repetisse eu não poderia concluir minha faculdade privada de jornalismo, que ele a duras penas (falso!) custeava, pois pararia de me financiar no ato.aa

aa Mais curiosamente ainda, numa dessas reviravoltas típicas na vida de pessoas sem-cérebro (falo do meu pai, que infelizmente tinha dinheiro e o monopólio sobre minha existência, quando eu era um jovem desempregado de 20 anos), ele revoltou-se anos mais tarde quando eu desisti voluntariamente da faculdade de jornalismo, pois não desejava mais seguir aquela profissão, e ser-me-ia fácil largá-la de imediato, uma vez que já inclusive cursava em simultâneo sociologia na Universidade de Brasília e comunicação social nessa pós-graduação de direito privado… Agora, porém, o “machão” não podia dizer que sem seu dinheiro eu não poderia me formar (numa instituição pública), e que ele era o deus-mecenas de minha existência presente-futura… Havia perdido um grande poder, ou sensação de poder, que os idosos usam no lugar das ereções! Ele não deixou, contudo, e hipocritamente, de estrebuchar-se por meia hora sobre os recursos que havia jogado fora em minha educação, só para que eu desistisse dum curso em que eu era excelente aluno (e do qual ele ameaçou me desmatricular se eu xingasse uma verdadeira RAMEIRA REPRODUTORA DE MENTIRAS EM SÉRIE num perfil de rede social, recapitulemos). Assim caminha a família tradicional brasileira: vários andares abaixo da família tradicional vitoriana, que já claudicava e não ia nada bem… Intermezzo talvez desnecessário neste post sobre Carroll, mas delicioso mesmo assim, uma vez que a página do wikipedia achou tão importante citar as enxaquecas com aura de Dodgson e tudo isso me veio à baila sub-repticiamente!

Três médicos teriam diagnosticado Carroll ao longo da vida, graças a alguns desmaios sem piores conseqüências, como epilético em algum grau, diagnósticos não-conclusivos (exatamente como muitos capítulos biográficos contendo opiniões fortes em forma de afirmações absolutas, mas nada mais). De qualquer maneira, foram tonturas ou mal-estares “epileptiformes” ou “epileptóides”, embora não epilepsia propriamente dita.

(…)

(Um último conselho aos editores do Wikipédia: parem de incluir informações irrelevantes ou não-confirmadas em seus artigos biográficos!)

Trabalhos completos

Literários

  • La Guida di Bragia, Ópera-Balada para Teatro de Marionetes (c. 1850)

  • Miss Jones”, música cômica (1862)

  • Alice’s Adventures in Wonderland (1865)

  • Fantasmagoria e Outros Poemas (1869)

  • Through the Looking-Glass,…and What Alice Found There [Através do Espelho…e o que Ela Encontrou Por Lá] (inclui a 1ª aparição de Jabberwocky e “A Morsa e o Carpinteiro”) (1871)

  • The Hunting of the Snark (1876)

  • Rhyme? And Reason? [Rima? Com ou Sem Sentido?, seria minha opção de tradução favorita] (1883) – tem vários poemas em comum com o livro de 1869 “Phantasmagoria”

  • Um Conto Emaranhado (1885) [Este título também seria ótimo como alternativa para Sílvia e Bruno.]

  • Sylvie and Bruno (1889)

  • A Pequena “Alice” (1890) [Ou “Alice para a Creche”, versão abreviada para crianças de 0 a 5 anos, segundo o próprio Carroll.]

  • Sylvie and Bruno Concluded (1893) [primeira aparição do 2º volume da obra, hoje vendida em vol. único]

  • Problemas de Travesseiro (1893)

  • O que a tartaruga falou para Aquiles (1895)

  • Três Crepúsculos e Outros Poemas (1898)

  • The Manlet (1903)

Matemáticos

  • Uma Sílaba de Geometria Algébrica Plana (1860)

  • O Quinto Livro de Euclides Tratado Algebricamente (1858; 1868)

  • Tratado Elementar sobre Determinantes, Com sua aplicação a equações lineares simultâneas e equações algébricas

  • Euclides e seus rivais modernos (1879), uma espécie de livro-híbrido entre literatura de não-ficção e pedagogia em matemática.

  • Lógica Simbólica Parte I

  • Lógica Simbólica Parte II (póstumo)

  • A Cifra do Alfabeto (1868) [sobre decriptação]

  • O jogo da Lógica (1887)

  • Curiosa Mathematica I (1888)

  • Curiosa Mathematica II (1892)

  • Uma discussão sobre os vários métodos para se conduzir eleições (1873), Sugestões para o melhor método de escrutínio popular, em que mais de dois assuntos devem ser votados (1874), Método de contagem de votos em mais de dois temas simultâneos (1876), todos compilados como Teoria dos Comitês e Eleições, editado, analisado e publicado em 1958 por Duncan Black.

Outros/miscelânea

  • Algumas Conhecidas Falácias sobre Vivissecção

  • Oito ou Nove Sábias Palavras sobre Escrever Cartas (1890)

  • Notes by an Oxford Chiel [Observações de um ‘Cara’ de Oxford, como nos referiríamos à gíria chiel, caída em desuso] (1865-74)

  • Princípios da Representação Parlamentar (1884) [não entendo por que não recairia em ciência política ou, ao menos, matemática, conforme os outros trabalhos de Carroll sobre votação]

Referências importantes

    1. ^ “Lewis Carroll Societies”. Lewiscarrollsociety.org.uk. Archived from the original on 29 March 2016. Retrieved 7 October 2020.

    2. ^ Lewis Carroll Society of North America Inc. Archived 26 March 2022 at the Wayback Machine Charity Navigator. Retrieved 7 October

    3. ^ Clark, p. 10

    4. ^ Collingwood, pp. 6–7

    5. ^ Bakewell, Michael (1996). Lewis Carroll: A Biography. London: Heinemann. p. 2. ISBN 9780434045792.

    6. ^ Collingwood, p. 8

    7. Jump up to:a b Cohen, pp. 30–35

    8. ^ McCulloch, Fiona (2006). “Lewis Carroll”. In Kastan, David Scott (ed.). The Oxford Encyclopedia of British Literature. Vol. 3: Harr—Mirr. Oxford, U.K.: Oxford University Press. p. 386. ISBN 9780195169218.

    9. ^ “Charles Lutwidge Dodgson”. The MacTutor History of Mathematics archive. Archived from the original on 5 July 2011. Retrieved 8 March 2011.

    10. ^ Cohen, pp. 200–202

    11. ^ Cohen, p. 4

    12. ^ Collingwood, pp. 30–31

    13. Jump up to:a b Woolf, Jenny (2010). The Mystery of Lewis Carroll: Discovering the Whimsical, Thoughtful, and Sometimes Lonely Man Who Created “Alice in Wonderland”. New York: St. Martin’s Press. pp. 24ISBN 9780312612986.

    14. ^ Collingwood, p. 29

    15. ^ Carroll, Lewis (1995). Wakeling, Edward (ed.). Rediscovered Lewis Carroll Puzzles. New York City: Dover Publications. pp. 13ISBN 0486288617.

    16. ^ Lovett, Charlie (2005). Lewis Carroll Among His Books: A Descriptive Catalogue of the Private Library of Charles L. Dodgson. Jefferson, North Carolina: McFarland & Company, Inc., Publishers. p. 329. ISBN 0786421053.

    17. ^ Clark, pp. 63–64

    18. Jump up to:a b Clark, pp. 64–65

    19. ^ Collingwood, p. 52

    20. ^ Clark, p. 74

    21. ^ Collingwood, p. 57

    22. ^ Wilson, p. 51

    23. ^ Cohen, p. 51

    24. ^ Clark, p. 79

    25. ^ Flood, Raymond; Rice, Adrian; Wilson, Robin (2011). Mathematics in Victorian Britain. Oxfordshire, England: Oxford University Press. p. 41. ISBN 978-0-19-960139-4OCLC 721931689.

    26. ^ Cohen, pp. 414–416

    27. Jump up to:a b c d e f Leach, Ch. 2.

    28. ^ Leach, p. 91

    29. Jump up to:a b c d e f g h i j k Cohen, pp. 100–4

    30. ^ Gardner, Martin (2000). Introduction to The annotated Alice: Alice’s adventures in Wonderland & Through the looking glass. W. W. Norton & Company. p. xv. ISBN 0-517-02962-6.

    31. ^ Gardner, Martin (2009). Introduction to Alice’s Adventures in Wonderland and Through the Looking-Glass. Oxford University Press. p. xvi. ISBN 978-0-517-02962-6.

    32. ^ Collingwood

    33. ^ Collingwood, Chapter IX

    34. ^ Hayness, Renée (1982). The Society for Psychical Research, 1882–1982 A History. London: Macdonald & Co. pp. 13–14. ISBN 0-356-07875-2.

    35. ^ Carroll, L. (1895). “What the Tortoise Said to Achilles”. Mind. IV (14): 278–280. doi:10.1093/mind/IV.14.278.

    36. ^ Blackburn, S. (1995). “Practical Tortoise Raising”. Mind. 104 (416): 695–711. doi:10.1093/mind/104.416.695.

    37. ^ Heath, Peter L. (2007). “Introduction”. La Guida Di Bragia, a Ballad Opera for the Marionette Theatre. Lewis Carroll Society of North America. pp. vii–xvi. ISBN 978-0-930326-15-9.

    38. ^ Roger Lancelyn Green On-line Encyclopædia Britannica Archived 9 May 2015 at the Wayback Machine

    39. ^ Thomas, p. 129

    40. ^ Cohen, Morton N. (ed) (1979) The Letters of Lewis Carroll, London: Macmillan.

    41. Jump up to:a b Leach, Ch. 5 “The Unreal Alice”

    42. Jump up to:a b Winchester, Simon (2011). The Alice Behind Wonderland. Oxford University Press. ISBN 978-0-19-539619-5OCLC 641525313.

    43. Jump up to:a b Leach, Ch. 4

    44. ^ Gardner, Martin (2000). “The Annotated Alice. The Definitive Edition”. New York: W.W. Norton.

    45. ^ Heath, Peter (1974). “The Philosopher’s Alice”. New York: St. Martin’s Press.

    46. ^ “Algebra in Wonderland”. The New York Times. 7 March 2010. Archived from the original on 12 March 2010. Retrieved 10 February 2017.

    47. ^ Bayley, Melanie. “Alice’s adventures in algebra: Wonderland solved”New ScientistArchived from the original on 25 January 2022. Retrieved 14 October 2016.

    48. ^ Elster, Charles Harrington (2006). The big book of beastly mispronunciations: the complete opinionated guide for the careful speaker. Houghton Mifflin Harcourt. pp. 158–159. ISBN 061842315XArchived from the original on 3 January 2017. Retrieved 3 August 2016.

    49. ^ Emerson, R. H. (1996). “The Unpronounceables: Difficult Literary Names 1500–1940”. English Language Notes. 34 (2): 63–74. ISSN 0013-8282.

    50. ^ “Lewis Carroll”. Biography in Context. Gale. Archived from the original on 26 March 2022. Retrieved 24 September 2015.

    51. ^ Wilson

    52. Jump up to:a b “Lewis Carroll – Logician, Nonsense Writer, Mathematician and Photographer”. The Hitchhiker’s Guide to the Galaxy. BBC. 26 August 2005. Archived from the original on 3 February 2009. Retrieved 12 February 2009.

    53. ^ Dodgson, Charles (1896). Symbolic Logic.

    54. ^ Strong, T. B. (27 January 1932). “Mr. Dodgson: Lewis Carroll at Oxford”. [The Times].

    55. ^ “Fit for a Queen”. Snopes. 26 March 1999. Archived from the original on 26 March 2022. Retrieved 25 March 2011.

    56. ^ Cohen, Morton (24 June 2009). Introduction to “Alice in Wonderland and Through the Looking-Glass”. Random HouseISBN 978-0-553-21345-4.

    57. ^ Cohen, Morton N. (1976). “Hark the Snark”. In Guilano, Edward (ed.). Lewis Carroll Observed. New York: Clarkson N. Potter, Inc. pp. 92–110ISBN 0-517-52497-X.

    58. ^ Williams, Sidney Herbert; Madan, Falconer (1979). Handbook of the literature of the Rev. C.L. DodgsonFolkestone, England: Dawson. p. 68ISBN 9780712909068OCLC 5754676.

    59. ^ Greenarce, Selwyn (2006) [1876]. “The Listing of the Snark”. In Martin Gardner (ed.). The Annotated Hunting of the Snark (Definitive ed.). W. W. Norton. pp. 117–147. ISBN 0-393-06242-2.

    60. ^ Clark, p. 93

    61. ^ Taylor, Roger; Wakeling, Edward (25 February 2002). Lewis Carroll, Photographer. Princeton University PressISBN 978-0-691-07443-6.

    62. ^ Cohen, Morton (1999). “Reflections in a Looking Glass.” New York: Aperture.

    63. ^ Thomas, p. 116

    64. ^ Thomas, p. 265

    65. ^ Wakeling, Edward (1998). “Lewis Carroll’s Photography”. An Exhibition From the Jon A. Lindseth Collection of C. L. Dodgson and Lewis Carroll. New York, NY: The Grolier Club. pp. 55–67. ISBN 0-910672-23-7.

    66. ^ Flodden W. Heron, “Lewis Carroll, Inventor of Postage Stamp Case” in Stamps, vol. 26, no. 12, 25 March 1939

    67. ^ “Carroll Related Stamps”. The Lewis Carroll Society. 28 April 2005. Archived from the original on 21 March 2012. Retrieved 10 March 2011.

    68. ^ Everson, Michael. (2011) “Alice’s Adventures in Wonderland: An edition printed in the Nyctographic Square Alphabet devised by Lewis Carroll”. Foreword by Alan Tannenbaum, Éire: Cathair na Mart. ISBN 978-1-904808-78-7

    69. ^ Gardner, Martin. “Word Ladders: Lewis Carroll’s Doublets”. No. Vol. 80, No. 487, Centenary Issue (Mar. 1996). The Mathematical Gazette. JSTOR 3620349Archived from the original on 20 April 2021. Retrieved 22 March 2022.

    70. ^ Deanna Haunsperger, Stephen Kennedy (31 July 2006). The Edge of the Universe: Celebrating Ten Years of Math Horizons. Mathematical Association of America. p. 22. ISBN 0-88385-555-0.

    71. ^ Black, Duncan; McLean, Iain; McMillan, Alistair; Monroe, Burt L.; Dodgson, Charles Lutwidge (1996). A Mathematical Approach to Proportional Representation. Springer. ISBN 978-0-7923-9620-8Archived from the original on 4 February 2021. Retrieved 4 October 2020.

    72. ^ Charles Dodgson, Principles of Parliamentary Representation (1884)

    73. ^ Seneta, Eugene (1984). “Lewis Carroll as a Probabilist and Mathematician” (PDF). The Mathematical Scientist. 9: 79–84. Archived (PDF) from the original on 30 January 2016. Retrieved 1 February 2015.

    74. ^ Abeles, Francine F. (1998) Charles L. Dodgson, Mathematician”. An Exhibition From the Jon A. Lindseth Collection of C.L. Dodgson and Lewis Carroll”. New York: The Grolier Club, pp. 45–54.

    75. ^ Wilson, p. 61

    76. ^ Gardner, Martin. (1958) “Logic Machines and Diagrams”. Brighton, Sussex: Harvester Press

    77. ^ Bartley, William Warren III, ed. (1977) “Lewis Carroll’s Symbolic Logic”. New York: Clarkson N. Potter, 2nd ed 1986.

    78. ^ Moktefi, Amirouche. (2008) “Lewis Carroll’s Logic”, pp. 457–505 in British Logic in the Nineteenth Century, Vol. 4 of Handbook of the History of LogicDov M. Gabbay and John Woods (eds.) Amsterdam: Elsevier.

    79. ^ “Modern Logic: The Boolean Period: Carroll – Encyclopedia.com”Archived from the original on 3 August 2020. Retrieved 22 July 2020.

    80. ^ Robbins, D. P.; Rumsey, H. (1986). “Determinants and alternating sign matrices”Advances in Mathematics62 (2): 169. doi:10.1016/0001-8708(86)90099-X.

    81. ^ Abeles, F. F. (2005). “Lewis Carroll’s ciphers: The literary connections”. Advances in Applied Mathematics. 34 (4): 697–708. doi:10.1016/j.aam.2004.06.006.

    82. ^ Clark, Dorothy G. (April 2010). “The Place of Lewis Carroll in Children’s Literature (review)”. The Lion and the Unicorn. 34 (2): 253–258. doi:10.1353/uni.0.0495S2CID 143924225Archived from the original on 4 March 2016. Retrieved 21 January 2014.

    83. ^ Carroll, Lewis (1979). The Letters of Lewis Carroll, Volumes 1–2. Oxford University Press. p. 657. Dec. 30th.—To London with M—, and took her to “Alice in Wonderland,” Mr. Savile Clarke’s play at the Prince of Wales’s Theatre… as a whole, the play seems a success.

    84. ^ Angelica Shirley Carpenter (2002). Lewis Carroll: Through the Looking Glass. Lerner. p. 98.ISBN 978-0822500735.

    85. ^ Christensen, Thomas (23 April 1991). “Dodgson’s Dodges”. rightreading.com. San Francisco, California. Archived from the original on 15 July 2011.

    86. ^ “Chronology of Works of Lewis Carroll”. Archived from the original on 20 February 2009. Retrieved 20 February 2009.

    87. ^ The Colour Library Book of Great British Writers’ (1993), p.197, Colour Library Books Ltd, (Godalming, England) ISBN=0-86283-676-6.

    88. ^ “Lewis Carroll and St Mary’s Church – Guildford: This Is Our Town website”. 30 October 2013. Archived from the original on 11 November 2016. Retrieved 10 November 2016.

    89. ^ All Saints’ Church, Daresbury, Church booklet

    90. ^ Cohen, pp. 166–167, 254–255

    91. ^ Cohen, p. 228

    92. ^ Robson, Catherine (2001). Men in Wonderland: The Lost Girlhood of the Victorian Gentlemen. Princeton, New Jersey: Princeton University Press. P. 137. ISBN 978-0691004228.

    93. ^ “Association for new Lewis Carroll studies”. Contrariwise.wild-reality.net. Archived from the original on 7 February 2012. Retrieved 19 October 2019.

    94. ^ Leach, pp. 16–17

    95. ^ Leach, p. 33

    96. ^ Dodgson’s MS diaries, volume 8, 22–24 October 1862

    97. ^ Cohen, p. 263

    98. ^ Wilson, pp. 103–104

    99. ^ Leach, p. 134

    100. ^ Dodgson’s MS diaries, volume 8, see prayers scattered throughout the text

    101. ^ Leach, pp. 48, 51

    102. ^ Leach, pp. 48–51

    103. ^ Leach, p. 52

    104. ^ Wakeling, Edward (April 2003). “The Real Lewis Carroll – A Talk given to the Lewis Carroll Society”. Archived from the original on 8 July 2006. Retrieved 12 January 2023.

    105. ^ Leach p. 54

    106. ^ “The Dodgson Family and Their Legacy”Archived from the original on 14 January 2011. Retrieved 5 January 2011.

    107. Jump up to:a b “The cut pages in diary document”Archived from the original on 12 January 2023. Retrieved 12 January 2023.

    108. ^ Cohen, Morton N. “When love was young”, Times Literary Supplement, 10 September 2004.

    109. ^ Leach, pp. 170–2.

    110. ^ Cohen, “When love was young”

    111. Jump up to:a b Wakeling, Edward (Ed.) “The Diaries of Lewis Carroll”, Vol. 9, p. 52

    112. ^ Maudie, F.W. “Migraine and Lewis Carroll”. The Migraine Periodical. 17.

    113. ^ Podoll, K; Robinson, D (1999). “Lewis Carroll’s migraine experiences”. The Lancet353 (9161): 1366. doi:10.1016/S0140-6736(05)74368-3PMID 10218566S2CID 5082284.

    114. ^ Woolf, Jenny (4 February 2010). The Mystery of Lewis Carroll. St. Martin’s Press. pp. 298–9. ISBN 978-0-312-67371-0.

    115. ^ “Lewis Carroll Societies”. Lewiscarrollsociety.org.uk. Archived from the original on 29 March 2016. Retrieved 12 September 2013.

    116. ^ “‘A most curious thing’ / Lewis Carroll Library”. designbybeam.com. Archived from the original on 3 April 2015. Retrieved 15 March 2013.

    117. ^ “LEWIS CARROLL IS HONORED ON 150TH BIRTHDAY”. The New York Times. 18 December 1982. Archived from the original on 5 May 2015. Retrieved 30 January 2015.

    118. ^ “Lewis Carroll Centenary Wood near Daresbury Runcorn”. woodlandtrust.org.uk. Archived from the original on 5 August 2020. Retrieved 27 November 2019.

    119. ^ About Us, Lewis Carroll Centre & All Saints Daresbury PCC, archived from the original on 14 April 2012, retrieved 11 April 2012

    120. ^ The Carrollian. Lewis Carroll Society. Issue 7–8. p. 7. 2001: “In 1862 when Lewis Carroll sent to Yates the manuscript of the words of a ‘melancholy song’, entitled ‘Miss Jones’, he hoped that it would be published and performed by a comedian on a London music-hall stage.” Archived 4 August 2020 at the Wayback Machine

    121. ^ The Hunting of the Snark and Other Poems and Verses, New York: Harper & Brothers, 1903

Bibliografia

  • Clark, Anne (1979). Lewis Carroll: A Biography. London: J. M. Dent. ISBN 0-460-04302-1.

Uma das primeiras biografias a revelar detalhes da infância de Carroll.

Talvez a biografia mais indicada até o presente.

  • Pizzati, Giovanni: “An Endless Procession of People in Masquerade”. Figure piane in Alice in Wonderland. 1993, Cagliari.

  • Reed, Langford: The Life of Lewis Carroll (1932. London: W. and G. Foyle)

  • Taylor, Alexander L., Knight: The White Knight (1952. Edinburgh: Oliver and Boyd)

  • Taylor, Roger & Wakeling, Edward: Lewis Carroll, Photographer. 2002. Princeton University PressISBN 0-691-07443-7.

Para um livro de fotografia, não achei tão caro!

Aprofundamento

  • Black, Duncan (1958). The Circumstances in which Rev. C. L. Dodgson (Lewis Carroll) wrote his Three Pamphlets and Appendix: Text of Dodgson’s Three Pamphlets and of ‘The Cyclostyled Sheet’ in The Theory of Committees and Elections, Cambridge: Cambridge University Press

  • Bowman, Isa (1899). The Story of Lewis Carroll: Told for Young People by the Real Alice in Wonderland, Miss Isa Bowman. London: J.M. Dent & Co.

  • Carroll, Lewis: The Annotated Alice: 150th Anniversary Deluxe Edition. Illustrated by John Tenniel. Edited by Martin Gardner & Mark Burstein. W. W. Norton. 2015. ISBN 978-0-393-24543-1

  • Dodgson, Charles L.: Euclid and His Modern Rivals. Macmillan. 1879.

  • Dodgson, Charles L.: The Pamphlets of Lewis Carroll

  • Douglas-Fairhurst, Robert (2016). The Story of Alice: Lewis Carroll and the Secret History of Wonderland. Harvard University Press. ISBN 9780674970762.

  • Goodacre, Selwyn (2006). All the Snarks: The Illustrated Editions of the Hunting of the Snark. Oxford: Inky Parrot Press.

  • Graham-Smith, Darien (2005). Contextualising CarrollUniversity of Wales, Bangor. PhD thesis.

  • Edward Guiliano (1982). Lewis Carroll, a Celebration: Essays on the Occasion of the 150th Anniversary of the Birth of Charles Lutwidge Dodgson, C. N. Potter, London.

  • Huxley, FrancisThe Raven and the Writing Desk. 1976. ISBN 0-06-012113-0. (Francis Huxley é sobrinho de Aldous Huxley)

  • Kelly, Richard: Lewis Carroll. 1990. Boston: Twayne Publishers.

  • Kelly, Richard (ed.): Alice’s Adventures in Wonderland. 2000. Peterborough, Ontario: Broadviewpress.

  • Lakoff, Robin T.: Lewis Carroll: Subversive Pragmaticist. 2022. Pragmatics: Quarterly Publication of the International Pragmatics Association, pp. 367–85

  • Lovett, Charlie: Lewis Carroll Among His Books: A Descriptive Catalogue of the Private Library of Charles L. Dodgson. 2005. ISBN 0-7864-2105-3

  • Richardson, JoannaThe Young Lewis Carroll. London: Max Parrish, 1963.

  • Waggoner, Diane (2020). Lewis Carroll’s Photography and Modern Childhood. Princeton: Princeton University Press. ISBN 978-0-691-19318-2.

  • Wakeling, Edward (2015). The Photographs of Lewis Carroll: A Catalogue Raisonné. Austin: University of Texas Press. ISBN 978-0-292-76743-0.

  • Wullschläger, Jackie: Inventing WonderlandISBN 0-7432-2892-8. – Also looks at Edward Lear (of the “nonsense” verses), J. M. Barrie (Peter Pan), Kenneth Grahame (The Wind in the Willows), and A. A. Milne (Winnie-the-Pooh).

  • N.N.: Dreaming in Pictures: The Photography of Lewis CarrollYale University Press & SFMOMA, 2004.

  • Gena Showalter, Alice in Zombieland. Um belo exemplo das incontáveis paródias que Alice no País das Maravilhas gerou; mas eu ainda preferiria jogar a franquia McGee’s Alice! 😉

  • Schütze, Franziska: Disney in Wonderland: A Comparative Analysis of Disney’s Alice in Wonderland Film Adaptations from 1951 and 2010

HERBERT SPENCER #SérieOsÚltimosPolímatas

polímata

(po·lí·ma·ta)

adjetivo de dois gêneros e substantivo de dois gêneros

Que ou quem estudou e sabe muitas coisas ou muitas ciências (ex.: Santa Hildegarda era uma freira polímata; os polímatas são peritos em muitas áreas do conhecimento). = POLÍMATE, POLÍMATO

<polímata>, in Dicionário Priberam da Língua Portuguesa [em linha], 2008-2023, https://dicionario.priberam.org/pol%C3%ADmata.”


RESUMÉ

Herbert Spencer (27 de abril de 1820 – 8 de dezembro de 1903) foi um polímata britânico com alguma proeminência nos seguintes campos: filosofia, psicologia, biologia evolucionista, sociologia e antropologia. É de Spencer a expressão, extremamente popularizada, “sobrevivência do mais forte”, contida em Princípios da Biologia (2 vols., 1864). É sempre necessário observar que Spencer extrapola o trabalho de Charles Darwin, autocontido na esfera da história natural, para aplicá-lo, segundo seus próprios critérios, a sociedades humanas (o que gera implicações antropológicas, políticas, sociológicas, históricas e sobretudo éticas, com as quais NÃO ESTOU DE ACORDO – por isso mesmo, devemos estudar nosso inimigo teórico, a fim de ultrapassá-lo em seus erros). Em suma, trata-se de um polímata polêmico, que deve ser sempre lembrado pelo que fez artificialmente mesclando seleção natural com eugenia (seleção organizada, crime contra a humanidade na atualidade). Spencer era o mais célebre intelectual anglófono no fim do século XIX.

BIOGRAFIA GERAL

Spencer é filho de William George Spencer, matemático. George foi um educador entusiasta das reformas pedagógicas de Johann Heinrich Pestalozzi e conheceu e trabalhou com Erasmus Darwin, avô de Charles Darwin, contemporâneo de Herbert ou Spencer filho. Sua educação se deu diretamente pelo pai e por um tio, com escassa instrução formal. Esse dado terá importância quando discutirmos as obras spencerianas.

Iniciou sua carreira como engenheiro civil durante o boom das estradas de ferro de 1830 na Grã-Bretanha, mas tinha dificuldade de se fixar em alguma atividade ou disciplina do conhecimento definidas. Desde muito jovem contribuía para jornais ditos “liberais”: intervencionistas na política e profunda e militantemente ateístas. Nisso não foi vanguardista, mas essencialmente um homem de seu tempo.

Em Social Statics, seu primeiro livro, 1851, previu que os indivíduos adaptar-se-iam “por osmose” à civilização e a sociedade caminharia para a abolição do Estado numa transição pacífica. Chocante se pensarmos que um grande adversário ideológico seu, Marx, proporia a mesma teleologia para a humanidade, mas por uma via completamente distinta. Passou a participar dos círculos dos homens mais “radicais” do período (o que hoje nos soa risível): Mill, Martineau, Henry Lewes, Huxley e George Eliot (esta última um interesse amoroso efêmero de Spencer), dentre outros. Defendendo Stuart Mill e combatendo o comtismo, elaborou sua principal obra, que o habilita hoje para determinadas fontes como cientista social, embora isso seja formalmente incorreto e anti-sociológico mesmo.

Seu segundo livro (1855) foi no campo da psicologia, em que advogava uma disciplina da alma humana (seu significado, afinal) baseada na fisiologia. Foi assim que, aproximando-se mais e mais da biologia, Spencer começou a pensar no indivíduo como mera peça da engrenagem de uma raça ou espécie (o que é contraditório com o liberalismo econômico e poderia até ser alinhado às principais crenças do positivismo de sua nêmese Auguste Comte, porém demonstra como a história da epistemologia não é coerente, e nem precisa ser; aliás, antes, se precisa ser algo, deve ser necessariamente contraditória a cada momento). Sua falta de fixação em fundamentos de um conhecimento genuíno levou-o a ser um dos homens mais “tendenciosos”, seguindo as modas intelectuais da época: aliando a frenologia (pseudociência, então em voga como ciência) à crença no progresso constante da humanidade, elaboraria vários silogismos centrais para sua visão de mundo. Como Darwin veio a publicar seus renomados trabalhos somente mais tarde, nessa época o “parcialmente biólogo” Spencer usou muito dos postulados do lamarckismo, a principal escola “rival” do darwinismo. Spencer tinha a ingênua ambição de ser “o Isaac Newton das ciências humanas”, pelo menos durante algum período de sua “eclética” vida.

Como definir rapidamente seu “sistema de filosofia sintética”? É simplesmente a aplicação da teoria biológica da evolução do século XIX a todos os campos humanos de maneira irrestrita, atrás de uma fórmula ou equação que simplificasse e esgotasse todo o conhecimento sobre a mente e o comportamento humanos (Spencer não apresenta literalmente uma equação ou lei, mas é o que ele mais gostaria de haver realizado): a psicologia, a sociologia e a moral seriam em breve apenas “ciências acessórias” da única ciência, esta filosofia sintética. Esse Sistema possui 10 volumes e levou 40 anos para ser escrito!

Apesar de tardio (suas primeiras obras venderam mal), seu reconhecimento se estabeleceu na década de 70. Até para o japonês e o mandarim traduziram seus livros da fase “intermediária”. Herbert Spencer basicamente resume o “homem diletante de ciência da era vitoriana”.

No fim de sua vida, sentiu que não criou uma trajetória intelectual em bases sólidas, entretanto, e queixou-se de uma extrema solidão. Nunca se casou nem deixou descendência e tinha um quadro hipocondríaco que a medicina não conseguia tratar. Era um homem que não aceitava, tampouco, ser contradito. Mesmo um jogo de baralho em que as coisas saíssem mal era-lhe suficiente para acabar com o resto do dia, talvez da noite, provocando-lhe insônia, como confidenciou-nos Huxley.

Na década de 1890 sua popularidade começou a fenecer no público, e maioria de seus melhores amigos já havia morto. A Europa imperialista caminhava cada vez mais para o reacionarismo e o “indivíduo livre”, sonho dos apologistas do mercado, teve sua esfera severamente encolhida. Em seu primeiro livro, Spencer advogava o sufrágio universal para as mulheres e a inclusão de votantes até mais abrangente que nossos sistema democráticos hordiernos: as crianças e os adolescentes deveriam participar desse dever cívico. (!) No fim de sua vida, tornou-se basicamente um oligarca irreconhecível. E é infelizmente desse último período que vem seu livro mais lido ou célebre, O Homem contra o Estado.

POLIMATIA

Spencer foi um dos últimos sistematizadores na filosofia/epistemologia, no auge das tendências atéias, da fé no progresso ilimitado e gradual e no poder explicativo exaustivo da ciência. Seu sistema é quase um dogma ou religião cientificista, o que novamente o aproxima, malgrado seu, de Auguste Comte!

Desconheço se Spencer realmente chegou a entender as implicações da segunda lei da termodinâmica. Se sim, ele deve ter ficado bem decepcionado. Decorre desta lei que tudo tende à uniformidade no nível inorgânico, diminuindo (e não aumentando) a heterogeneidade do sistema, que para ele ganharia em valor ao se complexificar cada vez mais..”

Bertrand Russell

DARWINISMO SOCIAL

Era questão arbitrária onde encaixar o subtítulo “darwinismo social” (se em sociologia, ciência política, economia ou ética) ou se simplesmente ele comporia um título independente deste artigo, como foi minha escolha. Mas as maiores implicações da eugenia proposta por Spencer se deram, como verificamos, na II Guerra, na Alemanha nazista, de modo que podemos isolar sua idéia-chave como a mais importante (e nefasta) que ele nos legou.

SOCIOLOGIA

Mais por acidente e por pertencer ao tempo e lugar a que pertenceu é que podemos falar de Spencer como “sociólogo”. Foi imediatamente precedido por Comte e muito influenciado pelo autor francês, de forma, como já se viu, um tanto ambígua. O que Spencer rejeita em Comte, p.ex., é seu postulado dos “três estágios” da evolução social. Segundo algumas referências, Spencer teria sido o primeiro a cunhar o binômio hiper-utilizado e hoje até saturado “estrutura social”. No seu lugar, Spencer cunhou uma antinomia chamada de estágio da sociedade militante (antiga) e estágio da sociedade industrial (moderna). Devemos nos perguntar, no entanto, no que isso enriquece qualquer debate sociológico para além de sua época. Não que tenham faltado críticas a seu olhar epistemológico mesmo durante sua vida e em seu próprio “círculo científico de colaboradores” (não precisamos citar, p.ex., Nietzsche, que foi um grande detrator seu, sendo-lhe contemporâneo – porém ambos nunca interagiram): Dilthey (embora alemão; e embora também muito espezinhado por Nietzsche) foi veemente na necessidade da separação entre ciências naturais e sociais, mirando atingir os escritos de Spencer proponentes de uma unificação do saber. Frank Ward, expoente da sociologia norte-americana, atacou Spencer virulentamente pelo flanco esquerdo (não falo de posicionamento político, mas da América em relação à Inglaterra no mapa). Mesmo o liberalismo montesquieusiano e a teoria da possibilidade de uma “decodificação e absolutização da ética” patrocinados por Spencer foram ambos tratados com desdém pelos cientistas sociais do último terço do séc. XIX. Para encerrar o assunto, Durkheim, em 1890, praticamente definiu a disciplina científica da sociologia, sem que o nome voltasse a ser impunemente usado por autores distintos empregando métodos basicamente idiossincráticos, como até então. O que restou das opiniões de Spencer resvalou para os campos da economia e da ciência política (ler mais abaixo).

ÉTICA” LIBERAL

Absurdamente, uma das conseqüências do “libertarianismo precoce” de Spencer, acoplado a sua crença teleológica no surgimento gradual do homem perfeito na sociedade perfeita e no fim dos conflitos sociais, era que as sociedades do presente deveriam experimentar punições por más condutas, a fim de que aprendessem por iniciativa própria “o poder soberano da natureza”. Segundo Spencer, portanto, o Estado não deveria se imiscuir na vida da pessoa, ainda que fosse para protegê-la ou melhorá-la: não obrigar vacinas, não promover assistência social (pensamento meritocrático ainda em voga pelas piores correntes ideológicas!) ou mesmo, ilustrativamente, proibir-se ou abandonar o ensino gratuito!

INVENÇÃO DO CLIPE DE PAPEL

Uma curiosidade menor é que os clips que usamos hoje para prender e agrupar papéis foram inventados, ou pelo menos seu precursor imediato, por Spencer. Sua autobiografia possui os desenhos do protótipo que depois foi patenteado e comercializado.

LEGADO

Curiosamente, Spencer foi muito mais difundido em vida do que morto (ao contrário da maioria dos grandes pensadores, por exemplo, Shakespeare ou Nietzsche) – sua decadência e ostracismo foram ligeiros. Herbert Spencer parece ter sido até hoje o único “filósofo” na História que conseguiu vender mais de 1 milhão de exemplares de livros ainda no decorrer de sua vida. Isso fez dele uma espécie de Carl Sagan do Liberalismo Econômico, um difusor de idéias próximo do que seria uma vedete hollywoodiana misturada com um comunicador jornalístico de 100 anos depois. Conteúdo mais viral de filósofos menores da História da filosofia nós só podemos conceber hoje, p.ex., na era do YouTube (com figuras deploráveis como Jordan Peterson, etc.). Porém, já em 1937, o sociólogo estruturalista Talcott Parsons podia perguntar zombeteiramente: “Quem ainda lê Spencer?”. William James, Bergson e Durkheim já haviam se ocupado de Spencer nesse ínterim entre sua ascensão e queda meteóricas (a fim de criticá-lo). Talvez boa parte de se sua debandada de leitores, além da percepção generalizada de que suas idéias não eram originais ou de tanta qualidade como de início se propugnava, tenha vindo em virtude de seu “liberalismo à la Europa do séc. XIX” ter resultado na catástrofe nazifascista que assolou o Velho Continente no mesmo período em que foi formulado esse juízo de Parsons (os anos 1930), ainda antes do conflito bélico principiar, mas com Adolf Hitler e Benito Mussolini já no poder. Uma ironia que complementa a anterior (um advogado da liberdade plena do indivíduo contribuir indiretamente para o Holocausto, dentre outros crimes) é que sua lápide está frente a frente com a de Karl Marx num cemitério londrino.

Seu legado ainda vivo – e preocupante – é o do campo anarco-capitalista e da medonha Escola Austríaca de economia. O mais engraçado é que na época de Spencer suas crenças anti-estatistas significavam uma completa rejeição do sentimento patriota, hoje usado por todos os grupos extremistas como tática de chegada ao e manutenção no poder. Além disso, Spencer, para sermos justos, era integralmente um pacifista, dizendo que se um soldado vai à guerra deve se conformar com o pior dos destinos e a sociedade de seu próprio país não tem o direito de lamentar sua perda, pois assim funcionam as conseqüências de quem opta pelo caminho da guerra.

Não há outra alternativa”, frase favorita de Margaret Thatcher, parece decorrer de um dos livros de Spencer. Em sua própria época, Spencer, apesar de ter todas as características de um tory, ou ser impossível imaginá-lo como um whig, pelo menos após o desenvolvimento de suas idéias em seguida ao primeiro livro (em que até defendia as cooperativas proletárias!), um tanto “juvenil e utópico”, reprovou as gestões Gladstone e Disraeli, atacando os conservadores britânicos, que ele chamava de “reformistas sociais”! Ao mesmo tempo, Spencer era refratário à independência da Irlanda, que efetuou já então sua reforma agrária, e nunca perdoou a gratuidade da escola, ou como o Estado obrigava seus cidadãos a ingressarem no ensino formal (Spencer é outro que se sentiria muito contente em defender iniciativas como o homeschooling no mundo atual).

Também era contra o sustento de bibliotecas com dinheiro dos impostos e leis contra o álcool, o tabaco e outras drogas. Para ele, o sujeito tinha o direito de se intoxicar, mas não de se instruir. Por outro lado, fascinante como pode ser uma figura autocontraditória como Herbert Spencer, ele era anticolonialista e anti-imperialista em seu próprio tempo (as colônias estariam sendo atrasadas pela “sociedade industrial”, de modo a ficarem em estado de dependência perpétua ou prolongada, o que ele chamava de sociedade militante, eufemismo para primitiva; ao mesmo tempo, Spencer cria genuinamente que o imperialismo anterior a sua própria geração tinha cumprido sua missão ao eliminando sociedades atrasadas e pavimentar o caminho da civilização branca e européia…)!

No fim, portanto, concedo: estamos falando mais de um pseudo-polímata do que um verdadeiro polímata, que está no limite do que esta série de artigos poderia comportar (ninguém inferior a ele será aqui “biografado”). Dada sua fama pregressa, achei inevitável tratar deste personagem, contudo.

Em qualquer contexto a migração é ruinosa, seja ela pequena ou vasta, para o país que recebe o imigrante. O caos social decorrerá necessariamente desta tolerância para com pessoas de outras nacionalidades. O mesmo se dará caso se permita a mistura e o casamento de europeus e americanos [norte-americanos, britânicos de ‘raça pura’] com japoneses.”

Trecho racista e xenófobo de Spencer

QUERO SABER MAIS! (MESMO NOSSOS ADVERSÁRIOS PRECISAM SER ESTUDADOS)

O autor já se encontra livre de copyrights:

https://www.gutenberg.org/ebooks/author/1887

Recomendo, além de sua apreciação crítica direta, as objeções de Plekhanov ao spencerismo contidas em Anarchism and Socialism, 1909.

NOTAS SOBRE MARK TWAIN – Alexandre Barbosa de Souza

Quando publicou As aventuras de Tom Sawyer (1876), Mark Twain tinha 41 anos, e quando da publicação de As aventuras de Huckleberry Finn (1885), 50. Porém, ambos se passavam ‘30 ou 40 anos atrás’ — quando o autor era um menino pobre como seus personagens —, assim como as 2 sequências, As viagens de Tom Sawyer (1894) e Tom Sawyer, detetive (1896). A Guerra Civil Americana, entre os estados escravagistas do Sul — como o Missouri natal do autor, onde se passa o primeiro livro — e os estados abolicionistas do Norte — como Illinois, para onde os protagonistas do 2º livro tentam fugir pelo rio Mississippi —, duraria de 1861 a 1865, encerrada com a abolição da escravatura em todos os Estados Unidos.

Autodidata, tipógrafo, piloto de vapor, mineiro, jornalista, Twain se mudou para São Francisco depois da guerra, foi às Ilhas Sandwich (atual Havaí) e passou a escrever cartas para jornais, fazer palestras e viajar pelo mundo (Europa, Oriente Médio, Índia). Casado, mudou-se para Buffalo, em Nova York, e depois para Hartford, em Connecticut, onde escreveria seus principais livros (1874-1891). Quatro anos antes de morrer, em sua Autobiografia de Mark Twain (1906), o próprio autor explicaria sua perspectiva infantil da escravidão:

Nos meus tempos de menino, eu não tinha aversão à escravidão. Eu não me dava conta de que havia algo de errado naquilo. Ninguém a denunciava aos meus ouvidos; os jornais locais não falavam nada contra ela; no púlpito da igreja local nos ensinavam que Deus a aprovava, que era uma coisa sagrada e que quem duvidasse bastava procurar na Bíblia, se quisesse tranquilizar sua consciência — e depois as escrituras eram lidas em voz alta para termos certeza; se os próprios escravos tinham aversão à escravidão, eram prudentes e não diziam nada.”

Termos como nigger, injun e half-breed, usados no original, são pejorativos que designam geralmente personagens ‘não-brancos’ ou mestiços pobres nos estados do Sul. No Brasil, último país da América a abolir a escravidão, o substantivo ‘negro’ não reproduz o grau de desprezo social da expressão especificamente norte-americana quando utilizada por falantes brancos; já o substantivo ‘preto’, embora fosse comum no século XIX como pejorativo da elite escravocrata para se referir aos escravos e negros em geral, foi retomado no século XX pelo movimento negro brasileiro como forma preferível de autorreferência. Optou-se, portanto, na maioria dos casos, pela tradução ‘escravo’ para ‘nigger’, exceto nas falas do personagem mais racista de todos: o ignorante pai de Huckleberry no segundo livro (ver nota do tradutor sobre os dialetos em As aventuras de Huckleberry Finn) e no terceiro e quarto, quando Jim já não é mais escravo.”

MICHAEL FARADAY #SérieOsÚltimosPolímatas

polímata

(po·lí·ma·ta)

adjetivo de dois gêneros e substantivo de dois gêneros

Que ou quem estudou e sabe muitas coisas ou muitas ciências (ex.: Santa Hildegarda era uma freira polímata; os polímatas são peritos em muitas áreas do conhecimento). = POLÍMATE, POLÍMATO

<polímata>, in Dicionário Priberam da Língua Portuguesa [em linha], 2008-2023, https://dicionario.priberam.org/pol%C3%ADmata.”

RESUMÉ

Nascido em 22 de setembro de 1791 e morto em 25 de agosto de 1867, Michael Faraday foi um cientista inglês indispensável para as disciplinas físico-químicas do eletromagnetismo e da eletroquímica. Ele enumerou os princípios da indução eletromagnética, do diamagnetismo e da eletrólise. Praticamente um autodidata, se enquadra entre os maiores cientistas da História. Antes de Faraday não se podia falar em campo eletromagnético. Faraday também foi o primeiro a indicar que o magnetismo podia afetar os raios de luz, demonstrando que são forças físicas são só diferentes como interdependentes ou interativas entre si. Foi um dos precursores do uso da eletricidade em massa, mudando o mundo, talvez, mais nos últimos 150 anos que nos 10 mil precedentes.

Como químico, Faraday descobriu o benzeno, investigou o hidrato de clatrato a partir do cloro e estabeleceu o sistema numérico de oxidação dos átomos. Os termos ânodo, cátodo, eletrodo e íon são suas criações. Faraday divulgava suas descobertas em linguagem absolutamente didática e popular.

Em compensação, seu conhecimento matemático não ultrapassava a trigonometria euclidiana, com conhecimentos básicos de álgebra. James Maxwell converteu as descobertas faradayanas em equações hoje consideradas a base da teoria moderna do eletromagnetismo. Faraday usava conceitos de “linhas de força” vetoriais em suas explanações – isso indica que ele possuía concepções matemáticas em alto grau, embora não as realizasse no papel – pois matemáticas envolvendo vetores foram desenvolvidas apenas após o próprio Maxwell. A unidade de medida internacional de capacitância foi batizada farad em sua homenagem.

BIOGRAFIA GERAL

Michael Faraday é natural da atual cidade de Londres, de origem plebéia. Foi o terceiro de 4 irmãos. Aos 14 anos conheceu o livreiro George Riebau, que ajudou em sua educação. Os autores que mais o influenciaram nesse período constam como Isaac Watts e Jane Marcet.

Aos 20, estabeleceu conexões com o químico Humphry Davy e com John Tatum, fundador da Sociedade Filosófica de Londres. William Dance atuou como seu mecenas nesse período. Seu primeiro emprego como assistente químico laboratorial foi obtido em 1813. Ele e seu superior, Davy, foram vitimados por uma explosão do composto tricloreto de nitrogênio, felizmente sem conseqüências graves. Em 1821 Faraday casou-se com Sarah Barnard (1800-1879). O casamento não gerou descendência.

Em 1832 Faraday recebeu o título honorário de doutor em em Direito Civil pela Universidade de Oxford. Foi-lhe oferecido o título de Sir em decorrência de suas descobertas científicas, o qual ele dispensou por motivos religiosos. Além disso, era membro honorário das academias científicas de inúmeros países.

Faraday declinou ao convite britânico para ajudar na produção de armamentos químicos para uso na Guerra da Criméia (1853-56).

POLIMATIA

QUÍMICA

As primeiras descobertas de Faraday foram dois compostos envolvendo cloro e carbono: o hexacloroetano, decorrente da cloração do etileno; e o tetracloreto, oriundo da decomposição deste primeiro. Também desempenhou experimentos complexos sobre a difusão de gases, dando continuidade às primeiras teses e descobertas de John Dalton. Thomas Graham e Joseph Loschmidt explorariam mais a fundo o legado experimental de Faraday no subcampo dos gases aplicados à física. Faraday pôde liquefazer vários gases, investigou as propriedades das ligas metálicas e produziu novos vidros destinados a aplicações em ótica. Um dos vidros de Faraday foi usado num importante experimento que demonstrou modificações na propagação da luz. Faraday desenvolveu uma versão prototípica do Bico de Bunsen, importante instrumento de laboratório. Quando descobriu o benzeno, batizou-o provisoriamente de bicarbureto de hidrogênio.

Faraday foi precursor no estudo das chamadas nanopartículas metálicas. Em 1847, anunciou as propriedades únicas do composto de ouro coloidal, diferentes do ouro “puro”. Alguns reportam esta investigação como o marco zero da nanociência.

ELETRICIDADE E MAGNETISMO

Seu principal campo de atuação. Seu primeiro construto foi uma pilha voltaica feita de 7 moedas de meio centavo da libra, enfileiradas com 7 discos de folhas de zinco e 6 folhas de papel umedecidas de água marinha (ionizadas). Com ajuda desta pilha, Faraday decompôs o sulfato de magnésio.

O físico e químico danês Hans Christian Ørsted é apontado como o real descobridor do eletromagnetismo em si, mas físicos posteriores como Davy (o chefe de Faraday) e William Hyde Wollaston não conseguiram desenvolver um motor elétrico baseado na descoberta. Faraday desenvolveu então um motor homopolar capaz de produzir movimento circular de um fio com a ajuda de um ímã, ambos imersos em mercúrio. A invenção teria advindo de uma contribuição teórica tripla entre Davy, Wollaston e Faraday. Por não atribuir crédito aos outros dois no invento, as relações entre Faraday e Davy azederam, e essa pode ter sido a razão central de sua mudança para outros campos do conhecimento, afastando-se do eletromagnetismo (senão até sua morte, por alguns anos).

Foi somente 2 anos após a morte de seu mentor Davy que Faraday anunciou a descoberta da indução eletromagnética (1831). Nessa época nasceu a teoria do campo (magnético)¸ abrangendo o escopo do trabalho teórico de Ørsted. Aplicando a teoria em laboratório, Faraday construiu o dínamo, “avô” dos geradores de energia e motores elétricos atuais.

Investigando a eletricidade em seus fundamentos, Faraday cunhou os termos eletrostática, atração, eletrólise e magnetismo (sem o prefixo eletro-). Ele concluiu que não existia uma divisão rígida entre os fenômenos de eletricidade (na época falava-se em vários tipos de eletricidade com leis próprias, sendo eletromagnetismo apenas a interação entre eletricidade e eletromagnetismo e não uma força física una). O segredo estaria nas variáveis de quantidade e intensidade (corrente e voltagem, respectivamente), o que mudava as propriedades da única e mesma corrente elétrica, fenômeno básico da física. Os trabalhos de Faraday impactariam de maneira majoritária os avanços em engenharia do último terço do século XIX, que ele não viveu para ver.

DIAMAGNETISMO

Em 1845 Faraday descobriu a repulsão (de caráter fraco) de certos materiais ao campo magnético, o que batizou de diamagnetismo. Foi na mesma época que cunhou o que viria a ser chamado post mortem de Efeito Faraday, sobre a mudança da rotação polar de um feixe de luz linear sob interferência magnética.

A caixa de Faraday ou gaiola de Faraday, talvez seu instrumento mais conhecido, comprovou que descargas elétricas afetavam apenas a superfície exterior do condutor elétrico (metálico). Não é uma lenda que Faraday tinha confiança plena no resultado do experimento e se posicionou dentro da gaiola a fim de provar, saindo vivo, que a eletricidade não se propagaria como um fluido para dentro da gaiola, já na primeira tentativa, posto que era uma força que se propagava por outras regras, como ele mesmo já sabia.

PREVENÇÃO CONTRA EXPLOSÕES FATAIS EM MINAS

Faraday investigou o efeito de grandes explosões e acidentes com múltiplas vítimas em minas inglesas. Ele descobriu que a poeira destes túneis subterrâneos potencializava as explosões e encorajava a construção de dutos de ventilação para mitigar o poder de expansão das chamas. Apesar de suas severas advertências, apenas em 1913, após outro grande desastre, suas idéias começaram a ser acolhidas pelos empresários mineiros.

PEDAGOGIA

Faraday se posicionou e palestrou sobre os perigos das modas correntes do mesmerismo (magnetismo animal, fenômeno psicológico, não da física), das tentativas de comunicação com os mortos e dos fenômenos de Poltergeist ou “mesas giratórias”, desaconselhando qualquer ensino de paraciências, fenômenos paranormais (nunca comprovados) e misticismos nas escolas britânicas.

Ele deu aulas de iniciação científica para alunos do ciclo básico. Um dos livros que produziu a partir dessas lições, de mais fama, é A História Química de uma Vela (1851). São incursões consideradas populares, instrutivas e filosóficas ao mesmo tempo.

QUERO SABER MAIS!

Havendo publicado poucos livros qua livros em vida, as melhores fontes para seu pensar em via direta são seus diários, que foram, ao longo do tempo, organizados e traduzidos para vários idiomas.

[ARQUIVO] A vida de Federico Nietzsche, o maior dos filósofos modernos, & de sua irmã nazista, sua antípoda.

Trechos selecionados de antigas postagens do primeiro blog do autor, de 18 de setembro de 2009 e 6 de novembro de 2009. Duas obras serviram de bibliografia para as citações e comentários: Vida de Federico, biografia de Daniel Halevy traduzida ao espanhol e My Sister and I, obra anônima, falsamente atribuída a Nietzsche, ambas, se e quando vertidas ao português, citadas em traduções minhas. Exemplares consultados na biblioteca da Universidade de Brasília à época.

* * *

Carl Ludwig. Pai luterano e também enfermiço. Gosto pela música e pela solidão! Tinha os reis em alta conta, daí provindo o nome do filho, Frederico Guilherme.

Desde sempre muito introspectivo: só foi falar aos 2 anos e meio!

Famoso registro de um sonho que teve aos 14 anos: prenúncio da morte de seu irmão caçula.

el Señor de los cielos fue nuestro único consuelo”

el pastorcito”, assim N. era chamado no círculo familiar.

Intensa produtividade literária já aos dez anos. Eu também tive esses impulsos – que pena que tratavam de jogar tudo o que eu fazia no lixo!

Pp. 19-30: ausentes do exemplar que li.

Embriagado de si mesmo, escreveu a história de sua infância” em 14 dias!

P. 37: será que seu ódio pela cerveja tem origens em um embebedamento que o fez se machucar a cavalo?

Na escola, gostava de brigar e chamar para o duelo.

Esta alegría infantil dura poco”

Hiato poético. Aluno de Ritschl.

SOBRE OS POSITIVISTAS: “N. os leu… mas não os releu”

Hegel, Fichte e Schelling viviam o seu auge no ambiente acadêmico.

Iniciou estudos em Bonn, mas transferiu-se para Leipzig. Na festa local, a do centenário da entrada de Goethe na instituição, o reitor desaconselha ser como ele (Goethe): um mau aluno! Um paradoxo: reconhece-se o fermento do grande homem, mas o homem erudito se recusa a replicá-lo.

este brônzeo monstro de força”, em referência a Schopenhauer. O pai que N. arranjou para si mesmo na idade em que é preciso ter um, biológico ou não (20).

CRISE FILOLÓGICA (PP. 53-4): “Que uma multidão de cabeças medíocres se ocupe de coisas cuja importância e conseqüência sejam graves e reais é um pensamento aterrador.”

Míope e aquartelado durante a guerra. Cai do cavalo e quebra uma costela.

A sutileza e a doçura platônica mostram já os signos da decadência.” Hipérbole!

Os gregos criam, então, como hoje os europeus, na fatalidade das forças naturais. E criam também que o homem deve se criar a si mesmo, e a suas virtudes e seus deuses. Um sentimento trágico, um valente pessimismo, que não os apartava da vida, pelo contrário, animava-os.”

Quando Nietzsche começa a ler Montaigne, ele mesmo o declara, sua desde sempre frágil amizade com Wagner, homem de outra geração, começa espiritualmente a derrocar…

Ciência, arte e filosofia crescem tão bem-ligadas em mim que creio que darei a luz a um centauro.”

no leía nunca los periódicos”

1870: A reunificação alemã em seu ápice imperialista, engolindo o sul ainda rupestre e provincial.

Aqui recomenda-se a leitura de “De Dioniso a Bismarck. Tragédia e Política em Nietzsche”, tradução de um artigo de Baeumler, 1931.

as guerras modernas são supérfluas”

Burckhardt

Na época de Nascimento da Tragédia Nietzsche soa como um discípulo hegeliano envergonhado. Seu objetivo é buscar uma finalidade na História a fim de lutar por ela – um longo caminho até Vontade de Potência

E se é certo que os gregos foram destruídos pela escravidão, ainda é mais certa esta outra afirmação: a falta de escravidão é causa de que essa nossa época pereça” Como negar? Criticar a democracia só pode significar apologia de um novo sistema hierárquico (não-burguês). Os direitos humanos nunca funcionaram na prática, não há senhores, apenas escravos. O artista é o protótipo do homem superior: não pensa no trabalho como trabalho, não pensa na riqueza como dinheiro. Tem fins maiores em vista.

Será que nos distanciamos tanto assim da ética da guerra antiga, em que os vencidos se tornavam escravos dos vencedores? O que se tornarão os ucranianos para os europeus desde este instante? Os ucranianos que não preferirem se tornar o que são, i.e., russos?

P. 116: Os sanguessugas inevitáveis do Estado-nação moderno: o general, o empresário obscuro (o oficial que nunca foi soldado, burocrata, homem de gabinete, anti-herói). Efeito colateral da “onda pacifista” européia. Homens da paz: homens do dinheiro. Assim como a humanidade não é mais digna de reis, não é mais digna de comandantes militares à antiga, apenas chefes nominais, farsas. O que se viu nos avanços bélicos da Prússia imperialista foram gritos de desespero de uma Alemanha nostálgica dos tempos nobres e épicos das guerras. Hoje continuariam havendo mais e mais gritos nostálgicos (mais do que os que já ocorrem por todo o planeta) não fosse a constatação de que quase todo conflito militar que se tem a intenção de iniciar não seria estrategicamente interessante, i.e., NÃO GERARIA LUCRO. “Lucro” é o único ser vivo do planeta habitado pelos economistas de Estado. Como dança uma nação atrofiada: tudo o que ela faz acaba por matar – dos miseráveis aos burgueses.

Polêmica contra o sufrágio universal: historicamente, é justificado como uma recompensa pela bravura da sociedade, dos nossos ancestrais. Efeito colateral: esteriliza as populações.

Quando um Estado não pode alcançar seu mais alto fim, cresce desmesuradamente. O império mundial dos romanos não tem nada de sublime frente a Atenas”: denúncia do perigo expansionista. Ademais, exemplar pulverização da teoria do espaço vital, a Lebensraum alemã.

N. se torna pensionista da Universidade da Basiléia aos 27 anos de idade devido à precarização de sua saúde.

P. 123: pérola do autor da biografia: “Nascimento da Tragédia, único verdadeiro livro que N. levara a cabo.”

Será o filósofo sempre um ser inútil para os homens?” “um lírico que não chega a ser artista”

De 3 mil em 3 mil anos as palavras se invertem? Há também um esgotamento do homem artístico, um niilismo às avessas? Morre-se de sede e afogado sucessivamente na História?!

Talvez se possa falar dos fins inconscientes de um formigueiro; mas de todos os formigueiros da Terra?…” Alusão à abstração do conceito de humanidade.

TALES – tudo deriva de um único elemento.

ANAXIMANDRO – a fuga das coisas é seu castigo.

HERÁCLITO – uma lei rege a fuga e a permanência das coisas.

PARMÊNIDES – a fuga e a permanência são mera ilusão. Apenas o Um existe.

ANAXÁGORAS – todas as qualidades são eternas: nelas não há devir.

PITAGÓRICOS – todas as qualidades são quantidades.

EMPÉDOCLES – todas as causas são mágicas.

DEMÓCRITO – todas as causas são mecânicas.

SÓCRATES – só o pensamento é imperturbável.”

Todos estão certos. Os germes mais antigos. Contra e por Homero.

De vez em quando me sobrevém uma repugnância infantil pelo papel impresso; parece-me não ver nele senão papel manchado.”

DAVID STRAUSS, A PRIMEIRA VÍTIMA: “Federico ha encontrado al hombre que desea destruir”

As idades do homem de Flaubert: paganismo, cristianismo e porquismo.

NIETZSCHE & ENGELS: O Anti-Dühring poderia ser uma obra conjunta, pois ambos gostavam de detratar o mesmo intelectual!

P. 206: “Me alimento quase exclusivamente de leite.”

IMPRESSÕES GERAIS DA FIGURA DE NIETZSCHE: “voz musical (…) falar lento (…) vista fixa (…) cabelos curtos escovados para trás (…) maçã do rosto eslava”

O método peripatético não diz respeito só a “filosofar em movimento”, como muito se veicula. Maneira de aprendizagem horizontal de dois ou mais sábios – significaria que Aristóteles não se considerava um mestre de escola nem que possuía “discípulos” no rigor da palavra. Uma conversa enquanto se passeia pelo bosque, por exemplo.

Não deves amar nem odiar o povo¹

Não te deves ocupar da política²

Não deves ser rico nem indigente³

Deves evitar o caminho dos ilustres e poderosos

Deves desposar uma mulher estrangeira4

Deves deixar a teus amigos o cuidado de educar teus filhos

Não deves aceitar nenhuma das cerimônias da Igreja”

¹ Anti-Dostoievski!

² Não deves ser ativista político se queres ser filósofo, que se ocupa, entretanto, totalmente da política.

³ Está muito além da própria escolha individual, mas sem dúvida seria um filtro para o exercício da vocação do filosofar.

4 Indecifrável em relação a tudo que deixou por escrito.

A influência da estilística de Pascal e La Rochefoucauld sobre a escrita de N.

Pseudônimos e iniciais: a salvação dos imorais! Que pena que a Constituição veda o anonimato. Não é mais possível fazer boa literatura de polêmica sem ser processado.

envelheci dez anos em uns poucos meses.”

um enfermo não tem o direito de ser pessimista.”

…e a saúde recomeça seu jogo mágico.” – Muitas das convalescenças de N. foram no clima prazenteiro do sul da Itália.

O espírito voltado para a oposição da dor vê as coisas debaixo de uma nova luz; e o indizível encanto que acompanha toda luz nova basta às vezes para vencer a tentação do suicídio, e para fazer a vida desejável. Aquele que sofre pensa com desprezo no mundo vago, tíbio e cômodo em que se compraz o homem são; pensa com desprezo nas ilusões mais nobres e mais queridas em que se deixa absorver; este desprezo é seu gozo, o contrapeso que o ajuda a se defrontar com o sofrimento físico, contrapeso cuja necessidade sente então… Seu orgulho se rebela como jamais se havia rebelado: defende com deleite a vida contra um tirano como o sofrimento, contra todas as insinuações desse tirano que nos quis obrigar a blasfemar contra a vida. Representar a vida frente a esse tirano é uma tarefa de incomparável sedução.”

Aurora

Este aforismo sempre representou minha vida. Atualmente dedico-o a W.O.

Uma independência que não moleste a ninguém; um orgulho doce, velado, um orgulho que, não invejando as honras e satisfações dos demais e se abstendo de burlas, não incomode a gente… Um sono ligeiro, uns modos livres e pacíficos; ausência de álcool, de amizades ilustres ou principescas, de mulheres e de jornais, de honras e de sociedade – que não seja a de espíritos superiores e, à falta destes, de gente humilde (da que é tão impossível prescindir quanto da contemplação de uma vegetação poderosa e sã) –; os pratos mais fáceis de preparar, se possível preparados por mim mesmo, ou que mal tenham necessidade de preparação.” Curiosidades insólitas e sem valor.

Por fim encontra N. aquela idéia cujo pressentimento o agita com tanta violência. Um dia em que caminhava pelos bosques de Sils-Maria, em direção a Silvaplana, sentou-se, não longe de Surlee, ao pé de uma rocha piramidal; naquele momento e naquele local concebeu o eterno retorno.” Romantização de biógrafo precoce.

a música e a nostalgia de um passado melhor”

Observações pessoais minhas: Cabal, Senhorita, 2005 – sensação de potência desperdiçada – por quê? À época eu apenas queria ser o que sou hoje, a própria vontade niet. Porém iludo-me dalguma forma, querendo retroagir para reaver estas possibilidades perdidas. E contudo, como minha cabeça era ali, só podia me levar até aqui – o INESPERADO, apenas agora verificável. Se eu voltasse no tempo com ESTA consciência, amadurecida, todas as cores imaginadas desbotariam em desprezo – não foi o mundo que piorou em 3 (18!) anos. Eu me tornei mais sensível em relação à essência deste mundo. Atenuante invencível: 2005 e sua sensação de estar no topo de um monte sagrado, isso se repetirá INDEFINIDAMENTE…

Pp. 265-6: “O tempo, cuja duração é infinita, deve repetir, de período em período, uma disposição idêntica das coisas. Isto é inadiável, uma necessidade; logo é necessário que todas as coisas voltem a ser. Dentro de tal número de dias, número imprevisível, imenso, apesar de limitado, um homem, semelhante em tudo a mim, eu mesmo, em suma, sentado à sombra deste rochedo, encontrarei de novo esta mesma idéia. E esta mesma idéia voltará a se encontrar com este homem, não somente uma vez, mas um número infinito de vezes, pois o movimento que repete as coisas é infinito. Logo devemos abandonar toda esperança e pensar firmemente: nenhum mundo celestial receberá os homens, nem os consolará nenhum destino melhor. Somos as sombras de uma natureza cega e monótona, os prisioneiros de cada instante. Mas não esqueçamos que esta tremenda idéia que nos proíbe toda esperança enobrece e exalta cada minuto de nossas vidas; se o instante se repete eternamente em um monumento eterno, dotado de valor infinito e – se a palavra divino tem algum sentido – divino. (…) Ápice da meditação.” (1881)

Aurora não teve o menor êxito [comercial]”

Eis aqui a pedra em formato de pirâmide, no lugar da qual, em 600, 1000 anos, se erigirá uma estátua ao autor de Aurora.” Carta a Paul Rée. Demorou muito menos do que isso.

ninguém se interessa por esse Zaratustra

N. supostamente interdito de lecionar em Leipzig por seu “ateísmo” – como se tivera saúde restante para tal!

Inicialmente, por ter passado um hiato sem editor, Assim Falou Zaratustra foi entregue apenas para 7 chegados: a irmã Elizabeth, Erwin Rohde, Overbeck, Paul Lanzky (jovem admirador niet., desconhecido hoje), Peter Gast (futuro co-editor), Mme. von Maysenbug e Burckhardt. Outro contato de N., Gersdorff, aparentemente já falecera. Rohde como que já havia rompido com o antigo amigo.

P. 380: páginas devotadas a Dostoievski e o “cristianismo revolucionário russo”.

P. 399: “As tendências humanitárias não são anti-vitais, pois convêm às massas, que vivem com lentidão; e, convindo a elas, convêm à humanidade, que necessita da satisfação das massas. As tendências cristãs são igualmente bonacheironas, e nada é tão desejável como a sua permanência, pois convém a todos os que sofrem, todos os débeis, e é necessário para a saúde das sociedades humanas que o sofrimento e as debilidades inevitáveis sejam recebidos sem rebelião, de modo submisso e, se possível, amorosamente. § Diga o que diga o cristianismo, não posso esquecer que lhe devo as melhores experiências da minha vida espiritual, e espero não ser nunca ingrato com ele no fundo do coração…” Já se imaginou tamanha isenção intelectual? Um homem que entende que o melhor para o futuro e para outros homens não é ou não será aquilo que é ou foi melhor para si mesmo? Houve filósofo mais probo?

P. 411: “Quando se estudam os últimos meses dessa vida, parece como se se assistisse ao trabalho de uma máquina de guerra que a mão humana já não governa mais”

O Código ou as Leis de Manu teriam sido uma das últimas leituras de N. Livro extenso e cansativo. Estou lendo-o há meses (agora em hiato).

* * *

O primeiro ou principal a refutar a obra Minha Irmã e Eu (Ich und meine Schwester) como de autoria nietzschiana foi Walter Kaufmann (1952, 1955). WIKI: “If legitimate, My Sister and I would be Nietzsche’s second autobiographical and final overall work, chronologically following his Wahnbriefe (Madness Letters), written during his extended time of mental collapse. (…) The book was tied quickly to controversial publisher Samuel Roth, the putative owner of Seven Sirens, who had spent jail time for the unlawful distribution of a version of James Joyce’s Ulysses (1922). In the book’s introduction, an anonymous publisher claimed to have received the manuscript from a fellow inmate of Nietzsche’s in Jena and to have hired Oscar Levy to translate the work only to have both German and English manuscripts confiscated, with only the latter surviving. (…) Kaufmann claimed in a footnote in his Nietzsche: Philosopher, Psychologist, Antichrist (first published 1950) to have received a ghostwriting confession from minor author David George Plotkin in 1965.” Creio que não preciso opinar que segundo o cânone da arquivologia ou filologia é impossível ceder e duvidar de que seja uma fraude. A ausência do manuscrito original e o lapso de tempo até o misterioso aparecimento das cópias são dois detrimentos inexcusáveis para o sucesso da teoria da autenticidade, por mais que seja um livro bem-escrito e prazeroso, e o estilo de N. seja até replicado com sucesso em suas páginas! Ainda assim: “Nietzsche scholar Walter K. Stewart, in his 185 page monograph Nietzsche: My Sister and I — A Critical Study published in 2007, argues for the original’s potential legitimacy by conducting a point-by-point analysis of Kaufmann’s book review.”

As informações mais sensacionalistas nessa pseudo-segunda autobiografia de N. são que teve envolvimento amoroso-incestuoso (assexual) com “Lama” Förster (como N. chamava sua irmã Elizabeth), que podemos dizer com segurança que ele odiava, e profundamente, e com Cosima Wagner, viúva de Richard Wagner – é até engraçado!! À época (2009), eu cria na possibilidade da autenticidade desta fabulosa história, tecendo o comentário de que os ciúmes muito intensos por Elizabeth demonstrados nas cartas de N. não eram “normais”. Porém, não levava em conta então costumes de família na Alemanha do séc. XIX, uma sociedade muito mais androcêntrica.

Eis a desculpa médica para tornar a história da escrita desse livro plausível: “Sua deterioração cerebral prejudicou seriamente a capacidade de N. responder as pessoas, mas seu fluxo de pensamentos não tinha sofrido alterações significativas, e ele não verificava, ao despejar suas idéias no papel, a mesma hesitação do contato falado.”

O primeiro capítulo já abre com uma “paródia” do relato niet. do sonho com a morte do irmão menor: no asilo, sonhava com a morte da mãe. A mãe de N. morreu poucos meses antes do próprio.

Para o odiador, a Alemanha é o lugar. Em primeiro lugar, há o kaiser, que se pode detestar a vida inteira.”

Tenho mãos e pés pequenos como os de uma mulher. Teria sido eu destinado a ser mulher? Sou acaso um descuido de Deus?”

meu cérebro vai se tornando pedra” “Como uma múmia egípcia que esqueceu de morrer por inteiro, eu sou o expectador da minha própria morte, sentindo meus olhos se tornarem poeira”

Esse é o paradoxo da minha existência? eu amei a vida ao máximo, mas não pude direcionar essa paixão do modo clássico” “Essa grande mente, a maior desde Aristóteles, está sendo dissolvida na imbecilidade da massa”

Eu cortei a história do mundo em duas ao escrever o Ecce Homo

Antes de mim os filósofos guerreavam em trincheiras contra o cristianismo. Eu promovi uma guerra total, e isso me deixou sem amigos.” Veja o anacronismo das expressões guerra de trincheiras e guerra total, compreensíveis apenas a partir dos anos 30 do séc. XX!

Sócrates e Schopenhauer são eunucos que perderam a capacidade de amar”

Na Grécia Antiga a riqueza de um homem era avaliada por seu número de filhos – em correlação positiva”

Voltaire foi a França que respirava aquele ar de liberdade ideológica inglês”

Todo pensador socialista falha ao não entender que a distribuição desigual de sabedoria, poder e talento é essencial em uma comunidade, para o contínuo exercício, ali, de sentimentos como piedade, compaixão, generosidade e proteção, que são os ingredientes das únicas civilizações que tiveram qualquer tipo de duração” O autor se esquece de que a ditadura do proletariado leva tudo isso em conta – como não levaria?

Talvez a autêntica tragédia na história do homem tenha se dado, não quando o homem se viu pela 1ª vez nu diante de sua comparsa, mas quando percebeu que era necessário sair de si para mostrar tributo à divindade. Ele não sabia que tinha sido expulso do Paraíso até se ver do lado de fora do portão.”

É difícil crer que aqueles pés das estátuas gregas precisavam mesmo da mediação de sandálias. Se tivéssemos pés tão fortes provavelmente arruiná-los-íamos com pedicures!”

Uma nação que tenha abdicado do sonho da conquista já abdicou há muito do sonho de viver” E no entanto isso colide com a crítica das nações expansionistas, vista mais acima.

Estamos excedendo as contas em tudo. O universo não é, para começar, tão grande quanto se relata. O mundo como um organismo é tremendamente importante para si mesmo, mas da mais banal significância para o sujeito. E, com todas as suas perfeições creditadas, o homem é uma criatura extremamente imperfeita! Sendo assim, poderíamos deixar de lado o sentimento de extravagância sobre o que não temos, ou de angústia pelo que possivelmente deixamos de fazer ou experimentar. Tudo humano que valha a pena está contido em alguns prédios em Roma, Paris e Londres, e eu não trocaria o resto do universo pelo conteúdo de um deles. Ainda assim, no momento em que escrevo pode ser que as forças armadas da humanidade estejam se preparando para devastar esses prédios para começar uma briguinha de homens, cuja real potencialidade é tal que se fossem estes os últimos e únicos homens sobre o globo toda a raça teria de morrer sem deixar herdeiros.”

CRISES ECONÔMICAS COMO CRISES PERMANENTES DE QUALQUER ESTADO E MORAL QUE NÃO SÃO INSTITUÍDAS POR UM POETA-LEGISLADOR

Como resultado da mistura dos economistas com leis científicas puras, sem legislação, certos princípios de economia aparentemente adquiriram um caráter duplo – o da generalização científica e o das regras que serão impunemente desobedecidas.”

Você por acaso já viu uma única jovem com a metade da beleza do mais abandonado dos gatos de rua?”

Se eu puder voltar a minha casa de novo, lerei o Livro dos Mortos egípcioMais sobre esta obra a seguir.

O europeu aspira a uma sinceridade cristã no viver, mas treina sua consciência de modo que solte uma risada sempre que cruza uma igreja”

Decidir o destino da comunidade via voto igualitário é tão razoável quanto escolher a mulher via loteria”

Quatro mulheres em minha vida: duas, prostitutas, me fizeram feliz. Felicidade de momento.” Mais um aforismo nada característico da pudicícia nietzschiana em revelar detalhes íntimos que encerra o debate sério sobre a inautenticidade deste livro.

Já fui tão maior que Schopenhauer que duvido que terei um sucessor” Alguém tendo-o escrito nos anos 50 tinha já cem por cento de segurança na afirmação…

A vitória militar, se por algum engano do destino for nossa, não vai nem ao menos por isso curar nosso jeito azedo e turrão”

Eu preferia ser um psicólogo do que o Deus do Gênesis”

Como a Alemanha é a negação da França, a Rússia é a negação da Alemanha. A Rússia tem 2 vantagens em relação a nós: tem mais salas onde se lutar e mais judeus com quem lutar.”

Uma querela entre 2 filósofos deve ser levada tão a sério quanto uma discussão filosófica entre 2 pedreiros.”

Toda mulher é uma prostituta no coração e até compreender isso um homem não pode conhecer a pureza virgem de seu ser”

Não só eu, mas os sofistas modernos estão em seu pôr-do-sol: por sofistas da modernidade quero dizer os humanistas, os empiristas, os relativistas, os utilitaristas e os individualistas.”

Um Aristófanes [comediante, sátiro] do séc. XX vai me tachar como um Demócrito, pilhando-me como este foi pilhado: Longa vida ao Deus Furacão que destronou Zeus!

quando em Turim eu vi um cavalo ser açoitado pelo cocheiro eu corri da minha casa e abracei o animal, preocupando-me com seu devir. [esse detalhe biográfico de N. é autêntico] § Essa foi a causa de minha ruína: a divisória entre minha pregação e minha prática, e isto foi parte também da grande linha entre o antes e o depois do pensamento ocidental, que como eu ficará louco.”

Se Deus tem pena de nós, ele está jogando com um dado interminável.”

Aquilo sobre o que outros filósofos escrevem livros eu me contento em escrever parágrafos.”

Só desenvolvemos 3 sistemas numéricos – contra mil línguas e 10 mil sistemas de raciocínio”

Kant teria sido um filósofo melhor se tivesse dado ao menos 10 anos de aula de Filologia, o que ter-lhe-ia aclarado a importância de se fazer entender antes de ter certeza de que é entendido

A democracia é de números e é sustentada diretamente pelos matemáticos anônimos cujas obras foram destruídas no incêndio da biblioteca de Alexandria. Que pena que a natureza humana não é delineada pelas simples linhas, vamos dizer, das proposições euclidianas!”

Se você é incapaz de ler Platão pelo simples prazer de lê-lo, leia-o visando ao ensinamento que ‘grita’ nas entrelinhas de cada diálogo: há somente um mundo, o mundo da experiência dos homens.”

CITAÇÃO DE MARX: “Os egípcios nos legaram uma verdadeira história de seu caráter nacional no Livro dos Mortos. Para caracterizar nosso tempo alguém deveria escrever um Livro dos Alemães Renegados – para incluir alguns que quiseram escapar mas não conseguiram – como eu. Se – os céus me proíbam – eu me tornasse o autor de tal obra, abriria com uma dedicatória a Heinrich Heine e encerraria com um comentário sobre Karl Marx, diante de quem os fins da criação teriam servido muito melhor se ele tivesse permanecido na Prússia, onde ele seria finalmente germanizado ou levaria um tiro. Como se sabe, Marx encontrou resguardo do germanismo na Inglaterra, de onde ainda nos dispara suas teorias pelo Canal da Mancha. [O humor do anacronismo do falsificador, o ‘Pseudo-Nietzsche’ que compôs a obra, é que isto devera ter sido escrito, se pela mão nietzschiana, em 1989, porém Marx morrera já em 1983 – tudo indica que jamais tendo ouvido falar de Nietzsche, e vice-versa.] Nesse cenário eu me desejaria qualquer lugar no centro, onde, aproximadamente, estou. [referência ao manicômio de Naumburg – wiki: “Naumburg is a town in the district Burgenlandkreis, in the state of Saxony-Anhalt, Central Germany.”]

Quanto a Marx, ele escreve num alemão tão ruim, o qual ele adorna com copiosas citações do latim e do francês [ironicamente a mesma crítica de estilo, pelo menos na parte das citações, poderia ser facilmente atribuída ao próprio N.] – línguas que ele parece não conhecer muito bem – a fim de impressionar a massa e confundir aqueles que esperavam poder entender.” Exagero evidente. Comparar Kant e Marx em questão estilística, p.ex., seria uma heresia – o segundo leva ampla vantagem!

Em Heine os judeus nos deram muito; em Marx, muito pouco”

Marx está para a lei da oferta e da demanda como Darwin está para a lei de sobrevivência do mais forte. Ambas as leis são o resultado de uma nova paixão produzida pelo séc. XVIII – pesquisa com ponto de vista.” Divertido especular sobre este comentário, sabendo que foi produzido no séc XX. Darwin não formulou a lei de sobrevivência do mais apto fora do reino animal, mas influenciou decisivamente seu emprego nas gerações posteriores. O que acontece com Marx sobre a lei de oferta-procura/demanda é um pouco diferente: ela é anterior a ele (efetivamente do próprio séc. XVIII); porém ele deve ser estudado mesmo pelos economistas liberais para que outros fundamentos da economia sejam compreendidos em relação com ela. Não há nada de correto em Adam Smith que não esteja em Marx, mas a lei da oferta e da demanda não é nada diante do escopo d’O Capital. Como Darwin deve ter muito mais informações preciosas em seus diários de viagem do que essa infame conseqüência política involuntária que gerou!

A verdade ainda ludibria; mas não é mais aquela moça formosa, e sim uma velha rabugenta e desdentada.”

Não quero ser mal-entendido: eu evito ler Marx tão apaixonadamente quanto enveredo por cada nova estrofe de Heine.”

O Capital descobriu duas coisas que são os temas básicos dos congressos socialistas: 1) a mais-valia, pois o operário trabalha para gerar mais do que é vitalmente necessário para si, e até para si e para o capitalista juntos; 2) esse novo poder de exploração da classe trabalhadora é levado a um extremo tal que o burguês se torna, no mundo do dinheiro, tão poderoso e superior aos homens quanto uma vez fôra o divino senhor feudal.”

O que não conseguirmos pela fé conseguiremos através dos métodos mágicos”

Hegel é um Spinoza guiado pela velocidade de nossa idade industrial”

É melhor que o mundo não saiba – ao menos enquanto ela viver – que Elizabeth cumpriu o mesmo papel em minha vida reservado a Augusta frente a seu [meio-]irmão caçula Byron.” WIKI: Augusta Maria Leigh was the only daughter of John ‘Mad Jack’ Byron, the poet Lord Byron’s father, by his first wife, Amelia, née Darcy.” Aparentemente, todo o significado do dito é que N. usava as cartas para E. a fim de caluniar sua mãe: “Augusta’s half-brother, George Lord Byron, did not meet her until he went to Harrow School, and even then only very rarely. From 1804 onward, however, she wrote to him regularly and became his confidante, especially in his quarrels with his mother. Their correspondence ceased for 2 years after Byron had gone abroad, and was not resumed until she sent him a letter expressing her sympathy on the death of his mother, Catherine in 1811.” Não gostaria de crer que o autor-falsificador de Minha Irmã & Eu quisesse pôr em evidência o ‘lado negro’ da relação entre Byron e sua irmã: “Not having been brought up together, they were almost like strangers to each other. But they got on well together and appear to have fallen in love with each other. When Byron’s marriage collapsed and he sailed away from England never to return, rumours of incest were rife.” Seja como for, a quem interessar possa: “Augusta is also the subject of Byron’s Epistle to Augusta (1816) and Stanzas to Augusta.”

Cinquenta anos depois de minha morte, quando eu tiver me tornado um mito, minha estrela brilhará no firmamento enquanto o Ocidente será eclipsado na escuridão, e pela própria luz que eu emito. Minha filosofia do poder será reexaminada, então, não como poder [político] mas como Providência.”

Mulheres são a única propriedade privada que tem total controle sobre seu proprietário.”

A idéia da transmigração das almas não é tão tola quanto parece, e meu conceito do eterno retorno é meramente a reencarnação moderna do credo pitagórico. Uma vez fomos cães e ainda regressaremos ao domínio primata dos caninos.”


IRA-ATA: AINDA VAMOS REGRESSAR AO DOMÍNIO PRIMATA DOS CANINOS

Torturando, espremendo cães. Qual foi o último que eu vi? Hoje sonhei de novo. Meus sonhos agora se relacionam a estar preso com os pais em algum lugar que não é a minha casa, e algo sem forma me tortura, algo de que eu não podia me esquecer. Foi o cão da Connie o último que toquei. Eu beijava a R. e de alguma forma me ocultava dos anfitriões indesejados. E por que tantos banheiros? Supra-homem Bill Lunch. “I spread disease like a dog…” Ter vivenciado caninamente a idade média não é absurdo, mas nada seria sem a CONDIÇÃO HUMANA, esse pathos que olha para baixo e para cima das cadeias com seus próprios olhos. Também já fui pedra e fui estrela. O pequeno príncipe me revive um tipo de consciência cósmica longamente entalada. A National Acrobat. Raul Seixas. Engraçado… o que eu estava fazendo dia 19 de janeiro de 2008? Tianguá e o demente. Surpreendente autocontrole. E interesse pelo tio-avô tão camponês. Moscas malditas e R. Eu sou a bomba atômica e sou a flor.

(06/11/2009)


Hegel incorreu num sexto sentido – o senso histórico”

O Homem do Subsolo de Dostoievski e o meu supra-homem são a mesma pessoa”

Talvez os pregadores de Alá me inscrevam em suas memórias como o único cristão honesto da Europa – um cristão honesto demais para aceitar a escravidão moral paulina e que preferiu, como Jesus ele mesmo, cremar-se no relâmpago do Velho Testamento.”

Salomão, o único judeu com ganas de imperador, promotor da Pax Judaica no mundo bárbaro. Seu império poderia se esticar até o fim do mundo, paraíso e terra sob a propaganda de Jeová.”

A suprema doutrina das mulheres seria a obtenção do infinito orgasmo.”


DEMOCRACIA                    X                          EUCLIDES, O “TRIGONOMÉTRICO”

estatísticas                                                                              forma

redução ao ideal                                                                não-números

paradigma do hospício                                                         potências

controle da maioria                                                  (eu sou um círculo maior)

razão                                                                           desprezo das minorias¹

¹ Provável alusão ao fato de que os gregos não se preocupavam com quantidades irracionais ou desprezíveis nas exressões matemáticas.


Há dois tipos de bárbaros; aquele que precede séculos de iluminismo e aquele que os sucede” Na mesma página cita Condillac, polímata da época iluminista.

O idealismo moral não pode suplantar a compulsão econômica de nossa era: Ruskin, Carlyle e outros britânicos obsoletos, especialmente o cabeça-de-vento John Stuart Mill, não aprenderam o básico sobre a modernidade. Se eu não fosse César seria Cristo, o Socialista, montaria num jumento e cavalgaria até Jerusalém com Marx. A ambição de poder dos marxistas complementa a ambição de poder dos nietzschianos, mas eu prefiro chegar a Jerusalém num cavalo de batalha árabe, ao invés de no lombo dum burro proletário.”

Brandes me chama de um anarquista aristocrático – e é exatamente o que eu sou. Quem, senão um judeu, para me desmascarar e contemplar esta face de Disraeli, o tory radical? O radical extremado e o reacionário extremado são irmãos debaixo da pele: ambos têm inclinação para demagogias liberais e humanitárias, e só conhecem um caminho rumo ao triunfo – a vontade de potência.” Moderados, demasiado moderados, assim nós da esquerda teríamos de nos classificar hoje.

As pessoas precisam ser governados com mãos de ferro, e eu profetizo uma época de Césares proletários [Lenin e Stalin?] que agirão como Rousseaus, enquanto Marx acaba construindo e sendo a vanguarda ideológica de ditaduras democráticas onde as iniciativas da companhia de água e esgoto e do fabricante de calças [!] são identificadas como a vontade de Deus e codificadas em leis draconianas escritas em letras de sangue.”

Dizem que por tomar o lugar do Senhor no meu sistema filosófico eu provei minha egomania. Mas na verdade eu sou extremamente modesto. Para mim, ocupar o lugar de Deus é um rebaixamento e humilhação, não uma rara promoção aos picos do Monte Sinai! § Ao invés disso, eu sequer deveria ter falado em deus na minha obra, deixando esse problema para os ingleses – Carlyles com mania de grandeza – resolverem.”

Não há lugar que não fique tedioso a longo prazo”

Me pergunto o que seria de Kant se tivesse sido induzido a viajar de navio”

Só num país como a Alemanha eu, o autor de Zaratustra, teria a necessidade de pagar do próprio bolso sua quarta e última parte!” Esse fato é verdadeiro.

O supra-homem não é uma fantasia privada: é nossa realidade biológica e transcendental”

Se Deus não tivesse morrido seguramente o século XX não ocorreria”

há mais segurança na caverna de Platão”

eu sou o fulcro da História (…) ainda que também o encontrem no Príncipe de Maquiavel”

o veneno anti-semita que cada alemão bebe do leite da mãe”

espero não viver o suficiente para ultrapassar este século”

Eu nunca imaginei o fim da raça humana porque eu tenho uma visão trágica da vida”

Berlioz, “o supra-homem da música”.

Em menos de 50 anos ser chamada de ‘wagnerete’ provocará processo por calúnia e difamação contra o ofensor, e quando uma ópera wagneriana for mencionada em nobre companhia haverá mal-estar na sala.”

Me ssa lina

Impregnemos nossas vidas com a impressão da eternidade! Vamos viver de modo que desejássemos sempre viver de novo: esse é meu credo, ontem, hoje, amanhã, e nos ontens que sucederão o amanhã.”

“Odeia-se mais aquele que nos seduz de volta a percepções sobre as quais nos tornamos vitoriosos com extrema dificuldade” Nietzsche. A seguir, um pouco sobre mim.

Eu já fui um liberal de tipo PSDBista. Odeio liberais. Odeio os ‘social-democratas’ (falsa esquerda, quinta-coluna). Eu já fui um ateu militante (na pré-adolescência, é verdade). Odeio esses ateus mais cristãos que os cristãos (leia-se: mais anticristãos que os anticristãos!). Odeio quem ama a sociologia. Odeio os hedonistas. Odeio metaleiros. Odeio são-paulinos. Odeio otakus. Odeio “gamers”. Odeio os que levam o trabalho a sério demais e adoecem por isso. Adoro aqueles que sabem ser anti-monoteístas, stalinistas, maoístas, fidelistas, chavistas, putinistas, aqueles que sabem usar a sociologia como anti-sociologia, para o verdadeiro progresso da sociedade (no sentido oposto a Comte-Durkheim), aqueles que sabem ouvir heavy metal, assistir e falar de futebol, apreciar jogos de videogame e desenhos japoneses sem parecerem completos imbecis infantilizados e extremistas desnorteados. Com efeito, odeio hoje todo e qualquer colega dos tempos de escola (avatares de todas estas categorias reunidas). Eles não acompanham o ritmo da dança. A classe média insossa do DF, minha grande nêmese. Já fui o mais insosso dos sem-sal, hoje sou um tempero exótico da Índia.

O LEGADO DE GEORG GRODDECK: Genuinidade e Originalidade (mestrado em Psicossomática e Psicologia Hospitalar, PUC/SP, 2009, 1ª versão) – Maria Consuelo da Costa Oliveira e Silva

Escrita péssima! Mais abaixo entrarei em pormenores!

INTRODUÇÃO

O que é Psicossomática?

Como uma primeira tentativa de responder esta questão, a autora deu início ao Mestrado na área de Psicossomática e Psicologia Hospitalar. A partir deste momento, passou a se aprofundar em alguns autores, citados como referência nesta temática: Joyce McDougall, Pierre Marty, Rosine Debray, Franz Alexandre, (sic) entre outros. Porém, um autor em particular chamou a atenção, não só por ser um autor considerado como o ‘Pai da Psicossomática’, mas também, e principalmente, por sempre vê-lo citado como referência pelos autores acima mencionados.”

Os estudantes foram maçados com fórmulas e hipóteses que precisavam esquecer para poderem ajudar os seus doentes” GG

Médico, ou o Açougueiro

Este autor é de quem FRAUD tomou emprestado por sua vez o termo ‘Id’, porém caracterizando-o a seu gosto e deformando-o para que se encaixasse em suas idéias. Groddeck não pode tolerar isto e se afasta da psicanálise.” Editado onde é óbvio.

Tese baseada em fontes primárias mas que não consulta as fontes primárias (apenas traduções dos originais em alemão)!

Diferente de Freud, que estava fortemente influenciado pelas ciências naturais e seu determinismo, reducionismo e mecanicismo, Groddeck estava impregnado pelo Romantismo.” Aleksandar Dimitrijevic, 2008erro crasso: Henri Ellenberger e eu sabemos o quanto FRAUD é tributário do Romantismo em ainda mais alto grau (ampliando seus defeitos e aporias). Isso será repisado na seqüência.

Em 1909, Groddeck profere um ciclo de conferências, ‘Rumo ao Deus-Natureza’ e o nome de Goethe é mencionado como alguém que disse: Deve-se considerar cada coisa como parte de um todo. Observem o todo na parte, e a parte no todo. […] Goethe foi maior como pesquisador da natureza do que como poeta. (GRODDECK, 2001, p. 26).”

W.G., Bei Betrachtung von Schillers Schädel

Agora a atenção se desloca para outro autor, Carl Gustav Carus (médico e paisagista), não citado por Groddeck, autor de um livro sobre Goethe (1843) e cartas a respeito de Fausto (1835).”

Carus, Lições sobre psicologia

C., Psyche, Zur Entwicklungsgeschichte der Seele

É importante lembrar que ele falava de si mesmo como o ‘quinto’ Groddeck e derivou uma série de raciocínios a partir do número cinco. E o que significa esta lembrança? O período de vida deste clínico geral começa em 1866 (cinco anos antes da unificação da Alemanha) e morre em 1934 (cinco anos antes da invasão da Polônia pela Alemanha e do início da Segunda Guerra Mundial).”

É importante ressaltar que os pacientes atendidos por Groddeck padeciam, na maioria dos casos, de doenças orgânicas e que ele não era psiquiatra, mas sim clínico geral.”

(*) “Sandor Ferenczi assumiu uma posição distante e crítica às idéias do médico de Baden-Baden e mesmo assim aceitou escrever uma resenha favorável ao primeiro texto que Freud leu de Groddeck. No final de 1921, Ferenczi resolveu tratar-se no sanatório de Groddeck em Mariennhöle, sem que isso significasse que tivesse se tornado adepto das idéias proferidas neste local. Mas a partir deste instante iniciou-se uma longa amizade entre esses dois homens, com uma intensa e significativa troca de correspondência, que começa com um pedido de compreensão [??] que está presente numa carta escrita por Ferenczi no Natal de 1921. Este pedido de vínculo envolverá vários aspectos da vida amorosa de Ferenczi, sua insatisfação com Freud e com a sua análise, o pedido e a necessidade dele por análises mútuas, e como este pedido revela alto grau de honestidade

emocional, Groddeck se converte no companheiro analítico mútuo o (sic) que Freud não chegou a ser. E esta relação de amizade e confiança profunda, com visitas constantes, principalmente de Ferenczi a Baden-Baden, durará até a morte deste em 22 de maio de 1933.”

(*) “Nas suas Memórias Groddeck se refere a Keyserling como sendo […] o mais brilhante interlocutor que jamais encontrei, um completo homem do mundo no melhor sentido da palavra e um homem que sabia dar e receber. Encontram-se com bastante freqüência os que sabem dar, pelo menos se se tiver o dom de se deixar presentear; os que sabem receber já são mais raros, pois cada um se desacostuma o mais rápido e radicalmente possível do ingênuo receber da criança, para logo pisar com prazer na lama do pagar e quitar, igual a todos os outros; como se algum dia algo pudesse ser pago. […] Então, homens que sabem dar e receber quase não existem. Considero uma graça especial do destino ter conhecido Keyserling. […] Conheço muito bem a sua paixão pela sabedoria, o que se pode chamar de filosofia, e foi assim que ele a chamou. E sendo ele o único entre milhares que suspeita do que seja sabedoria, considero justo que tenha dado à instituição de Darmstadt o nome de ‘Escola de Sabedoria’. […] Estive várias vezes em Darmstadt e existe o fato de que Keyserling é capaz de harmonizar de forma perfeita os pensamentos de homens de tão diferentes correntes de espírito e índoles, como Scheler, Jung, Frobenius, de tal forma que o ouvinte, mediante um claro conhecimento de cada personalidade individual e através de um interesse atento pela lei individual sob a qual vive o orador, pode facilmente absorver e assimilar o humano em geral; este fato dá a Keyserling o direito de afirmar que, em Darmstadt, se está realizando algo de diferente que não é oferecido em nenhum outro lugar e que só pode ser realizado por ele. (GRODDECK 1970, 1994, p. 322–323).”

(*) “Em 10 de junho de 1934 morre em Zurique, com a idade de 67 anos, o médico de Baden-Baden Georg Groddeck, o único autêntico e qualificado continuador da escola de Schweninger. Com ele desapareceu um dos homens mais extraordinários que eu jamais havia encontrado. Era a única pessoa minha conhecida que sempre me fazia pensar em Lao-Tsé: seu não-fazer era criativo, a um nível inclusive mágico. Ele se atribuía o princípio de que o médico não sabe nada, nada pode fazer e pouco tem o que fazer: deverá somente, com sua presença, despertar as forças curativas inatas no paciente. Naturalmente, esta técnica de não-saber, de não fazer por si só, não lhe daria condições de manter ativa sua clínica em Baden-Baden. Portanto, ele curava fazendo uso de uma combinação de psicanálise e massagens. […] Foi assim que Groddeck me curou, em menos de uma semana, de uma flebite recorrente.¹ […] Sem dúvida, em Georg Groddeck, eu não amava e respeitava tanto o médico como o sábio paradoxal. Ele não pertencia a nenhuma escola: sobre cada coisa tinha suas opiniões estritamente pessoais e freqüentemente heréticas. E todas elas eram entendidas no sentido justo, não muito ajustadas ao literal, opiniões profundas. Não conheço nenhum filósofo da natureza que como ele tenha ressaltado a condição da infância; até quase se poderia dizer que seu ideal era o ovo, posto que nenhum organismo já formado saberia do que o ‘Isso’ é capaz. […] Porém, como acontece freqüentemente com as pessoas de vida rica, a presença pessoal de Groddeck contava muito, muito mais do que aquilo que ele expressava em suas palavras e em suas teorias. Disso puderam se interar, (sic) até agora, os participantes dos seminários da ‘Escola da Sabedoria’ em Darmstadt: onde apesar de que muitas vezes ele tomava a palavra, era sobretudo sua simplicidade, sua presença viva o que fazia de Groddeck um participante único daquelas reuniões (sic) pensar por si mesmo. […] Porém, no íntimo, foi um dos homens mais cálidos, mais carinhosos, mais preocupados pelo bem-estar alheio que jamais havia encontrado. Epílogo a El Libro del Ello, de Georg Groddeck de (sic) Hermann Keyserling”

¹ “Inflamação de uma veia, a qual geralmente afeta os membros inferiores, podendo provocar a formação de um coágulo (tromboflebite, causa de embolias). Os anticoagulantes evitam esses acidentes.”

1. OBJETIVO

O objetivo deste trabalho é fazer uma leitura detalhada da obra de Georg Groddeck, dentro de um espaço de tempo definido como período pré-psicanalítico.”

2. PANORAMA HISTÓRICO ANTERIOR À OBRA DE GRODDECK

A primeira conseqüência da Reforma foi o isolamento da Alemanha durante cerca de dois séculos, divorciando-se da cultura latina. Depois, segue-se uma série de movimentos subseqüentes, que tendem não só a integrar a Alemanha na Europa, mas sobretudo a reabilitar os seus valores. No século XVIII surge o primeiro desses movimentos, a Aufklärung que deve ser compreendida como um esforço de assimilação da cultura européia. Em seguida, o Sturm und Drang (Tempestade e Ímpeto), um Pré-Romantismo rebelado contra o classicismo francês e desperto aos valores germânicos. Depois o classicismo alemão, alheio a exclusivismos exacerbados, tendendo a realizar uma síntese européia da cultura. E finalmente, o Romantismo, no qual a Alemanha atinge a sua máxima maturidade cultural. Com o Romantismo, os papéis se invertem. Se a Alemanha vence o ‘obscurantismo’ graças à influência do Classicismo latino, o seu Romantismo impõe-se a toda Europa. (GERD BORNHEIM, in J. GUINSBURG, p. 78, 1997).”

A palavra deriva do francês Roman, que se refere a uma história, usualmente uma história militar de criaturas medonhas, cavaleiros heróicos e amor cavalheiresco. Quando a palavra entra na Alemanha, próximo ao final do século XVIII, ela carrega o significado de romanhaft, semelhante a uma novela, especialmente o tipo de história ou atitude típica do gênero. […] [Schlegel] deseja empregar o termo mais especificamente para descrever uma forma de literatura poética desenvolvida no período moderno que expressava os interesses subjetivos do artista” Robert Richards, 2002

a tarefa dos românticos não é a rejeição mas a transformação da ciência, ir além do estabelecido. O seu propósito tem que ser ampliado, a ciência deve se dirigir para as profundidades como também para as alturas.” Correto, pequena Gaia-Padawan!

A NEO-SEITA DA FILOSOFIA NATURAL: “Os filósofos da natureza estão associados com a filosofia idealista alemã, e abordam a natureza a partir do pólo do pensamento puro.” Zajonc, 1998

A partir de Descartes e Newton, até Hume e Kant, o mecanicismo foi empregado como o conceito básico pelo qual é possível compreender não somente o universo inanimado como também a realidade viva.”

O mecanismo do relógio em si mesmo é fundamentalmente atemporal e então a-histórico. Mas a natureza como autogerativa, como orgânica, pode ter uma história. […] A infusão do tempo na natureza não foi meramente uma condição necessária para o aparecimento das teorias evolutivas; ela constitui essas mesmas teorias durante os séculos XVIII e XIX.” Richards

1) Romantismo Inicial (Die Frühromantiker), situado em Jena. Alguns autores que canonicamente definem este primeiro romantismo: os irmãos Wilhelm e Friedrich Schlegel, suas esposas Caroline e Dorothea, o teólogo Friedrich Schleiermacher, os poetas e novelistas Ludwig Tieck e Friedrich von Hardenberg (Novalis), o teórico das artes Wilhelm Wackenroder e o filosofo Friedrich Schelling.

2) Romantismo Médio ou Segundo Romantismo, centrado em Heidelberg, inclui autores como os escritores Achim von Arnim, Clerius Brentano e o pintor Caspar David Friedrich.

3) Romantismo Tardio ou Terceiro Romantismo, ativo em Viena, Berlin e Munique. Este grupo mantém alguns membros do Primeiro Romantismo, como o crítico literário e historiador Friedrich Schlegel e o filosofo (sic) Friedrich Schelling e também novos participantes como os escritores Johann Ludwig Uhland e E.T.A. Hoffman.”

O ato de fundação da Filosofia da Natureza pode ser estabelecido em 1797 quando Schelling publica a sua obra Ideen zur einer Philosophie der Natur.”

a antiga idéia platônica de um principio (sic) vivificante que perpassaria a totalidade do mundo” interpretação não-autorizada

SÁBIO GOETHE: “Com efeito, ele disse ser ‘politeísta’ como poeta e ‘panteísta’ como cientista, mas ainda assim abria a possibilidade para um Deus pessoal”

De todos os precursores, Carus chama maior atenção da psicologia porque a sua apresentação do inconsciente mostra-o principalmente como um psicólogo. Sua idéia do inconsciente, não é nem um flash poético nem um sistema filosófico especulativo, como nas mãos do jovem von Hartmann [ou seja, já caiu nas minhas graças!] […] nem tampouco é um conceito médico heurístico, semi-neurológico e útil para explicar processos mentais desconhecidos. […] Carus descreve processos psicológicos em detalhe e ainda assim mantém uma visão holística” James Hillman, 1989

Carus nasceu em 3 de janeiro de 1789, em Leipzig. Nesta cidade cursou a Universidade, estudou medicina em função de seu interesse pela ciência da natureza, começou a dar palestras no campo da anatomia comparada, recebeu seu Doutorado (sic) com 22 anos e no mesmo ano casou-se (1811).” Ai, os românticos… Tão apressadinhos para viver!

Carus pertence à história da arte como um reconhecido pintor de paisagens, tendo deixado uma coleção de 420 pinturas e 1100 desenhos.” “Seu período de vida abrange desde a Revolução Francesa até a era do moderno positivismo, liberalismo e nacionalismo.”

Durante seus primeiros anos em Dresden, Carus primeiramente se aproximou de Goethe que, apesar de ser 40 anos mais velho que ele, muito o admirava. Carus escreveu um livro, Goethe (1843) e publicou, em 1835, uma série de cartas sobre o Fausto. Goethe refere-se a Carus em suas cartas e notas. Ele era particularmente entusiasmado com as Lectures on Psychology (1831) vendo-o como um herdeiro de sua abordagem da natureza e da vida.”

Na bibliografia de Groddeck é possível perceber que em momento algum Carus é citado. No entanto a forma como Groddeck concebe o inconsciente, principalmente a relação entre o inconsciente e a doença, e também ao reconhecer a capacidade curativa presente na natureza[,] é muito semelhante à de Carus.”

Nasa (a natureza cura) (…)

Mecu (médico cuida).

Já a Nasa americana não irá nos salvar…

3. MÉTODO

capítulo inútil

4. CRONOGRAMA DOS ESCRITOS DE GRODDECK

Somente os mais interessantes (em aparência):

Konstipation, 1896

Ein Frauenproblem, 1903

As núpcias [Hochzeit] de Dioniso, 1908 (poesia)

Tragödie oder Komödie? Eine Frage an die Ibsenleser, 1910

5. O LEGADO P.D.

5.1. GEORG GRODDECK – DO NASCIMENTO ATÉ SUA ADOLESCÊNCIA.

Eram filhos do doutor Carl Theodor Groddeck (1826-1885), epidemiólogo e posteriormente médico ‘termal’, e de Caroline Koberstein (1825-1892). Antes de prosseguir com as notas biográficas de Groddeck, é necessário fazer um breve percurso em torno da cidade onde ele nasceu e posteriormente pela biografia dos pais.”

Duvido que esmiúce a questão do protonazismo do pai de Gr.

LINDA HISTÓRIA (sem ironia!): “Isto nos faz retomar a biografia dos pais de Groddeck. O pai, Carl Groddeck, era filho de um deputado de Danzing, sua cidade natal, no norte da Alemanha. Já sua mãe, Caroline, era filha do professor August Koberstein, historiador da literatura alemã e professor em Pforte por 50 anos. Caroline e Carl se conheceram quando ele ainda era estudante em Pforte. O jovem estudante era pensionista na casa dos Koberstein e foi acometido por um distúrbio cardíaco que perduraria por toda a vida. Durante a convalescença, Carl permaneceu na casa do professor, o que proporcionou o tempo e a intimidade suficientes para que os dois jovens se apaixonassem. A Senhora Koberstein era quem se ocupava do paciente, e por este motivo Carl tinha muito apreço por ela. Por sua vez a filha, Caroline, nunca falava de sua mãe com muita admiração, diferente de como se referia a seu pai. A mãe era uma mulher totalmente comum, mas com uma facilidade para atrair pessoas, o que para a filha era um defeito. Independente de como a Senhora Koberstein era vista por sua filha, para os demais, no entanto, era uma pessoa notável.”

Em 1849, Carl Groddeck formou-se na Faculdade de Medicina da Universidade de Berlim, com a tese com o título em latim De morbo democratico, nova insaniae forma. Em 1850, Carl apresenta-a em público, revista e ampliada, agora com o título em alemão: Die Demokratische Krankheit, Eine Neue Wahnsinnsform.” Que pretendo logo ler.

Nas suas Memórias, Groddeck escreve sobre seu pai:

[…] Como era normal na época – eram os anos em torno de 1848 – aquele que estivesse mais próximo da política se tornava o centro do círculo; era o meu pai. Tirando o fato de ter ele, como filho de um deputado, sido atraído para o movimento com mais força do que os outros, ele pusera na cabeça mostrar-se ativo e, pela necessidade de ser incomum – uma necessidade que infelizmente adotei e que levei uma grande parte da minha vida para neutralizar – ele o fez de um modo característico: escolheu para sua tese de doutoramento o tema: (…) A doença democrática, uma nova forma de loucura. Foi esta a única vez que meu pai se apresentou publicamente, e não ficou pouco orgulhoso deste grande momento; já idoso, ele me contou com grande alegria como tudo teria acontecido, como o pequeno salão não foi suficiente para a afluência do público e todos passaram para o grande salão da universidade, como foi assaltado por todos os lados e escarnecido e como a situação se tornou difícil por ter que se defender em latim, de mais a mais, contra 2 dos melhores mestres de línguas antigas. Naturalmente, tornou-se desse modo o herói de seus amigos. (GRODDECK 1929, 1994, p. 326)

Na carta ao Prof. H. Vaihinger, citada anteriormente, o editor adiciona a nota de rodapé 9 que amplia o tema da dissertação de Carl Groddeck, sua importância e relevância para a obra de Nietzsche. No prefácio à 5ª edição, de 1930, de seu livro Nietzsche als Philosoph, Vaihinger escreve:

A posição antidemocrática de Nietzsche é fortemente influenciada pela dissertação de Carl Theodor Groddeck, De modo democratico, nova insaniae forma, tese aprovada pela Faculdade de Medicina de Berlim no ano da Revolução de 1849 e famosa e muito discutida nos círculos mais amplos. […] A defesa pública da tese, em 21 de dezembro de 1849, tornou-se um acontecimento político de grandes proporções: líderes do Partido Democrático apresentaram-se como oponentes, como, por exemplo, Krüger, o importante filólogo clássico e gramático. Enquanto o original latino é encontrado em todas as bibliotecas universitárias alemães entre as teses de medicina, a edição alemã, publicada pelo próprio Groddeck em 1850, Die Demokratische Krankheit, Eine Neue Wahnsinnsform, tornou-se muito rara. […] A tese de Carl Theodor Groddeck […] é extremamente séria, e como tal deve ser considerada: em conexão com a literatura psiquiátrica da época, especialmente com a teoria de Hecker sobre as doenças mentais contagiosas, Groddeck descreve o movimento democrático espalhado por toda a Europa como uma epidemia do espírito. – O título e o assunto parecem menos escandalosos, se considerarmos que os ‘democratas’ de então não podem ser identificados ao partido político tão característico hoje em dia. Pois os ‘democratas’ de 1848 abrangiam não só os constitucionalistas e os republicanos de todas as correntes como também os socialistas, comunistas e anarquistas. [Não, é justamente por isso que o assunto parece mais escandaloso a nossos olhos!] […] Friedrich Nietzsche foi interno em Schulpforta, de 1858 a 64, onde manteve estreitas relações com o diretor Koberstein, em cuja casa conheceu também Carl. T. Groddeck. Na casa de Koberstein falou-se muito do texto sobre a doença democrática, e desse modo Nietzsche absorveu com certeza o espírito antidemocrático e provavelmente também leu o livro. Pois muita coisa que Nietzsche diz, em inúmeras passagens das suas obras, deriva[,] quase palavra por palavra, das concepções de Carl. T. Groddeck. [a conferir!] (VAIHINGER in GRODDECK 1930, 1994. p. 117/9)“

[mas] o que é possível afirmar da presença das idéias do pai no pensamento futuro do filho? A resposta a esta questão será dada por Jacquy Chemouni:

Escolhendo a mesma profissão que seu pai, Groddeck não poderia deixar de conhecer sua tese de doutorado. Sua influência direta não é possível de ser percebida, mas os problemas que ela propõe produziram efeitos alguns anos mais tarde em seu filho. No entanto, o que de fato vai marcar o futuro psicanalista é a maneira própria como seu pai praticava a medicina. (CHEMOUNI, 1984, p. 23)”

De resto[,] era tão pouco neurologista quanto eu, mas um simples médico clínico, aliás, muito avançado em relação ao seu tempo, talvez também bastante distante das opiniões remanescentes da sua época, conforme se quer. Nos seus últimos anos de vida, estudou, para uso médico particular, o livro de Rademacher, o redescobridor de Paracelso, então quase desconhecido. Eu já havia lido, no tempo do colégio, esta ‘terapêutica’ pela experiência de Rademacher; para minha formação médica e humana, foi tão importante quanto a minha relação de estudante e de amigo com Schweninger. (GRODDECK 1930, 1994, p. 118)”

Movido por um fato externo e enfrentando certa resistência da família, ambos casam-se em 14 de setembro de 1852 (RIVERAS, 2004). O fato externo que acelera o matrimônio é uma epidemia de cólera e tifo que se alastra pela Prússia, o que faz com que Carl receba o cargo de epidemiólogo na cidade de Marienburg.

O período passado em Marienburg é marcado por dois fatos importantes: em 22 de junho de 1853, a primeira filha morre um mês após seu nascimento e, em 1854, após a epidemia estar praticamente controlada, Carl contrai tifo e fica muito doente. A situação da família se torna mais equilibrada só a partir de 1855 com a mudança para Kösen, e conforme vimos, ali estabelecem uma clínica termal, que graças à atitude firme da mãe, se manteria por mais de duas décadas. Ali fixados, tiveram cinco filhos. (RIVERAS, 2004, p.23)”

Em relação ao respeito pela ciência não era possível encontrar qualquer vestígio disso em suas palavras e atos.” Quem nos dera os doutores acadêmicos de hoje assim o fossem, na prática!

Sobre o relacionamento entre seus pais, desde pequeno Georg Groddeck percebia que existia uma distância irreparável entre os dois, e discorre sobre as atitudes que o pai tinha, com o intuito de agradar a esposa: ‘Creio que tentou honradamente converter-se em um Koberstein’. (apud GROSSMAN, 1967, p.18). Por este motivo, se comportava como se a medicina significasse apenas uma forma de viver, pois para Caroline era a Literatura que valia a pena, e não a medicina.” “para Groddeck, o pai era o homem mais forte e mais sábio do mundo. Era um pai severo, porém afetuoso, que os filhos adoravam, mas que nunca encontrou a aceitação plena da esposa.”

Para Groddeck, o fato de ter sido amamentado por uma ama-de-leite e ter uma mãe verdadeira que lhe dava carinho o colocava em dúvida sobre qual das mulheres amar, dilema que tornaria todas as suas escolhas mais difíceis”

Você já imaginou as atribulações de uma criança amamentada por uma ama? É uma situação complicada, pelo menos quando a mãe verdadeira gosta da criança. De um lado a mãe, em cuja barriga a gente viveu durante nove meses, sem nenhuma preocupação[,] no quentinho, nadando na felicidade. Como não gostar dela? E depois, uma segunda pessoa, em cujo seio a gente se alimenta todo dia, cujo leite a gente bebe, sentindo sua pele fresca e respirando seu cheiro. Como não se afeiçoar por ela? E então, a quem se apegar? Alimentado pela ama, o bebê se coloca num estado de incerteza do qual nunca conseguirá sair. Sua capacidade de crença se vê abalada em suas bases e a escolha torna-se para ele mais difícil do que para os outros.” Eu, como alguém amamentado por uma “ama-de-leite”, digo: tudo isso é uma grande besteira fraudiana avant Fraud!

Próximo de completar 6 anos foi à primeira escola, juntamente com sua irmã Lina. Era uma escola de meninas, uma Mädchenschule. Na época, os filhos de pais bem situados começavam seus estudos em escolas femininas. Era uma escola dirigida por três irmãs, e foi descrita por Groddeck com riqueza de detalhes:

As três irmãs Hochbohm dirigiam a escola; cada uma era mais gorda do que a outra, e a mais magra – Marie – era a mais temida. Entre outras coisas, ela nos ensinava aritmética. Sua influência, a influência do medo, foi muito grande e ainda hoje tem vestígios […]. A irmã do meio, Emma Hochbohm, era a diretora do instituto; por causa da sua obesidade, foi apelidada de ‘carrossel de duas pernas’. […] A mais velha das irmãs Hochbohm era a mais gorda; na verdade era tão gorda que não podia lecionar, porque as crianças não queriam e não podiam ser ensinadas por ela. Diziam as más línguas que ela, com toda aquela gordura, não podia passar pelo portão da igreja, mas tinha de se lançar com o ombro à frente. (GRODDECK 1929, 1994, p. 269)” Ah, as memórias infantis!

Ao sair dessa escola, Groddeck sabia ler e escrever corretamente, embora sua letra, durante a vida, não tenha mudado muito. Como diria, sua letra se manteve como a de uma criança de 8 anos. (RIVERAS, 2004)”

Este fato parece ter incomodado Groddeck, pois ele próprio se definia como ‘um pagãozinho’, que até deixar a casa paterna nunca havia entrado em uma igreja. Mas, apesar deste fato, foi nesta escola que descobriu o verdadeiro sentido do escrever” Tantas e tantas semelhanças entre nós, sr. Groddeck Jr.!

Aos 11 anos, segundo ele próprio, a desgraça se abateu sobre sua família. Seu pai havia se envolvido em negócios imobiliários e, aparentemente devido a um golpe dado por um sócio, perdeu todas as posses. A casa onde Groddeck havia nascido e passado toda a infância foi leiloada, assim como os móveis aos quais o seu coração estava ligado. O pai, sem outra saída, resolveu deixar a cidade e tentou se estabelecer em Berlim, porém não obteve o número de pacientes que esperava. Retornou a Bad-Kösen no verão para tentar ganhar algum dinheiro. A sua mãe, no intuito de ajudar a família, empregou-se como dama de companhia. Georg Groddeck entendeu este afastamento da mãe como uma traição. Pior que tudo isso, antes da dissolução da casa e de que tomasse conhecimento da situação, sua irmã, a companheira de toda a infância, foi mandada à casa de um tio para lá viver, passando a trabalhar como babá. A ferida aberta por este fato nunca cicatrizaria. Só posteriormente Groddeck descobriria que isso havia sido, de certa forma, bom para ele. (RIVERAS, 2004)”

EIS O QUARTO OU QUINTO PONTO EM COMUM ENTRE NÓS: “Pforte resultou em tudo que ele havia temido. A escola é descrita como uma fortaleza, rodeada de muros altos feitos de pedra, uma verdadeira prisão. [também, com este nome! Rockman & Pforte!] O jovem Groddeck foi um pecador desde o início, parecia desejar tudo aquilo que estava proibido: jogos de cartas, trepar sobre os muros e fumar. E depois de ser um magnífico estudante durante anos, se tornou um estudante medíocre (GROSSMAN, 1967).”

Ouvi pela primeira vez o nome de Schweninger. Meu pai falou com entusiasmo sobre ele, que devia ser um médico sob a graça divina, pois conseguira obrigar Bismarck a obedecer. Eu nunca tinha ouvido da boca do meu pai um elogio a qualquer médico e estava sinceramente convencido de que só ele compreendia a Medicina. (GRODDECK 1929, 1994, p. 332)”

Em toda a Alemanha levantou-se um tumultuoso alarido contra a violação da liberdade científica pelo tirano Bismarck. […] A gritaria chegou até a vida tranqüila de Pforte, e mesmo um tímido como eu foi arrastado para o conflito. Tomei o partido de Schweninger, e o teria feito mesmo que não tivesse ouvido a observação do meu pai sobre a genialidade de Schweninger; pois eu estava na idade em que naturezas hipersensíveis procuram abrigo no cinismo. Esta briga de dormitório decidiu a minha vida. Sem ela, eu não teria sido capaz, sendo um rapaz ignorante, de absorver as idéias de Schweninger. Quando o conheci, já gostei dele, como se gosta de algo que se defendeu com força e sorte. E como não podia ser diferente, desde então começou a minha veneração por Bismarck. (GRODDECK 1929, 1994, p. 333 e 334)”

E quando finalmente cheguei e fui instalado em cima de um colchão, um novo medo me assaltou. Eu ainda molhava a cama na época, fi-lo até os meus 14 anos. Meu irmão me prometeu uma boa surra se eu sujasse a cama numa casa estranha. Tive sorte, todavia, à custa do melhor sono. (GRODDECK 1929, 1994, p. 287)”

5.2 FORMAÇÃO PROFISSIONAL

Apesar de a escola militar ser gratuita, é necessário uma participação financeira para a manutenção do filho na escola e isto só será possível com a ajuda de alguns amigos mais abastados e próximos à família.”

aprendi a conhecer a atividade médica não com doentes, mas com pessoas sadias. Isso foi de valor inestimável para mim.”

Meu pai não percebia que eu não tinha qualquer conhecimento do latim médico, de que me eram totalmente incompreensíveis as receitas que me ditava e de que não era melhor com os nomes de doenças que eu tinha de anotar aos livros. E ficava impaciente quando eu lhe pedia que repetisse uma palavra.”

nessa época, teve lugar o acontecimento que de algum modo me tirou da minha vida de sonhos e deu a direção decisiva à minha carreira: no meio de uma consulta, meu pai sofreu um derrame. […] Na noite de 19 para 20 de setembro meu pai faleceu. (GRODDECK 1927, 1994, p. 380, 381, 385)”

Finalmente em 1° de outubro de 1885, Groddeck começa o seu curso de medicina. Um dado importante acerca do Instituto é que para poder frequentar esta instituição o aluno deveria preencher uma série de exigências, como por exemplo, ser alemão, ser filho legítimo, ter menos de 21 anos, apresentar o certificado de alistamento militar e se dispor a prestar um ano de serviço militar voluntário. Concluídos os estudos, era previsto um serviço de 8 anos como médico militar para um período de aperfeiçoamento. O estudante então, ao mesmo tempo em que assistia às aulas de seu curso de medicina, estava submetido ao regulamento militar.”

Servi sob o comando do Conde Hardenberg apenas 4 semanas. Nada sei sobre ele, nunca mais o encontrei, mas ainda assim seu nome está gravado tão profundamente na minha memória que quase diariamente penso nele. Por alguma razão totalmente injustificada, atribuo-lhe a culpa pela tosse com que eu mesmo me divirto e atormento os outros; não sei por que o faço e persisto nisso, embora saiba que não há a menor ligação entre ele e meu doce hábito de tossir claro [sic – clara] e ruidosamente a tudo o que não me agrada. (GRODDECK, 1929, 1994, p. 368)”

em Pforte ele havia sido educado dentro do espírito da cultura clássica e na tradição do humanismo, mas a partir de agora deve confrontar-se com o estudo de uma ciência com características eminentemente empíricas, permeada pelo paradigma da ciência natural (MARTYNKEWICZ, 2005). Ao perceber este choque de formação e ao mesmo tempo a permanência de Groddeck em seu esforço de se formar médico, é possível dividir este período de estudo em duas etapas. Uma primeira, na qual ocorre um encontro entre a formação e os interesses anteriores de Groddeck com esse modelo de medicina, tal como ensinado na Alemanha, encontro que, apesar das turbulências que causam, não o impedem de continuar estudando. E uma segunda etapa, que se inicia em torno da metade de seu percurso acadêmico, e que corresponde ao seu encontro com Schweninger.”

5.3 PRIMEIRA ETAPA DA FORMAÇÃO DE GRODDECK EM MEDICINA

Neste momento se faz necessário interromper a biografia de Groddeck para descrever o método de ensino da medicina da sua época e que terá influência em sua prática clínica e em sua construção teórica.”

…de um lado o hospital, principalmente os grandes hospitais públicos em Paris, e de outro o laboratório, em Berlim.” Os franceses “pouco valor deram à terapêutica”.

JACQUES LE FATALISTE: “É possível falar de uma atitude médica, que tem um tom até certo ponto fatalista, chamada de ‘niilismo terapêutico’ e que segundo Roy Porter se define como a capacidade da medicina […] em compreender as doenças de que as pessoas morriam, mas não conseguir impedi-las de morrer. (PORTER, 2004, p. 57)”

Excetue-se o ópio, excetuem-se alguns medicamentos específicos, excetue-se o vinho, que é um alimento, e os vapores que produzem o milagre da anestesia, e creio firmemente que, se toda a matéria médica, tal como é hoje usada, fosse atirada no fundo do mar, seria muito melhor para a humanidade – e muito pior para os peixes.” Oliver Wendell Holmes, Medical Essays, 1891.

para Pierre Louis e seus colegas, a medicina clínica era uma ciência da observação, a ser aprendida nos pavilhões hospitalares e nos necrotérios, através da anotação e da explicação dos fatos. A formação médica devia ser uma disciplina da explicação dos aspectos visuais, dos sons e dos odores da doença – uma educação dos sentidos.” Típico da França. Se não fede, não ensina.

isto é conhecido como teoria ontológica da doença.” Porter

a Fisiologia, que atingiu sua maioridade, como disciplina experimental de status superior. Seu pioneiro foi Johannes Muller, professor de fisiologia e anatomia em Berlim a partir de 1833. […] foi um professor inspirador, e seus alunos – Theodor Schwann, Hermann von Helmholtz, Emil Du Bois-Reymond, Karl Ludwig, Ernst Brücke, Jacob Henle, Rudolf Virchow e muitos outros – tornaram-se os dirigentes da pesquisa científica e médica no mundo alemão e ganharam fama internacional. (PORTER, 2004, p. 103)”

Com a fisiologia científica nasce um novo paradigma que se impõe sobre o conceito vitalista dominante no início do século XIX e sob a influência do naturalismo romântico de Friedrich Wilhelm Schelling. A fisiologia inspirada na filosofia da natureza de Schelling postulava a unidade da natureza e do espírito, indagava o conceito de vida e refutava qualquer descrição fisiológica isolada de um fenômeno singular.” MARTYNKEWICZ, 2005, p. 93.

Como foi dito anteriormente, um dos discípulos de Johannes Muller foi Rudolf Virchow, considerado o mais criativo dos pesquisadores médicos alemães. Virchow é conhecido, entre outros resultados, pela sua máxima Omnis cellula e cellula (todas as células provêm de células)”

O câncer, demonstrou Virchow brilhantemente, surgia de mudanças anormais nas células, que então se multiplicavam de maneira descontrolada através da divisão (metástase). (…) Assim, Virchow defendeu uma concepção interna da doença; por essa razão, em parte, ele veio depois a suspeitar da bacteriologia pasteuriana, a qual considerava muito superficial, por ela ver a doença como sendo de causa essencialmente externa.” Porter

Assim, minha mãe entrou em contato com a sociedade bom-tom de Berlim e soube angariar prestígio. Entre outros, Rudolf Virchow foi um dos seus admiradores. Quando mais tarde, fui reprovado nos exames estaduais de medicina por Virchow, por falta de conhecimento em anatomia patológica, tentei atribuir este fato à atitude pouco amável da minha mãe para com ele, uma tolice vaidosa que repeti muitas vezes em outras ocasiões e que ainda repito de tempos em tempos quando falho em alguma coisa por minha própria negligência.”

Influenciou essa postura também o fato do nome de Virchow desde muito cedo estar mencionado à Groddeck de uma forma muito negativa, seja pela posição que ele assume, contrária à nomeação de Schweninger como médico do Charité [Hospital da Universidade de Berlim], como também pelas opiniões contrárias à Virchow emitidas pelo seu pai, não só em relação aos seus métodos de cura como também por suas opiniões políticas.”

A imagem que tem do médico e da medicina foi influenciada pelo pai e pelas ideias românticas e vitalísticas. […] A cientifização da formação e a estandartização [sic – estandardização] do nível profissional foram introduzidos no início dos Oitocentos, mas se afirmaram só na segunda metade do século. Em 1861 o estudo da física foi inserido no curso de medicina em lugar da filosofia. O paradigma da ciência natural se sobrepõe ao filosófico. A linguagem do médico é separada daquela da filosofia. Isso é visível, não apenas no encontro entre o médico e o paciente: a pergunta do médico não é mais: ‘O que tens?’, mas sim ‘O que te faz mal?’. (…) O médico na tradição hipocrática era um tipo de adivinho que se aproximava do corpo à distância e o observava como uma trama, se afastando do visível e penetrando na profundidade do corpo. Muda a angulação. (…) Neste caso, Groddeck se encontra em dificuldade: como a maior parte dos estudantes de medicina daquele tempo[,] ele também chegou à universidade com uma formação humanística e que não era muito adaptada às necessidades da disciplina. Havia aprendido a interpretar, a abrir e a descrever, mas não a separar, a dividir e a fixar. O olhar anatômico, que coloca a verdade da doença no corpo morto, teve sobre ele um efeito repugnante. Ele duvida desta verdade que se manifesta somente na morte, no cadáver. Só com grande fadiga consegue assimilar o argumento da lesão e a seguir o programa. (MARTYNKEWICZ, 2005, p. 98, 99)”

5.4 SEGUNDA ETAPA DA FORMAÇÃO MÉDICA DE GRODDECK: SCHWENINGER

Ciência não é erudição, não é saber, mas aquilo que o saber cria; é o alicerce imprescindível sobre o qual se constroem saber, conhecimento e talento. E um homem de ciência é apenas aquele que lança tal alicerce ou, pelo menos, trabalha nesse alicerce. Quem compreende este sentido da palavra ciência não confunde o saber médico, a soma dos conhecimentos anatômicos, fisiológicos, diagnósticos ou terapêuticos, com ciência médica. Quando alguém é chamado um homem de ciência médica, isto significa: esse homem descobriu a essência do pensamento e do agir médico, estudou conscienciosamente a base e o terreno e, de acordo com esse terreno e conforme a finalidade do ser médico, a partir do seu espírito e pensamento traçou um plano de construção e lançou os fundamentos aos quais poderiam ater-se os mestres de obras, até que seja imaginado um plano novo, verdadeira ou aparentemente melhor. O essencial para o criador da ciência médica é, portanto, o conhecimento da finalidade do médico e o pensamento e o trabalho independentes para esta finalidade e, finalmente, o que é mais importante, o acerto desse trabalho (GRODDECK 1925, 1994, p. 139, 140).”

O nome dele não está associado a nenhuma descoberta científica significativa e dentro da história da medicina normalmente seu nome é ignorado ou pouco mencionado e isto se deve principalmente ao fato de Schweninger pouco ter produzido teoricamente; somente em 1906 publicou sua obra maior Der Arzt, livro que enfoca a questão da relação médico-paciente.”

Atualmente o nome de Schweninger parece totalmente desconhecido. As grandes enciclopédias francesas, inglesas ou americanas não o mencionam. Nós encontramos, na Der Grosse Brockhaus in Zwölf Banden (1980) três ou quatro linhas indicando, além da sua data de nascimento e do seu falecimento, sua qualidade de médico de Bismarck. Ao contrário, a grande Encyclopédie Française, do fim do século passado[,] consagrou em seu tomo 29 linhas a Schweninger: ‘Schweninger, Ernst: médico alemão contemporâneo, nascido em Freistadt (Baviera) em 15 de junho de 1850. Assistente de Buhl em Munique em 1870, torna-se professor titular em 1875. Ele conta com alguns favores especiais de Bismarck, e foi nomeado, graças a ele, professor da Universidade de Berlim em 1884, depois membro extraordinário do escritório de saúde, e diretor da clínica dermatológica no Hospital Charité. Em 1886, criou em Heidelberg um sanatório especial para a cura da obesidade’ […] Quanto aos historiadores da medicina, as diferentes obras consultadas ignoram totalmente o nome de Schweninger. (CHEMOUNI, 1984, p. 37, nota 1)”

[…] A apresentação de Schweninger, aqui no circo dos tagarelas, foi um verdadeiro desastre! Não compareci, é claro; em vez disso, presenteei-me com uma audição do nosso velho amigo Mark Twain, em pessoa, o que foi um deleite absoluto.” FRAUD, 1986, p. 300.

Sei que a máxima ‘Natura sanat, medicus curat’ não foi descoberta por Schweninger. Mas Schweninger foi o primeiro e, durante dezenas de anos, o único médico moderno a reconhecê-la como ponto de partida, barreira e objetivo da ciência médica.” GRODDECK, Nasamecu

(*) “De fato, esta sentença é muito antiga, formulada inicialmente em latim arcaico conforme podemos ler no Dicionário de Sentenças Latinas e Gregas. O seu autor, Renzo Tosi, ao comentar a sentença ‘Vis medicatrix naturae’ (‘A força saneadora da natureza’), que de acordo com ele significa que a cura só é possível pela capacidade natural de reação, escreve: […] Este conceito, porém, já se encontra em Hipócrates (por exemplo, De fractoris 1,2); ainda goza de certa fama a medieval Medicus curat, natura sanat (TOSI, 2000, p. 353).”

O relato de Groddeck sobre o tratamento de Bismarck é parcial [no sentido de pouco informativo, não de tendencioso] e isto se deve, em parte, a esta observação sobre a postura e a discrição de Schweninger:

(Schweninger) me contou alguma coisa sobre o caso Bismarck; uma coisa dessa era muito rara, pois Schweninger era a própria discrição. Nos 25 anos em que fui seu aluno predileto, não falou quase nada de suas atividades junto a Bismarck, nunca disse também a mínima coisa que estivesse fora do puramente médico. (GRODDECK 1929, 1994, p. 340)”

através da observação incansável dos hábitos de vida do Príncipe, Schweninger havia curado Bismarck de uma grave e perigosa doença, depois que cem médicos o tentaram inutilmente. O próprio Bismarck disse a sua maneira (…) como Schweninger o conseguiu: ‘Até agora eu tratei de todos os médicos; o senhor é o primeiro que trata de mim’. (GRODDECK 1929, 1994, p. 333)”

Meu príncipe – Schweninger nunca se referia a Bismarck a não ser com esta denominação – estava acostumado a grandes refeições e grande quantidade de líquidos, e como achavam que ele tinha câncer quando o conheci, reforçam a sua tendência a comer e beber muito, em vez de reprimi-la. O segredo do meu sucesso foi que lhe dei para comer somente arenques salgados¹ e contra a sede apenas a água que ele mesmo pegava do poço. Sempre se afirmou que eu o fizera emagrecer. Não é nada disso; ao contrário, com muito esforço conseguiu aumentar os seus cem quilos. Portanto, apesar de toda a comida intensa, ele emagreceu e, apesar de toda a fome, aumentou de peso. Não importa o que o homem come, mas como utiliza o que come. Desde então, os arenques de Bismarck viraram moda. Mas o que o Príncipe recebeu para comer não eram aqueles arenques artísticos já preparados, mas simples arenques salgados.”

¹ “Gênero de peixes da família dos clupeídeos, de dorso azul-esverdeado e ventre prateado, de hábitos migratórios, comum no canal da Mancha e nos mares setentrionais; reúnem-se em cardumes para pôr os ovos, sendo pesca muito procurada e apreciada. (Compr.: de 20 a 30 cm.).”

Mas antes de seguir adiante, um comentário é necessário a respeito da biografia escrita pelos Grossman. É o primeiro relato biográfico de Groddeck – a sua edição original em inglês é de 1965 e posteriormente traduzido em diversos idiomas – e, apesar da variedade e da riqueza das informações contidas, não apresenta, pelo menos nas duas edições consultadas,(*) a mínima referência bibliográfica, não citando as suas fontes; o que se (sic) faz com que qualquer citação ou referência a esta obra seja feita sob o signo da cautela.

(*) El Psicoanalista Profano, Fondo de Cultura Económica, México (1967); L’analyste sauvage, Press Universitaires de France, Paris (1978).” Por que mudar o título de um livro na sua nova edição é um mistério. A não ser que realmente tenham verificado que chamar um bom médico de pseudanalista é um grande insulto! Ou se trata tão-somente de uma localização (a França, terra da pseudanálise, oculta a parte psico- da alcunha! Além disso, profano dá a idéia de seita que tem essa… seita; o que é diminuído quando se fala simplesmente selvagem…).

Faz com que o chanceler se levante às oito da manhã para fazer exercícios com pesos; durante todo o dia o paciente não deve comer senão arenques. Quando Bismarck exclama: ‘Você deve estar completamente louco’, Schweninger responde: ‘Muito bem, Alteza, será melhor que chame a um veterinário.’ Dito isto Schweninger se vai. Este procedimento estabelece seu poder sobre Bismarck, que se submete. Agora o doutor leva 15 dias sem abandonar a casa de seu paciente. Os alimentos e a bebida, a hora de levantar-se e de deitar-se, o trabalho e o sono, são meticulosamente vigiados. Ao final deste período houve uma melhora notável. Schweninger abandona a casa pela primeira vez. Neste momento, o paciente ordena ‘uma porção tripla de creme’. Isto provoca uma violenta gastralgia, seguida de icterícia e partida para Friedrischsruh. Ali o doutor volta a vigiá-lo de perto e depois em Kissingen e Gastein não o deixa só um dia. [sic – um só dia] Depois de 2 meses, o paciente está praticamente curado e reconhece que pode voltar, rejuvenescido[,] à fadiga do trabalho. Dominando em vez de deixar-se dominar, Schweninger salva a vida de Bismarck.”

Médicos excelentes haviam fracassado com Bismarck porque se deixavam intimidar pelo paciente. Schweninger não se deixava intimidar por nada. Porém nas escolas de medicina não se fabricam autocratas: era difícil para ele ensinar seu método.” GROSSMAN & GROSSMAN, 1967

Depois de seu restabelecimento, Bismarck expressou o desejo de que Schweninger permanecesse em Berlim e primeiro tentou amistosamente conseguir para seu médico preferido um cargo de professor e uma clínica através de decisão da faculdade de medicina. Teria sido muito fácil, pois Schweninger era hábil em todas as ciências, se Bismarck não tivesse tantos inimigos entre os eruditos da universidade, sobretudo se Virchow não estivesse lá. […] Mas a sua perícia ia no máximo a odiar Bismarck e a opor-se a ele sempre que possível, [frase muito mal-traduzida] e já que o Príncipe nunca soube tratar com afabilidade os seus adversários querelantes, o erudito se enchera de tanta amargura que se aproveitou com prazer da oportunidade de frustrar o desejo ardente de Bismarck. Ele obstou, juntamente com um grande número de presunçosos moralistas, uma decisão da faculdade em favor de Schweninger. […] Talvez Bismarck tivesse encontrado outro meio para conseguir a posição para o genial salvador de sua vida; pois, na verdade, Schweninger estaria muito mal na camarilha administrativa das universidades alemães da época. Mas era teimoso, e o que não podia obter por bem, agora forçava por mal. Por um ato autoritário, Schweninger recebeu o cargo de professor de doenças dermatológicas e uma clínica para doentes de pele. (GRODDECK 1929, 1994, p. 333 e 334)”

Ele promove uma medicina da expectativa. O médico não deve intervir no processo de cura natural, mas só sustentar e reforçar as defesas. Em cada doença existe um determinismo que ao se retirar a ação médica (sic) pode levar à morte ou à cura […] Ele rejeita a procura da causa oculta de uma doença; ao centro de sua teoria (sic) não busca aquilo que produz a doença, mas aquilo que o libera dela. Não se interessa como respira uma pessoa e que coisa significa respirar bem ou normalmente, a ele interessa como ajudar e aliviar o sofrimento daquele que respira mal. Reprovará a medicina científica de estudar a gênese da doença (sic) abstraindo-a do processo vital. (MARTYNKEWICZ, 2005, p. 101, 102)”

5.4 TESE DE DOUTORADO

Em 1889, Schweninger oferece como sugestão a Groddeck uma pesquisa com um novo remédio para as doenças da pele, a Hidroxilamina,¹ e que serviria como tema para seu trabalho de doutoramento. A sugestão de Schweninger tem uma conotação no mínimo curiosa, principalmente em épocas de pesquisas e êxitos científicos:

Schweninger, porém[,] não esperava de seu formando resultados necessariamente positivos, mas uma documentação detalhada da completa ineficácia do remédio. Groddeck deve (sic – devia) escrever uma crítica destrutiva sobre o remédio e enfrenta com prazer esta tarefa. […] Tanto o orientador quanto o formando, com os resultados do trabalho[,] visavam um confronto com alguma autoridade importante do grupo de médicos que estavam sugerindo fartamente este remédio. A pesquisa sobre a hidroxilamina deve ser a ocasião para criticar em geral a produção e difusão desregrada de remédios. (MARTYNKEWICZ, 2005, p. 105)” Qualquer semelhança com o CFM em governos bolsonaristas é mera coincidência.

¹ “Base NH2OH, que se forma na redução dos nitratos.”

Executei escrupulosamente, com grande afinco, todos os experimentos, recorrendo ao pincelamento, aplicação do ungüento e sabão, e aqui percebia zero esperança de obter resultados positivos. Quando percebi que não havia me enganado me propus a estender o protocolo, que de um lado reportava um conjunto escarnecedor dos insucessos, e de outro, ao contrário, oferecia uma visão harmônica bem-exitosa da teoria de Schweninger. (Texto de Groddeck citado em: MARTYNKEWICZ, 2005, p. 105)”

Os colegas que introduziram o novo remédio acreditam poder contribuir deste modo com o progresso da nossa arte? Talvez desta maneira estejam acrescentando um nome à farmacopéia, para o horror de todos os candidatos ao exame de habilitação, mas não fornecem alguma vantagem [sic – vantagem alguma!] à medicina.”

5.6 MORTE DA MÃE DE GRODDECK E O SEU CASAMENTO COM ELSE

Neste período de trabalho como oficial médico – que vai de 28 de junho de 1891 até março de 1897 – além das obras escritas, dois fatos pessoais relevantes e suas implicações posteriores marcam esta etapa da vida de Groddeck. Antes de mencionar os acontecimentos, é importante salientar que esse período da sua vida militar não é contínuo, tendo uma interrupção de um ano, a partir de maio de 96, por conta de uma dispensa, quando Groddeck volta a trabalhar como assistente de Schweninger em sua clínica em Berlim. Uma outra observação é que neste tempo de vida militar, que se inicia no Regimento de Infantaria Real em Brandenburgo, Groddeck é transferido 3 vezes: inicialmente para Ückermunde (1892) onde vai supervisionar a higiene das embarcações fluviais; posteriormente volta para Brandenburgo[;] e por último é transferido para a escola de formação de Oficiais em Weilburg (1894), onde permanece até obter a dispensa, por motivos de saúde, em março de 1897.”

Ainda relativamente jovem, eu obtivera um posto independente na Escola de Suboficiais de Weilburg, o que eu podia e devia considerar uma distinção. Tinha pouca coisa a fazer, esse pouco eu podia organizar como quisesse, era adulado por jovens e velhos, por patentes altas e baixas, enfim, tudo poderia ter sido bom, se não fossem os relatórios. Na minha guarnição anterior, como se eu fosse totalmente incapaz de desempenhar essa tarefa, deixei-a a cargo do escriturário do hospital militar. Mas, em Weilburg, o titular desse posto era mais bobo do que eu. Não consegui uma única vez fazer um relatório sem erros, sempre recebia de volta com o amável pedido para corrigi-los. (Meu superior) me transferiu, por algumas semanas, para Frankfurt e encarregou um antigo médico do quartel de me introduzir nos segredos dos relatórios militares. O plano falhou. […] E continua assim até hoje, e se muitas vezes pensei na possibilidade de desistir do meu sanatório, a razão principal para isso é a obrigação de preencher todo ano um questionário simples – em três cópias. O estranho é que, só no ano passado, descobri que o questionário pode ser preenchido por qualquer outra pessoa que não eu. Tenho grande prazer na leitura de estatísticas; só que não acredito nelas. (GRODDECK 1929, 1994, p. 291, 292)” HHAAHAHAHA!

Depois da morte do meu pai, minha mãe tentou novamente criar para si mesma um campo de atividade: empregou uma pequena herança que recebera de uma amiga de juventude – eram apenas algumas centenas de marcos – para fundar um lar para moças; para isso, mudou-se para Ilmenau. […] Passei com ela em Ilmenau algumas semanas e lembro-me desse tempo com uma especial sensação de prazer. O natural nas relações entre mim e minha mãe voltara a ser como no tempo da infância, só que era diferente o plano em que este convívio de compreensão [???] era vivido no falar e no calar; assim continuou até a morte de minha mãe, éramos adultos dados um ao outro com caminhos próprios. (GRODDECK 1929, 1994, p. 377)”

Quando a mãe morre de infarto em 20 de setembro de 1892, Groddeck tem um forte sentimento de culpa. Exteriormente[,] isto poderia estar relacionado sobretudo à sua chegada atrasada ao funeral da mãe e ao fato de não ter conseguido vê-la mais consciente. A sua última visita apressada, as cartas escritas de forma irregular e com um longo intervalo, tudo isso serve para agravar seu ânimo. (GRODDECK in MARTYNKEWICZ, 2005, p. 117)”

Aposto diariamente sempre mais na massagem e este é o campo no qual gostaria de te ver. Talvez tenha muito sucesso porque faço tudo sozinho. E tu não tens vontade? Faz poucos anos que a massagem tem uma grande relevância na cura das doenças femininas. Uma mulher que seja capaz de fazê-la poderá contar com um ganho de muitos milhares de marcos. Deste modo serás completamente autônoma. Com cuidado posso te ensinar coisas que nenhum outro pode.” Trecho de uma carta de Georg Groddeck a Lina Groddeck, sua irmã (17 de novembro de 1892).

A mudança mais importante deste período está sem dúvida ligada ao encontro com Else von der Goltz. Groddeck a conheceu como paciente. Era a mulher do conselheiro regional Friedrich von der Goltz, 14 anos mais velho do que ela. Quando se casaram a mulher não havia ainda completado 19 anos. Do casamento nasceram 2 crianças: Ursula (11 de setembro de 1889) e Joachim (19 de março de 1892). No período no qual Else encontr[ou] Groddeck, o casamento estava em crise e a separação é [sic – foi] só uma questão de tempo. Else von der Goltz, que no diário Groddeck chama de Elfie, é de uma beleza extraordinária, é culta e possui um grande talento musical. Antes do casamento com Friedrich Von der Goltz se apresentava como pianista e cantora e os seus dotes provocavam a admiração geral.”

No dia 28 de março de 1896, Else se divorcia e em 20 de setembro do mesmo ano Else e Groddeck se casam em Berlin. Após obter a dispensa definitiva do exército e tendo aceitado o convite de Schweninger para que assumisse uma clínica que ele dirigia em Baden-Baden,(*) Groddeck, a esposa, seus enteados e sua irmã Lina mudam-se para esta cidade termal em 18 de março de 1897.

(*) Era uma clínica, o Lichtenfelder-Kreiskrankenhaus, famosa por seu atendimento e por ter bons resultados no tratamento e cura de emagrecimento.”

No final de 1897, Lina aluga a vila Monbijou, situada no número 16 da Werderstrasse e, em fevereiro de 1898, abrem um novo espaço para atendimento. Este espaço sofrerá uma nova alteração de endereço quando, em 1899, o comerciante Gustav Bazoche oferece a Lina uma casa situada na Werderstrasse 14, a pensão Marienhöhe. A irmã de Groddeck se sente encorajada a realizar a compra, mesmo não tendo os recursos necessários, tanto pela sensação de ser independente quanto pela esperança de enriquecer tendo sua própria casa. Os recursos são obtidos a partir de um empréstimo com a paciente Margarethe Hermann (50 mil marcos) e de um banco em Zurique (70 mil). Em 31 de julho, Lina assina o contrato de compra e venda e após algumas reformas, em 6 de março de 1900, a clínica Marienhöhe abre suas portas.”

5.7 ALGUNS ESCRITOS TEÓRICOS

A medicina não está à disposição do doente. O doente é que está à disposição da medicina. O trabalho segue a onda de um mal-estar geral que se percebe no século XIX no confronto do progresso científico e se utiliza de uma linguagem formal e polêmica.”

Kunst und Wissenschaft in der Medizin representa o início programático e indica a direção: em nome da totalidade, da originalidade e da naturalidade a medicina deve novamente ocupar-se do texto da vida e com isso explicar e compreender os sintomas da doença.”

Enquanto Virchow pensava poder controlar algumas doenças com uma melhora das condições de vida, das condições de higiene, da cultura e da educação, Groddeck é muito mais pessimista […] Aquilo que faz adoecer o homem depende no fundo da disposição pessoal e do caso singular. (…) No princípio da personalização emerge o ceticismo contra os métodos de cura que tendem a generalizar e a esquematizar. Na escola de Schweninger a personalização é sustentada com particular ênfase e se mescla em igual quantidade contra a medicina científica e contra a social.” Infelizmente Reich regrediu muito neste último aspecto.

Somente no trabalho sobre constipação, publicado em 1896, fala pela primeira [vez] de certo influxo do fator psíquico. (MARTYNKEWICZ, 2005, p. 115)”

A respeito de toda ‘cura’ é necessário criar uma unidade, a ‘cura personalizada’. […] É a única que tem validade geral. Essa na verdade supõe uma acurada apreciação de todos os pontos vitais acessíveis, exteriores e interiores.” GG, Kur und Kuren

O homem, segundo Groddeck, não vive daquilo que ingere, mas daquilo que digere e como digere, vive daquilo que utiliza e consome e que o seu corpo assimila. (…) No fundo, diz Groddeck, não é absolutamente importante aquilo que o homem come, mas sim com que intervalo e em qual porção assume o alimento.”

Então, segundo Martynkewicz, no texto Krankendiät Groddeck expõe algumas críticas ao modelo proposto por Schweninger, e seu escrito por sua vez é criticado por Schweninger que o considera destituído de conotações positivas. Este descompasso revela um primeiro sinal de que Groddeck começa a propor seu próprio modelo”

Ele, em cada um dos escritos[,] é extremista e dirige ataques selvagens contra a ciência e a fé na religião. Schweninger, porém não deseja uma revolução, agora pelo menos não mais, e deseja um espírito mais conciliador. No período em que esteve junto de Bismarck, havia conduzido uma batalha particular contra a medicina universitária […] Nos anos noventa a medicina científica está[va] em crise, em parte por motivos internos, e com isso perdeu (sic – perdera) um pouco do seu prestígio. As idéias de Schweninger na universidade são agora muitas vezes consideradas extravagantes, mas a sua cura e terapia se tornaram reconhecidas, sobretudo no ambiente das pessoas ricas e nobres. […] Que Schweninger consegue (sic – conseguisse) pacientes sempre mais industriais e menos no ambiente da política é [era] um fato sintomático e corresponde [correspondia] à mudança súbita da sociedade no final do século XIX. A Alemanha se transformou em uma das nações mais industrializadas, sobretudo no setor do carvão e do ferro.”

Um certo desencantamento de Groddeck com estas novas atitudes de Schweninger, que de certa maneira perdeu o espírito crítico e combativo, faz com que escreva em seu diário: ‘Schweninger está cansado e facilmente influenciável’.”

Duas são as possibilidades concretas: entrar em um ambulatório como assistente, para que um dia possa tornar-se independente, ou então, como o aconselha seu irmão Carl, afirmar-se como oficial médico em Weilburg e, talvez, esperar sem demora fazer carreira militar.

Mas a solução oferecida pela vida e pelas circunstâncias foi uma solução intermediária: ao obter uma dispensa da atividade militar em março de 1896, Groddeck vai trabalhar como médico-assistente da clínica de Schweninger em Berlim.”

5.8 MÉTODO DE TRATAMENTO MINISTRADO POR GR.

A massagem, refere-se Cohn, é aplicada três vezes ao dia pelo médico em pessoa, com ‘um método muito particular’ […] antes do café da manhã, antes do almoço e antes do jantar, cada vez durante um quarto de hora. O paciente fica deitado sob [SOB?!?] um divã, com as coxas ligeiramente levantadas contra o busto e os joelhos juntos, para forçar os músculos do abdômen, enquanto segura a cabeça com as mãos. Cohn subdivide o procedimento da massagem em três fases: na primeira o médico ‘dá dois golpes’ com punho fechado na região da fossa epigástrica, inicialmente levemente, depois pressionando sempre mais, até afundar o máximo possível o punho; tudo isto enquanto o paciente deve procurar respirar profundamente. No primeiro dia não é possível fazer mais do que cinco vezes, porque o movimento do diafragma, sob esta pressão[,] é muito cansativo. Segue depois a fase chamada por Cohn de ‘beliscar’: o médico prende com as mãos aquele estrato do abdômen, com a máxima extensão e na horizontal, apertando depois o ‘pneu’ com tal força que sob a pele se formam manchas marrons e azuis. Durante esta operação o doente chora e se lamenta: é a parte mais dolorosa de todo o tratamento. Por fim, diz Cohn, ‘o médico salta com todo seu peso sob o abdômen do paciente, de maneira tal que consegue afundar o joelho em profundidade na fossa epigástrica. O médico fica de joelho sob[re] o doente até que este faça, no início cinco, sete, depois dez respirações profundas, até chegar a trinta. […] O Doutor Groddeck é particularmente hábil e preciso neste tipo de massagem’.

Como segundo componente do tratamento vem descrito o banho quente. Não se trata aqui de banho integral, mas de banho de partes específicas do corpo. No primeiro dia, pela manhã, depois da massagem, vem prescrito o banho quente dos braços; no segundo o banho quente dos pés[;] e no terceiro o banho quente das nádegas, e assim continua cada dia nesta ordem. Schweninger havia construído vasos específicos para os braços e para os pés. Os vasos para os braços são grandes vasos de lata, colocados numa mesa, possuem uma tampa com 2 furos e são cheios com água a 36o Réamur (NB. Nesta escala térmica a temperatura de ebulição é de 80). Na parte superior existe um bocal de afluxo e ao lado um tubo ligado a uma torneira, esta à entrada de um balde grande. O doente coloca na bacia o braço até o ombro, deixando o antebraço e a mão sob a cinta esticada no interior do vaso. O braço permanece 20 minutos no banho, enquanto é colocada continuamente nova água quente, até quando a temperatura atinge lentamente os 40o Réamur. […] O vaso para os pés se distingue dos baldes pelo fato de serem em forma de bota, de modo que toda a base do pé possa pousar comodamente, enquanto a perna permanece em ângulo reto. […] No terceiro dia era realizado o banho das nádegas, à mesma temperatura.

O terceiro componente da cura de Schweninger é a dieta. Antes de falar das iguarias, Cohn relata como a massa era servida em porções pequenas e em louças pequenas. Os copos são aqueles de brinquedo que contém menos de 50 gramas de água. Mesmo os pratos são de boneca, que podem conter no máximo uma fatia de carne. A faca e o garfo são também muito pequenos. Em tudo isto há uma ação sugestiva benéfica: imagina haver bebido e comido muito quando na realidade não é tanto quanto recebeu. Além dessa forma exterior, segundo Cohn, se cuida, sobretudo[, d]o ritmo de fornecimento da massa. Com grande pontualidade, [a] cada três horas são servidas (sic – É SERVIDA) uma nova alimentação, o café da manhã às sete e meia, a segunda refeição em torno das dez e meia, a uma e meia o almoço, às quatro e meia o lanche e o jantar às sete e meia.

Com o passar do tempo, Groddeck modifica e integra a cura. A massagem e o banho quente permanecem substancialmente iguais; a importância da dieta é, no entanto, redimensionada e no final é[,] sem dúvida[,] considerada um procedimento danoso. A cura[,] no momento[,] é de tipo puramente fisioterápico, deve somente reforçar as resistências do corpo e favorecer o processo natural de cura. [REDUNDANTE] Um papel central, sobretudo para a massagem e para o banho quente, é atribuído à dor[,] tratada como [sic – com] um escopo terapêutico, que sobre o homem deverá ter valor educativo.”

5.9 TEXTOS MÉDICOS E ESCRITOS LITERÁRIOS

Ein Frauenproblem (1903) é o primeiro texto literário, não-médico de Groddeck: ‘à minha mulher, pelo Natal’ é a dedicatória[;] e como escreve Martynkewicz: ‘no caso de Groddeck[,] a dedicatória e o conteúdo do livro são extremamente correlatos. Aquilo que ele diz neste livro gira sempre em torno da mulher e […] este presente de Natal é uma carta e contemporaneamente um manifesto da misoginia. (MARTYNKEWICZ, 2005, p. 164).

Sobre a forma de apresentação dos temas deste texto e seu impacto no público, Groddeck escreve ao seu irmão Carl (24 de fevereiro de 1905): O Problema da Mulher foi mal entendido por todos que o leram. Sobre isso, eu só censuro a mim mesmo. Não se deve escrever por enigmas.’” // Outra tradução, se não conseguir encontrar no original nem em português: Un Problème de Femme.

O homem desaparecerá, mas a mulher é eterna”

tornar-se criança, condição do tornar-se ser humano”

ÚLTIMA SENTENÇA DO LIVRO: “O sol brilha unicamente para ela, as árvores carregam frutos unicamente para ela, a mãe vive unicamente para ela. A criança cria seu próprio mundo, para ser livre e liberar. […] Por eles, tu te tornarás livre, por eles, tu te tornarás uma criança, e mais ainda: um ser humano. […] Saudemos ao ser humano, à criança realizada em um mundo realizado. (GRODDECK 1903, 1992, p.117)”

Da mesma maneira que Winnicott e que a Escola Psicanalítica Húngara, mas de forma totalmente diferente, [?!] ele estabeleceu uma psicanálise centrada exclusivamente na mãe, [isso cheira mal] sobre o espaço que ela instaura durante a vida de cada ser humano” Chemouni

Não era mais possível remover Schweninger. Ele conhece o trecho que escrevi sobre ele, e eu não gostaria de magoá-lo, ele que sempre foi amável comigo, mudando agora alguma coisa.” Carta ao irmão

Em 30 de março, sai o romance em 2 volumes Ein Kind der Erde [Uma Criança da Terra] e ‘em abril a editora envia a Groddeck uma breve crítica, que poderia ser considerada como positiva. […] Em julho a editora comunica que o livro não está vendendo bem’.”

O contínuo insucesso da minha atividade literária infundiu em mim uma aversão contra este tipo de ocupação, e, como, de quebra, perdi há algum tempo a minha caneta costumeira, considerei isso um mau agouro. Talvez ela me tenha sido furtada por algum deus benevolente. Para arquivar, portanto, as atas desse período já encerrado, informo-lhe que a minha novela foi rejeitada em toda parte. Eu a havia escrito inicialmente por um prêmio de 5 mil marcos, que o Daheim tinha proposto pela melhor novela. Evidentemente, lá ela não foi lida, pelo menos é o que deduzo do estado inato do manuscrito, e teve a mesma sorte em diferentes mesas de redação. (GRODDECK 1908, 1994, p. 89-90)”

De resto, só posso repetir: essa novela é a melhor coisa que você escreveu. Não quero ir tão longe e afirmar que não há erros; na primeira versão, o final está fraco, e temo que isso não melhorou muito desde então. Mas encontrei aqui em você, pela primeira vez, um pedaço de vida, em lugar de invenções penosamente criadas.” O irmão Carl Groddeck em carta de consolo (?) ao médico diletante literato!

Em 1906, Schweninger publica Der Arzt, livro que é uma síntese de suas idéias e que pode ser visto como um guia de sua prática como médico, ou[,] ainda, como seu testamento teórico. A obra foi editada numa coleção dedicada a publicar estudos sócio-psicológicos que era dirigida por Martin Buber.”

Decididamente, nisto Schweninger tem mais sorte. Do seu O Médico foram impressos 14 mil exemplares e está esgotado. Além disso, recebeu 700 marcos como honorários pela primeira edição. O restante, o editor meteu no bolso. O mais estranho para mim é que a crítica elogia quase unanimemente O Médico. Não invejo o reconhecimento tardio do meu mestre tão difamado pelo bando científico; gostaria apenas que ele também fosse apreciado em outros campos, estritamente científicos, pelos quais tanto fez. (GRODDECK 1907, 1994, p. 87)“

A ideia central da filosofia de Schweninger é que o médico não é um cientista mas um artista. Com esclarecimentos diferentes – histórico, sociológico, filosófico, etc. – ele tenta dizer que a prática médica é uma arte. A arte é eterna. […] Em certo sentido, a arte não constitui um saber mas resulta de uma atividade inata. Ela se eleva contra a idéia, ainda prevalente, que a atividade do médico consiste essencialmente em aplicar os conhecimentos científicos. A ciência é de pouco auxílio na relação médico-doente. […] o fato de cuidar é idêntico através dos tempos. […] Hipócrates, pela sua arte de cuidar, pode ser considerado hoje em dia como médico. […] Sua arte de cuidar não é inferior à dos médicos formados na Universidade. Aquilo que o médico é capaz de aportar a seu paciente é idêntico ao longo do tempo, somente a forma muda. Não se pode imaginar melhores relações médico-paciente só porque vivemos no século XX, as condições humanas serão sempre as mesmas. […] Somente os meios colocados à disposição do médico se modificam, a qualidade de seu trabalho, essencialmente relacional, é constante. A arte do médico resulta de um saber inato: ele é inerente ao homem. A arte não é mais do que a forma visível deste saber. A riqueza técnico-científica não poderá mudá-la. […] Arte e ciência se opõe[m] como o natural ao cultural. Só a experiência serve como denominador comum.” Jacquy Chemouni

Schweninger critica a formação do médico, refutando que um diploma possa sancionar a profissão médica. […] é médico a partir da sua capacidade de estabelecer com o outro uma relação que seja a mais pessoal e íntima possível. J.C.

Natura sanat, medicus curat, isto quer dizer que a natureza [é que] cura e o médico [só] cuida.”

Mas quem foi a Senhorita G.? Será que ela existiu de fato ou ela resume vários casos tratados por Groddeck no período anterior à Primeira Guerra Mundial? Como vimos acima, este personagem só é mencionado por Groddeck algum tempo depois de ter ocorrido o processo de tratamento. A resposta a estas perguntas será dada por W. Martynkewicz:

O caso da Senhorita G. serve claramente a Groddeck para construir um novo início […] No estado atual do conhecimento do legado não se pode ainda afirmar com certeza se esta análise havia de fato ocorrido e se existia uma figura de referência real para a Senhorita G. No que diz respeito a esta última questão, venho colocando ênfase, e em parte também o próprio Groddeck, em diversos pacientes. (…) Margareth Fellinger se torna a ‘cara Grete’ (que poderia ser desdobrada na abreviação ‘G.’). Também o quadro de sintomas apresenta alguma correspondência. Mas nas cartas a Margareth Fellinger não fica claro o tipo de tratamento psicanalítico; a psicanálise não entra em jogo nem ao menos como terminologia. (MARTYNKEWICZ, 2005, p. 197)”

Que Groddeck no período que precede a Primeira Guerra Mundial havia efetuado um movimento em direção à psicanálise é, sobretudo, uma auto-mistificação na qual os seus seguidores, no entanto, prontamente acreditaram.”

Natureza! Estamos cercados e envolvidos por ela – impotentes para deixá-la e impotentes para adentrá-la mais profundamente. Sem aviso, e sem ser chamada, ela nos varre para longe nas voltas da sua dança e continua a dançar até que caiamos exaustos dos seus braços. Ela sempre gera formas novas: o que existia, nunca tinha existido antes, o que era, nunca voltará. Tudo é novo, e, no entanto, velho para sempre. […] Todos os esforços dela parecem inclinados à individualidade, e ela não se preocupa com indivíduos. Ela constrói sempre, destrói sempre, e sua área de trabalho está além do nosso alcance. […] A sua coroa é o amor. Somente através do amor nós chegamos a ela. Ela abre um abismo entre todos os seres, e um quer devorar o outro. Ela separa todos para depois juntá-los, com uns poucos goles da sua taça de amor. Ela torna boa uma vida cheia de labuta. Ela é tudo. Ela se recompensa e se pune, deleita e atormenta a si mesma. Ela é rude e gentil, agradável e terrível, impotente e toda poderosa [sic- todo-poderosa], tudo está eternamente presente nela. Ela nada sabe de passado e futuro. O presente é eternidade para ela.”

Goethe, A Natureza

(…)

5.12 O ‘ISSO’

Não existe nenhum eu, é uma mentira, uma desfiguração quando se diz: eu penso, eu vivo. Dever-se-ia dizer: isso pensa, isso vive. ‘Isso’ quer dizer o grande mistério do mundo. Não existe um eu. […] Tudo flui. Com toda a certeza não existe um eu. É um erro da linguagem e lamentavelmente um erro fatal. Porque ninguém é capaz de libertar-se dessa palavra ‘eu’.”

5.13 CÍRCULOS DE DISCUSSÃO POPULAR E A COOPERATIVA DE CONSUMO

O tradutor de Nasamecu para o francês, P.S. Vilain, faz o seguinte comentário:

Esta obra não tem nada de um tratado científico: ela é o resultado de um ciclo de conversas populares, que Groddeck […] realizou diante de um público modesto, em benefício da associação cooperativa, [para venda de alimentos, inflacionados no verão, a custo de produção] quando foi um animador despretensioso. O autor se contentou em revê-las brevemente com o propósito de publicá-las sob a forma de um livro. Assim colocado, o leitor não se surpreenderá de reencontrar em diferentes capítulos, de forma repetitiva, os temas favoritos deste clínico geral. […] A definição do homem doente, o papel e o poder do médico, a admiração diante do milagre do organismo humano; ele não se surpreenderá de encontrar, por exemplo, no capítulo que trata dos ossos, um desenvolvimento dos nervos da pele, ou, naquele que é dedicado aos músculos, as idéias de Groddeck acerca da informação sexual […] ele se esforça em ver o homem que sofre dentro do conjunto de suas condições de existência e considerar os elementos do corpo humano em suas interdependências (VILAIN in GRODDECK 1980, p. X)”

5.14. NASAMECU

O título do livro é uma fórmula abreviada, Natura sanat, Medicus curat, a mesma é a ordem inversa de uma sentença medieval: Medicus curat, Natura sanat.”

DICIONÁRIO LATIM!

Sanat: cura;

Sanativus: própria para a cura;

Sanator, -oris: o que cura.

Medicus: tratar de um enfermo, medicar, aplicar remédio.

Curat: aplicação, tratamento;

cura, curae: cuidado, diligência;

curate: com cuidado, com diligência;

Curator, Curatoris: o que tem cuidado.”

A sentença aparece três vezes ao longo do livro, sendo inclusive [su]a última frase (…) na primeira vez em que é mencionada, Groddeck explica exatamente qual é o seu significado: ‘É a natureza que cura e não mais o médico, que só cuida [presta atenção]’.”

Apesar de estar sempre procurando reconhecer e valorizar o diálogo entre o médico e a natureza, Groddeck privilegia a segunda parte da frase, ou seja, a posição e o valor do médico.”

com o Nasamecu nós estamos no coração dos ensinamentos e do pensamento de Schweninger, tudo o que é específico nesta obra […] nós o encontramos na obra de Schweninger e em particular na sua obra intitulada Der Arzt. (CHEMOUNI, 1984)”

é bem por isso, e em função da grande ignorância das pessoas, que eu escrevi este livro. É tempo de elas adquirirem algum conhecimento a fim de não mais se comportarem na vida como uma criança. O médico, sem mais razão, necessita de conhecimentos, mas ele estará mal-colocado se estes conhecimentos forem exclusivamente de ordem médica.”

A partir destas colocações, Groddeck justifica o seu modelo de trabalho, como clínico geral, não ambulatorial, mas privilegiando o internamento por um período de tempo, em um espaço terapêutico: ‘O sucesso que obtêm os hospitais, as estações termais, etc., se explica em grande parte pela mudança mais ou menos bruta e brusca de todas as condições de vida do paciente.’ (GRODDECK 1913, 1980, p. 8)” Isso se chama: férias.

O médico deve dominar seu paciente. […] O dom inato de dominar é mais indispensável que todo o resto e é seu dever desenvolver este dom. O médico deve dispor de uma personalidade, reunir em sua pessoa numerosas personalidades. […] Ele deve conhecer as inúmeras facetas das constituições possíveis do caráter humano.” Será que o vestibulando de hoje ainda consegue fazer isso depois de torrar o cérebro para entrar numa faculdade – provido do dom da cura ou não?

a tarefa do médico é outra: ele é chamado a dominar, a dirigir este mini-universo que se chama um ser humano, que se mete em seu caminho dizendo: ‘ajude-me caso eu esteja doente’”

Nestas citações sobre a natureza do médico é possível perceber que os 2 verbos preferidos por Groddeck para definir a ação do médico são: dominar e dirigir; e que a conjugação destes verbos não é algo que se aprende, é como um dom inato. Para Groddeck, a personalidade do médico é o principal elemento da relação médica, ocupando um papel preponderante sobre seus conhecimentos científicos e o método terapêutico escolhido. Outra característica é a ação do médico como arte. O exercício dessa arte faz com que o médico fique a serviço da natureza (vida) e não possa agir em oposição a ela.”

Groddeck recomenda: Cuide [sic – Cuida] da tua língua, atenção às conseqüências de tuas palavras! Essa sugestão se dirige principalmente ao que ele chama de: a mania dos diagnósticos. E à sua dúvida: em que o diagnóstico ajuda o paciente?”

Neste momento, os problemas sociais são ainda parte integrante da medicina de nossos dias.” Afasta-te do médico bolsonarista mais do que o diabo se afastaria da cruz, porque neste problema social ele é claramente o problema!

cada época é, assim, tanto saudável quanto não-saudável, da mesma maneira que cada ser humano é simultaneamente sadio e doente.” Temo que este aforismo não sobreviveria à análise de Groddeck se este ressuscitasse no séc. XXI!

o erro antigo que considera que a doença é um agente externo que agride o homem desde fora. […] é bom admitir que a doença não é jamais um elemento externo ao corpo, mas um processo da vida […] que o elemento decisivo para a evolução da vida no sentido da saúde ou da doença não é o bacilo, mas o próprio homem.” Antigo mas bem recente: data da invenção da microscopia. Hipócrates já tinha a mesma visão sistêmica da psicossomática. Não é o maldito vírus, mas o verme do vírus (o homem).

As tendências de cura estão incluídas na própria doença. Existem mesmo no câncer, mesmo na morte; a vida persegue a sua ação ordenadora, procura curar e trazer à saúde, criar, mesmo quando as condições são más, a melhor existência possível: ela comove a sensibilidade do doente.”

Quer estejamos doentes ou bem, portanto, a vida é uma aposta na ordem. Sem se cansar ela diz ao homem: ‘coloque ordem’ […] porque o caos está em você [sic – ti] mesmo, aqui está a doença que tem a missão de colocar a ordem no teu caos.” A ansiedade busca fundir o organismo humano tão previsível e estático perante o caos do capitalismo tardio num caos sui generis, numa – sem dúvida, de algum prisma possível – ordem convivível… Mas isso não podemos deixar, já vai além do propósito da vida… Seria preferível morrer em catalepsia e apatia a se adaptar a um mundo tão cruel. Diga, Groddeck, você teria se rebaixado a usar Prozac?

É doente, no meu significado, o indivíduo diminuído em seus desempenhos e que se credita como tal. Para mim, todos os outros são saudáveis, pouco me importa que a Faculdade os tenha declarado gravemente doentes.”

Qualquer um que se sinta doente é conveniente se considerar doente, mesmo que o exame não descubra nada de patológico sobre ele ou nele.”

A cada indivíduo correspondem critérios que permitem determinar ou não a existência de uma patologia. (CHEMOUNI, 1984, p. 34)”

Vale salientar que Groddeck não tinha uma teoria do psíquico, tanto em seus aspectos estruturais quanto dinâmicos. A sua noção de inconsciente era pensada dentro do espírito romântico como desconhecido, um aspecto oculto da natureza e do sujeito, material sem estrutura que se expressa principalmente na poesia, nos sonhos e na enfermidade mental. Como clínico geral, Groddeck, nesse primeiro momento, situa o inconsciente e faz seus comentários a respeito dele como o desconhecido das funções somáticas

…e, nessa ampliação é necessário que se desloque sua perspectiva do Romantismo para a Psicanálise conforme pensada por Freud.” O Fraudismo é o puro Romance (só falta o Amor, claro)… Para “se deslocar” do Romantismo das concepções simbólicas do inconsciente a uma verve mais pseudanalítica do pensamento, Groddeck não teve de dar um só passo!

Quem não estuda está condenado a repetir a História. Neste caso que nos cabe agora, quem não estuda está condenado a repetir erradamente que Fraud foi pioneiro em alguma coisa, e um escritor honesto. Alguns parágrafos ilegíveis…

Queremos a esperança da cura. Bem mais: no fundo, não esperamos, desde o primeiro momento, a ajuda, mas a certeza da cura. Não se sabe mais apreciar a sua [nossa] situação, perdeu-se [perdemos] a [nossa] confiança em si [nós]. Essas duas coisas espera-se do médico.” E isso era tudo o que a pseudanálise não podia dar. Mas a autora da tese de mestrado não sabia disso…

O médico, sem dúvida, existe para todos os que sofrem, e ele deve dar ao seu tratamento a forma mais simples possível, a fim de que todo mundo, ricos e pobres, possam (sic)¹ aproveitar; diante do médico todos os homens são iguais, ele age sem considerar a pessoa” Outro preceito NADA seguido pelos instintos semitas da fantástica arte de extirpar neuroses com a força dos fundos movimentados pelos cheques – que perdeu um pouco da parte ‘artística’ conforme as décadas foram corroendo seus métodos estelionatários…

¹ As traduções da autora também são péssimas. Deixei este trecho como lembrete, num erro de concordância primário; porém, foram muitas as instâncias em que tive de corrigir aspectos básicos como a pontuação e a sintaxe elementar, que a criatura (nunca traduzindo do alemão, o vernáculo de Groddeck, mas do italiano ou do francês!) transcrevia diretamente do idioma original, como se o português fosse acentuado como seus primos latinos, tivesse ritmo idêntico – no francês isso é particularmente bisonho, pois, sabe, os, franceses… amam, vírgulas, Paulos, Coelhos, e três… pontinhos!… e exclamações. Só à guisa de comparação vamos recitar o trecho acima conforme citado na nota de rodapé da tese, antes da versão da autora:

« le médecin, n’est ce pas, existe pour tous ceux qui souffrent, et il doit donner à sa thèrapeutique la forme la plus simple possible, afin que tout le monde, riches ou pauvres, puisse [curioso! o erro de concordância não existia aqui!] en profiter, devant le médecin, tout les hommes sont égaux, il agit san[s] considération de la personne. » Não houve o cuidado, como denota o [s], nem de copiar os trechos com 100% de fidelidade.

Antes da Psicanálise se estabelecer como modelo terapêutico hegemônico na Europa e na América, a hipnose e a sugestão eram os procedimentos terapêuticos dominantes. Foi Liébault quem estabeleceu a doutrina da sugestão terapêutica.” Verdades e mentiras mescladas numa frase mesquinha.

Os membros da família, mesmo quando estão de boa vontade e sobretudo em função das suas boas intenções, constituem um obstáculo ao tratamento. Todo mundo, desde a infância, gosta de brincar de médico, e quando um membro querido da família fica doente, desamparado, você o socorre dando conselhos a torto e a direito e, em seu zelo excessivo, acaba atrapalhando.”

EXCELENTE: “Supo[nha]mos que, a partir de agora, nós dispomos de todo o conhecimento que a humanidade acumulará nos milênios que virão; nós não seríamos capazes de curar um simples resfriado: nunca poderemos fazer mais do que tratar. Este mesmo tratamento, que é a nossa única tarefa, e privilégio só nosso, será sempre limitado pelo poder da própria vida. A vida tolera com rigor que tiremos uma articulação doente, por exemplo, do joelho, substituindo-a por outra; ma[i]s ainda, é possível pensar que ela nos permitirá um dia transplantar de um indivíduo a outro, a fim de substituir os órgãos deficientes, o[s] rins, os ovários ou os olhos saudáveis. Mas, sempre, ela [Mas ela sempre – aprender a traduzir, dona Maria Consuelo!] se reservará [a]o direito de fazer viver ou não esses órgãos, se eles serão recebidos ou não dentro da unidade do corpo humano.”¹

¹ Esta última frase, de novo, evidência cristalina dos péssimos dotes da tradutora de improviso. Eis minha versão: “Sempre, porém, é a vida quem se reservará ao direito de deixar que sobrevivam ou não estes órgãos, de recebê-los ou não na unidade do corpo humano.” O “dentro da” como tradução de dans é típico de um estudante de primeiro período de francês que nunca aprendeu o conceito-base de tradução como tradução do conteúdo global e não simples ‘termo a termo’ o que nunca existiu fora dos recônditos da subliteratura. E a subliteratura não devia estar presente em nenhuma pós-graduação; nem num modelo hiper-expansionista, tendente ao universalismo (o chinês, por exemplo).

Tive que corrigir a próxima tradução inteira, de tão capenga:

Oliveira e Silva: “Levavam, pelo contrário, mais profundamente inscrito no seu coração que nós não fazemos, esta verdade, essencial do exercício do médico: a saber que somente a vida tem o poder de curar, o fato mesmo de estar vivo, é o verdadeiro médico.”

Rafael Aguiar: Seus corações, ao contrário, traziam inscrita, mais profundamente do que nos nossos, esta verdade essencial do exercício do médico: que somente a vida tem o poder da cura; que a vida, o fato mesmo de se estar vivo, é o verdadeiro médico.

Mesmo se fosse uma noviça no francês, caso tivesse alguma noção de escrita (do próprio recurso lingüístico padrão, i.e., do português!) e um pouquinho de teoria da tradução incorporada, poderia disfarçar facilmente a falta de estilo. Mas é um estilo todo cru, cego, cheio de arestas. Se é que não é o puro suco do google translate! Depois querem que eu diga por que um homem de altas qualificações como eu não quer perder 2 anos de sua vida sendo avaliado por pares – e que pares! Olhem o que deixam entrar e, portanto, titular-se (porque ninguém reprova num mestrado a não ser por falta)! Alguém incapaz de inverter a ordem frasal na translação entre dois idiomas, porque não tem a sensibilidade DE LEITOR suficiente para notar que ao não fazê-lo o português fica severamente prejudicado! Alguém que disso não sabe não pode se meter a ensinar medicina ou psicologia. Seria confissão de charlatanismo.

Estraçalhar o estilo, retalhar seu autor favorito, remover dele toda sua poesia: é isso que você faria como “homenagem” num trabalho? Num trabalho que imortalizará seu nome, pelo menos por algumas gerações, num arquivo mofado de universidade, para consultas de olhos curiosos de uma ávida geração distante?! Sugiro destinos melhores! Mas só posso ficar na sugestão. Minha sugestão não tem poder hipnótico!

5.15 PRIMEIRA GUERRA MUNDIAL (?)

No dia 28 de junho, ao entrar na cidade em carro aberto, alguém jogou uma bomba contra ele. Ferdinand empurrou o artefato para perto de outro veículo. Sua sorte não durou muito. Após comparecer a uma recepção na prefeitura, o arquiduque foi visitar os feridos do atentado. O estudante bósnio Gavrilo Princip avançou em direção a seu carro e disparou 3 tiros, matando Franz Ferdinand e sua mulher, Sophie. Esse ato, que agitou as engrenagens de alianças nacionais, alimentadas por nacionalismo e temor, foi o estopim da Primeira Guerra.”

Viena exigiu que Belgrado censurasse publicações anti-austríacas e prendesse ativistas anti-monarquistas. A Sérvia rejeitou essas exigências, aceitou outras e pediu uma arbitragem internacional. As autoridades austríacas, decididas a subjugar os sérvios, recusaram a interferência externa.” The same dirty old game and tricks by the pigs, pigs, PIGS!…

Em um mês, Montenegro lutava ao lado dos sérvios, o Japão junto a sua aliada britânica e a Turquia em defesa dos germânicos.” Com essas alianças bizarras, difícil considerar a Segunda Guerra como segunda e não como parte orgânica da primeira e única guerra total da História (como Poderoso Chefão 2, nem é uma continuação, é o próprio filme original).

E o que acontece com Groddeck neste período inicial da guerra? Ele é convocado, não para atuar no front, mas para ser o diretor-médico do Hospital Militar da Cruz Vermelha em Badischer Hof.”

Para uma apresentação, causas, implicações e desdobramentos políticos e culturais da Primeira Guerra Mundial, ver: A Sagração da Primavera, Modris Eksteins. Rocco, Rio de Janeiro, 1991

Sendo fiel ao seu projeto de trabalho, Groddeck não consegue se adaptar às pressões do tempo, imposto [SIC – IMPOSTAS] pelas exigências próprias de uma guerra[; n]e[m] muito menos se adequar às características próprias de um hospital para militares feridos. Como consequência, acabou tendo problemas com o restante do corpo clínico.

Aqueles dois outros colegas do Badischer Hof assumiram uma posição completamente diversa e logo[,] em pouco tempo[,] renuncia[ra]m a colaborar naquele projeto de cura. A sua atividade está sendo [SIC – foi] considerada de modo crítico mesmo pelas autoridades médicas sanitárias. (MARTYNKEWICZ, 2005)”

Groddeck se irrita e manda¹ rapidamente uma carta de protesto à autoridade sanitária, na qual reivindica o ‘direito fundamental do médico’, que mesmo na guerra deve poder curar ‘em seu critério’ e não ser ‘influenciado por alguma ordem’. A autoridade, segundo ele, não teria direito de criticar de nenhum modo a sua ação médica ou de impor-lhe regras; como médico ele afirma não se submeter às leis da guerra. A autoridade militar não se deixa impressionar e intervém, depois de haver tomado uma outra posição, […] na metade de maio Groddeck é exonerado do cargo de diretor médico do Badischer Hof. […] O licenciamento representa uma degradação oficial e uma declaração de incompetência.” Groddeck se mostrou tão ético e íntegro que vou chamá-lo de ANTI-FREUD!

¹ Provavelmente a autora pensa que o passé literário francês é o presente do indicativo, daí tantas frases estranhas nesta linha.

Além destas questões ligadas à sua atividade como médico de um Hospital da Cruz Vermelha, 2 fatos pessoais ocorrem neste período: em setembro de 1914, morre o ‘último Groddeck’, seu irmão Hans; outro fato acontece neste período, mas que terá efeito e desdobramentos significativos pelo resto da vida de Groddeck: em maio de 15 chega ao sanatório uma viúva sueca, Emmy Martina von Voigt. Fica pouco tempo na clínica como paciente e, quando retorna em julho do mesmo ano, Groddeck a convida para ser sua colaborada e assistente; em suas memórias escreve: ‘Em 1915 conheci minha futura esposa. Isto me fez progredir rapidamente.’

E abruptamente (nessas aspas mesmo!) termina a tese. Bizarro. Capítulo fora do lugar este da 1ª guerra? Sim; mas a tese em si é fraca, então não é um erro grosseiro. Isto é, diante do quadro geral é até perdoável!

NOTAS

Para Ber[n]heim e a escola de Nancy, [a] terapia de sugestão consistia na deliberada manipulação do crédito, fé e expectativa sob a orientação da sugestão e auto-sugestão no tratamento de uma vasta gama de condições físicas e psicológicas.” Shamdasani

CONCLUSÃO

Se dermos um texto não identificado escrito por Groddeck para um estudante de medicina que esteja lendo sobre Humanização, este possivelmente acreditará se tratar de um texto contemporâneo, e não um texto escrito a mais de nove décadas.” Se aos pacientes se der tanta atenção quanto à penteada na gramática desta tese, estão bem fudidos e desumanizados! Se não tem tempo de revisar o próprio texto, saia da academia. Mas o orientador e a banca ainda conseguem ser mais malditos… Uma revisão de literatura tosca de nível de terceiro semestre de uma graduação de humanas (mesmo sendo uma especialização, aparenta generalidade total, quer em medicina, em psicologia, em história das idéias, quer em epistemologia…). Este é meu parecer honoris causa.

FRAU LOU: NIETZSCHE’S WAYWARD DISCIPLE: A HISTÓRIA DE UMA FALSIFICADORA INATA – Rudolph Binion, 1968.

FOREWORD (Walter Kaufmann)

Was Lou really that important?”

The bulk of this volume is not out of proportion to the importance of its subject, for Frau Lou is more significant than Lou’s own books. In the case of most biographies the opposite may be taken for granted, but in this case the author’s reach exceeds the woman whose biography he offers us—in two ways.

First: not only does he deal with Nietzsche, Rilke, and Freud; we also encounter an amazing array of other German and Austrian writers and scholars. It is scarcely an exaggeration to say that Lou’s friendships approximate a Who Was Who of Central European intellectual life during the half-century between 1880 and 1930.”

The whole literature on Lou’s troubled relationship to Nietzsche and Paul Rée is dated by Frau Lou.” “Lou, like Nietzsche’s sister, falsified the story. That the sister’s account was mendacious has been known for a long time, but everyone who discussed this episode without relying on the sister has invariably relied on Lou. Thus Binion makes a major contribution to the study of Nietzsche’s life and character.”

In the last chapter we see the old Lou writing her memoirs, rewriting her life once more, fashioning a final version of events that she could not face as they had actually happened. Then we still get an account of the author’s source materials and the obstacles he faced when he visited her archives. It would be a rank abuse of his hospitality to tell this story in the Foreword, but it provides the perfect link between those last years in which Lou tried to forge her myth and this book in which the myth is finally exposed. Only after having read those pages can one fully appreciate Rudolph Binion’s immense accomplishment.”

KEY TO THE REFERENCE MATTER

Dates are written the day first, then the month in Roman, then the year, thus: 7 VII 1897. Lou’s diary entries are cited by their dates preceded by a D, thus: D 7 VII 1897. The formula for a letter, whether published or unpublished, is addresseraddressee, date, thus: LouFreud, 27 IX 1912. Correspondents’ surnames or full names are used except in Lou’s and the following cases: B-H (Richard Beer-Hofmann); CG (Clara Gelzer); Clara (Clara Westhoff Rilke); EK (Ellen Key); Emma (Emma Wilm Flörke); FN (Friedrich Nietzsche); Frieda (Frieda von Bülow); Hanna (Hanna Bormann); Helene (Helene Klots Klingenberg); HVH (Hugo von Hofmannsthal); Ida O (Ida Overbeck); Lisbeth (Elisabeth Nietzsche, later Förster-Nietzsche); MVM (Malwida von Meysenbug); O (Franz Overbeck); RMR (Rainer Maria Rilke). An asterisk signifies an oral source, thus: *Franz Schoenberner.”

PREFACE

Frau Lou is a psychoanalytic study of a near-mad near-genius of a woman.”

Translating Lou was troublesome, for as she grew older her style carried the weight of her arguments more and more. Academic at first—even in her fiction—it acquired sonorous modulation and intricate articulation in her middle years. Then it went the way of compact allusiveness, as if aiming to compress all of Creation into a single, pious syllable. Tractable as is German diction, Lou strained it baroquely in the end. This compelled me to strain English even harder in order to convey her message intact. I moreover found best reason to quote her at her worst, for then her latent texts were most legible—especially when she was either solecistic or silly, which she rarely was.”

P A R T O N E . C H I L D H O O D

I. FATHER AND FATHER-GOD

Psicanalistas deviam ser proibidos de escrever biografias: “Litde Lelia was wretched amidst plenty as only a human being can be. Her trouble was psychic growing pains which fortunately can, and unfortunately must, be traced to their crude source. This was a craving for her father excited by excretion and attended by darkling visions of reentering his bowel-womb to repossess his penis.”

Mas essa bisonhice na escolha e interpretação dos temas não é o pior: estilo críptico e pouco pertinente para esse tipo de livro. Prosa poética de mau gosto. Quem entender se o que Binion descreve às páginas 6 e 7 são apenas eventos normais de infância ou cenas de estupro ganha uma balinha. Ex: “yet she was pleased to feel tiny and helpless over against him.”; “and if his strokes now felt punitive rather than voluptuous, she now had a father-god only too willing to commiserate over the sore spot.”

P. 8: “In drawing on actual people for her personages, she was opening up her ‘second world’ to the first. Yet beneath the surface, her personages were still mostly herself and her father, their fates still determined by her old father-romance.” Ainda não entendi uma linha da vida dessa garota…

Probably rarely has a girl had everything so much her own way, averred her mother.”

Autistic as ever, ‘awkward’ and ‘shy’ to boot, Lelia kept to herself throughout adolescence.” “Her one confidante her own age was her cousin Emma, who would daydream with her about true love.” “Lelia’s only other intimate was an uncannily clever and charming maiden aunt named Caro, who won her heart by treating her as the special girl she knew herself to be.”

ALICE ÀS AVESSAS: “Lelia ‘learned nothing’ at her gymnasium, the German Lutheran Petrischule, where at 16 she still wrote like a whimsical child of 10.”

II. GOD’S VICAR, GILLOT

Constructions like Gillot’s were rife since Herder and Hegel had made history progressional and Bauer and Strauss had made Jesus historical.” Se isso foi 11:59, ainda estamos na meia-noite em ponto!

Early in 1880 she went abroad with her mother to convalesce from nervous exhaustion.”

III. AFTER GILLOT

(…)

Ilegível!!!

P A R T T W O . Y O U T H

I. THE UNHOLY TRINITY

Parece que ela foi “aluna especial” ou “ouvinte” na universidade de Zurich porque não pôde se qualificar ao bacharelado.

Paul Rée, a Schopenhauer adept in his student days, took a doctorate at Halle in 1875 with a dissertation on Aristotle’s Ethics and that same year brought out an anonymous collection of psychologistic bons mots: Psychologische Beobachtungen. In 1877 he came into his own as Positivist, Utilitarian and Darwinist all in one with an account of how conscience must have originated” Nie. tinha que fazer muitas concessões para ter amigos, já vejo!

She took him out of her way home from Villa Mattei via the Coliseum, where she assured him beguilingly by moonlight that she was out for comradeship, not romance. Infatuated, Rée sent for help from his one close friend, Friedrich Nietzsche.

Rée had first met N. in 1873 through a common friend, the classicist and Kantian Heinrich Romundt, on arriving for a summer in Basel, where N. was professor and Romundt was visiting him. N. was then 28, Rée 23. With an old classmate of N’s, the dilettante Carl von Gersdorff, Rée attended N.’s course on the pre-Platonic philosophers.”

in (…) 1876 (…) the two were both just then positivistically surmounting Schopenhauer’s influence,¹ N. in his Human, All Too Human and Rée in his derivation of conscience. So congenial did N. find Rée both philosophically and personally that, after ‘enjoying the lovely autumn’ for some days with him near Montreux, N. took him along on a winter’s sick leave spent in Sorrento with Malwida von Meysenbug – by her gracious provision.”

¹ À minha idade atual. Quão doloroso não foi para mim chegar a esse estágio já aos 20? Mas e então – o que fiz desses 12 anos de dianteira? “Progredi” realmente em algo mais?

he is a moralist with the keenest vision – quite a rarity among Germans.” FN

he developed into a genealogist of morals in point-by-point opposition to Rée.” “Perhaps I have never read anything to which I have said no to myself sentence by sentence, conclusion for conclusion, in such measure yet utterly without vexation or impatience.” Prefácio da Genealogia

Gods were not natural forces divinized to the end of sanctifying official penalties, as Rée had it; they were tribal fathers to whom, by reason of the pain of being moral, a bad debt was felt to be owing – and growing. Moreover, religion did not merely underwrite official morality, but often enough rewrote it. For morality was transcending itself continually: today’s virtues were yesterday’s vices.” “N. too viewed the bad conscience as mankind’s mortal ailment, and at first too saw a quick individual remedy in the correction of certain intellectual errors, notably God and free will. He soon looked instead to a gradual ascendancy of mankind’s ‘intellectual conscience’, newly emergent, over mankind’s moral conscience, still at loggerheads with the herd-instinct. By 1882 he was dimly envisioning an inversion of values by ‘free thinkers’ (who would repent of their compassion, rancor and remorse [and of their repenting?]) preliminary to a transvaluation of values by a new, higher species of moral man.” Grifo meu.

Rée harked back to premoral man, N. forward to postmoral man – to a final, as against primal, innocence to be achieved through self-mastery and self-knowledge. For only N.’s thinking was bold. Rée’s irreverent philosophy was one long writ of impeachment against a tyrannical conscience – his own.” “Each bore the marks of a pressing personal alternative: melancholia and paranoiac megalomania respectively.” “Yet all along, even as he played up Rée, he played down their differences. In HATH he called Rée ‘a master of soul-searching’ and again ‘one of the boldest and coldest thinkers’. (…) Subsequently he added: ‘Long live Réealism and my good friend!’.” Genial.

AOS 33 (estou a 2 dias do meu aniversário, 2021): “Two years later N. was released from his university duties with a decent allowance because of his health. Subject to dire headaches, eyeaches and nausea since 1873, with ever rarer interludes of euphoric relief, he suffered the worse for imagining his father’s fatal ‘softening of the brain’ to be hereditary. [a fonte aqui é uma carta a Brandes de 1888]”

Foi um projeto longamente cultivado por N. e Rée morarem e viverem juntos, porém nestes tempos de convalescença e de necessidade de eremitismo filosófico N. hesitou primeiro, para em seguida rechaçar tal projeto com firmeza: não era seu destino levar uma existência tão ‘epicurista’!

N.’s distress on Rée’s account, while quite sincere, was only the outside story. The inside story was released to Malwida years afterwards, with a vengeance: <‘He’s a poor fellow, one must push him along’ – how often have I told myself this when his miserable, dishonest way of thinking and living revolted me. I have not forgotten the fury I felt in 1876 as I heard he would come along to you in Sorrento. And . . . in Sils-Maria I became ill at my sister’s news that he wanted to come up. [N. expressou sua vontade de não ser sob qualquer circunstância interrompido em seus trabalhos de verão, por carta, a Elizabeth.]>

On the outside, meanwhile, N. overrated Rée far more than was even his fond wont with friends. For Rée had no notion of N.’s mind beyond the narrow range of his own: all N. was contained for him in N.’s Réealistic sentence, ‘Every word is a prejudice’. And even within that narrow range N. was Rée’s master.” “By mail N. would exchange compliments with Rée but not ideas – for all Rée’s trying.”

Curiosamente, seu amigo também parecia sofrer dessa sinusite-dos-sábios: “I have had a headache now for some 14 months without even a minute’s let-up.’ Desabafo em carta, outubro de 1879.

E aqui eu muito agradeço Lou sequer estar sendo mencionada!

He mothered N., nursed him, read to him to spare his eyes, but then stole his symptoms” Como não deve ter sido prato cheio e apetitoso para um psicanalista estreito escrever essas linhas!

Both were precisionists with the pen, with a like penchant for epigram. N.’s prose was not lost to theory, however, but bacchanalianly live with it. It reveled in his thinking as he himself did; and amidst his solitude, his thinking ran riot with him. Timid as he was, it knew no taboos, so that he took wicked delight in it – while also shuddering at it as, beginning in August 1881, he conceived in turn the ‘eternal recurrence’, the ‘overman’, etc.”

And then it was that N. chose to <return ‘to men’>, as he put it – to come down from the mountain so as ‘to become human again’, like his Zarathustra in The Gay Science, then in preparation.”

Rée teria enviada uma máquina de escrever a N., que quebrou no caminho.

N. dizia de si mesmo em suas cefaléias horrendas: 7/8 (sete oitavos) cego.

Between times they went to see Sarah Bernhardt, who, overplaying Camille, burst a blood vessel on stage – ‘an unbearable impression.’

Your brother uses the typewriter all the time, only his blind groping for keys does give him lots of trouble.” Rée Lisbeth

Greet the Russian girl for me, if that makes any sense: I am greedy for souls of that species. In fact, in view of what I mean to do these next 10 years, I need them! Matrimony is quite another story. I could consent at most to a 2-year marriage” N. escreve nessa mesma carta que logo após essa frase a máquina de escrever “parou”.

Well before then, Lou was already counting N. in on her projected residential salon by reason of Rée’s and Malwida’s respective versions of him as the veriest positivist and veriest idealist.”

Gillot, o preceptor e quiçá proponente a marido de Lou, tendo enviado uma carta de censura sobre seus “projetos devassos” de se encontrar com dois homens (uau, arrebatadoramente imoralista!), Lou respondeu declarando sua emancipação, por assim dizer. Claro que nesse ínterim Rée foi sempre um joguete de seu coquetismo. Agora vinha mais um para diverti-la.

As for his [Reé] taking her [Lou] home on foot after midnight, arm in arm: what if someone had recognized them?! ‘And what would R. have done had an officer or anyone else been unpleasant to you – fought a duel?!!’ Malwida”

Malwida had glimpsed a first truth about Lou: she was not unmindful of sex and convention after all.”

O PRIMEIRO ENCONTRO (NA PRAÇA DE SÃO PEDRO, ROMA, ITÁLIA): “His hands incomparably beautifully and nobly wrought, his unusually small and delicately shaped ears, his fine, highly expressive mouth-lines, almost fully concealed by an ample moustache combed over them, his placid features in general together with his gentle laughter, his noiseless way of talking, his cautious, wistful gait, shoulders a little bent, his ultra-simple neat attire”

His defective eyesight lent his features a quite special magic in that they did not reflect varying outer impressions but only what was passing through him internally. They looked inwards, yet at the same time into the distance”

In return, N.’s eyes could barely make Lou out, while to his ears her voice was somewhat rasping.” Hahaha…

“‘It is unpleasant to be able to do nothing but plead in a matter so close to one’s heart’, she wrote Rée on April 25. [para N. postergar sua estada]”

N. cannot answer for how he will feel tomorrow, but would like to introduce himself to your mother before we meet again at the lakes.”

N. was not fit to leave before another week” “he explained to Lou that her chaste ménage à trois was not all that simple even with chaperon, as I should consider myself duty-bound to offer you my hand so as to protect you from what people might say; otherwise, etc. etc.” Que tempos!

Between times N. presented himself to Lou’s mother, who warned him that Lou’s self-accounting was strictly fantastical; he listened with one sharp ear.”

Finalmente no começo de maio o trio se encontrou novamente.

He spoke to her of the eternal recurrence, which made self-denial eternally foolish, and of his son-to-be, Zarathustra, due to transcend the slave morality of good-and-evil as the historic Zarathustra had transcended the master morality of good-and-bad.” Nunca um flerte foi tão imediatamente alto nível na História!

Lou was just not his buxom type”

Ida Overbeck later remembered him as then ‘most excited’ and ‘most hopefully confident’. For, she explained, ‘N. had given himself to the hope of having found his alter ego in Miss Salomé – of working with her, and through her help, toward his goals.’

That this photo was all Lou’s idea emerges from RéeLou (late May 1882): the Stibbe doctor would examine her as revenge for the photographing: I shall be as stubborn (about it) as you (were)’, and from RéeLou (mid-June 1882): ‘Picture arrived yesterday. N. superb; you and I hideous, can dispute the prize for ugliness between us. You see, Lou, for once you were not right after all.’ FNLou (28 May 1882) was more gallant: ‘Oh the bad photographer! And yet: what a lovely silhouette atop the rack-waggon!’

(*) “Natural science was presumably N.’s idea, but 1890a:224 is the sole source for the stock contention that he wanted to study it 10 years so as to ground the eternal recurrence physically (space and matter finite, time infinite), which is likely as fanciful as the neighboring one (ibid., 224-25) that, cursory study having disclosed the impossibility of ever grounding it, he clung to it only the faster (cf. Schlechta, Fall, 30ff.)” O que não é o tal do telefone sem fio, Mr. Graham!

O DISCRETO: “N. desired Lou’s ‘very existence’ to be kept secret from his mother and sister. Son and twice grandson of preachers, N. did not ridicule his family on account of its ‘Naumburg virtue’ without reverencing it on the same account, even unto fantasies of noble lineage: in nothing, declared Overbeck, was his ‘caprice’ more conspicuous. His sister, still his childhood sweetheart, had since HATH come to idolize his life as against his books, and he cherished her idolatry at heart even as he dreaded her jealousy.”

At all odds, Rée was already on intimate Du terms with Lou in Lucerne behind N.’s (and everyone else’s) back – as a ‘little brother’ with his ‘little sister’, to be sure, yet even fraternally he craved Lou’s exclusive affection.”

Rée’s aim of turning Lou over to N. was reversing itself: already he was aiming to turn her against N..”

II. FORM PILLAR TO POST

Paulão visivelmente agindo como fura-olho pelas costas via cartas: “I am and shall remain entirely your friend alone; I have no scruples about behaving a little crookedly, a little falsely, a little mendaciously and deceitfully toward anyone except you. Out of my friendship to you I make a cult; I regard as a sin – (what, Mr. Antimoralist?) – well, I mean: if I did or said anything false, dishonorable, unfriendly, crooked with respect to you, I would have a feeling just like the one believers may have after committing a great sin. And from this special uprightness I draw a justification for being false in generalEscreve como se falasse ao telefone…

Are we really going to see each other again – or have I only dreamed it!” P.R.

R. is from head to toe a better friend than I am or can be: mark well the distinction!”

Your Flush of Dawn is now my only companion. It entertains me in bed better than would visits, shopping, and travel dust. Could I but say: see you soon! Only remain so cheerful and healthy, everything will turn out very well.”

Let me know how you propose to arrange your time from Bayreuth on and what cooperation from me you are counting on. I now badly need mountains and forests: not only health but even more The Gay Science is driving me into solitude: I want to finish it.”

Naumburg is a frightful place for my health.”

But I would like to insist very strongly that you not get all wrapped up in N.’s work. I should have preferred your going your own way mentally, just to prove for once that, even in these highest realms of thought, a woman can stand alone and attain independent results.” Malwida – Não se estamos falando do maior filósofo da Europa moderna!

Above all, I hope N. himself steers another course than in his latest writings”

NEVER did I think that you should ‘read aloud and write’ for me, but I very much wished that I might be your TEACHER. To tell the whole truth: I am now seeking people who could be my heirs; I carry something around with me absolutely not to be read in my books – and am seeking the finest, most fertile soil for it. Observe my self-seeking!”

I was downright bowled over by the fact of having acquired a ‘new person’ after overly strict seclusion and renunciation of all love and friendship.”

tragically, N. alone in his day and age knew how far above that day and age he stood.”

I am now still occupied with very fine matters of language: the final decision on the text requires the most scrupulous ‘listening’ to word and sentence. Sculptors call this work of finishing ‘ad unguem’.”

As for Parsifal, on July 26 she stood through the first performance looking duly transfixed, tone-deaf though she was.”

I hate it when someone does something commonplace and then calls it by a fine name. (…) this talk of their living together was sheer drivel; even assuming that the girl had been quite ideally pure-minded, her habits of life were so different from ours. Fritz is so painfully orderly, exacting, and ascetically inclined” EN

Lou’s earliest Nietzschean apologists themselves (Bernoulli, Halévy, Andler, Hofmiller) all maintained that she was a passionate Wagnerite—indeed, that this was the root of the evil.”

One day a bird flew by me, and I, superstitious like all solitary people who stand at a turning of their way, believed I had seen an eagle. Now the whole world is at pains to prove to me I am mistaken—and there is urbane European prattle about it. Who is better off now—I, who as they say was ‘fooled,’ who spent a whole summer in a lofty world of hope on account of this bird omen, or those who are ‘not to be fooled’?—And so forth. Amen. . . . —Now I am ‘a bit in the wilderness’ and pass many a sleepless night. But no despondency! And that demon was, like everything that now crosses by path (or seems to), heroic-idyllic.” FNPT (Peter Gast)

Relato de EN das palavras de Lou: “he’s a madman who doesn’t know what he wants, he’s a common egoist who wanted only to exploit her mental gifts, she doesn’t care a hoot for him but if now they didn’t go to a city together it would mean she weren’t ‘great’, that’s why Fritz doesn’t want to study with her—so as to shame her. What’s more, Fritz would be crazy to think she should sacrifice herself to his aims or that they had the same aims at all, she knew nothing of his aims. Besides, were they to pursue any aims together, 2 weeks wouldn’t go by before they were sleeping together, men all wanted only that, pooh to mental friendship! and she knew first-hand what she was talking about, she had been caught twice already in that kind of relationship. [com ‘papai-Deus’ e a porra dum padre-tutor!]

As I, now naturally beside myself, said that might well be the case with her Russians only she didn’t know my pure-minded brother, she retorted full of scorn (word for word): ‘Who first soiled our study plan with his low designs, who started up with mental friendship when he couldn’t get me for something else, who first thought of concubinage—your brother!’

utterly out of my element: never in my life had I heard such indecent talk (here I have reproduced it all with propriety at that). And a 21-year-old girl was saying these things, especially about men generally and my brother in particular, and when on top of it all she had proposed their living together!! What is one to think of such a girl?! In the evening, when we were in Tautenburg and Fritz was out looking for a place for us to stay, she broke out again in a fury against Fritz and became downright grossly indecent, as when she said full of derision: ‘just don’t go thinking that I care beans for your brother or am in love with him, I could sleep in the same room with him without getting worked up.’ Would you believe it possible? I too was altogether beside myself and shouted at her repeatedly: ‘Stop this indecent talk!’ ‘Pooh,’ she said, ‘with Rée I talk a lot more indecently.’ She had also told me Rée had told her that Fritz was thinking of a concubinage. So now I told her: All right, I would ask his mother, whereupon she was furious and threatened to get back at me, and she did. I was utterly miserable and didn’t sleep a wink. . . . Oh what a martyrdom for my sensibility the whole story was! . . . The moment she believed she could draw no further advantage from his fame she fell upon him like a wild animal and tore his good name and reputation to bits and trampled on them. . . . The girl is not out to marry Fritz, she just wants to become famous through him. She wants to marry only a rich man because she needs lots of money and has none.”

Again Lisbeth’s account was in substance unquestionably faithful throughout. It depicted a veritable hysterical outburst on Lou’s part modulated by an impish impulse to make Lisbeth squirm in her straight laces. Lisbeth was indeed shocked—for life.”

AH, A TURMINHA DA PSICANÁLISE! “In after years Lou herself, even while officially scouting the whole vulgar incident, represented the contents of her tirade equivalently in diverse contexts; as to its form, in old age she projected the hysteria onto Lisbeth by having her vomit in shock”

Heavens, she had never imagined I still had such retarded views, so what if he had intended concubinage? That would be nothing degrading surely, they were above conventionality so it couldn’t degrade Fritz and she hadn’t meant it to.” EN

Rée, then heading for Helgoland to wait on Lou’s pleasure, did his best to sustain the lovers’ quarrel by mail. He took it out especially on Nietzsche’s shift of philosophical course. By mid-August, however, he was reduced to taking it out on his own jealousy. For through a diary installment Lou told him about having spent a radiant August 14 with Nietzsche away from Lisbeth ‘in the quiet, dark pine forest alone with the sunshine and squirrels’, adding: ‘Conversing with Nietzsche is uncommonly lovely . . . but there is quite special charm in the meeting of like thoughts and like emotions; we can almost communicate with half words. . . . Only because we are so kindred could he take the difference between us, or what seemed to him such, so violently and painfully. . . . The content of a conversation of ours really consists in what is not quite spoken but emerges of its own from our tacit exchanges. (…) But is it good for him to spend the whole day from morning to night in conversation with me, hence away from his work? When I asked him this today, he nodded and replied: But I do it so seldom and am enjoying it like a child. The same evening, though, he said: I ought not to live long in your vicinity. We often recollect our time together in Italy and . . . he said softly: monte sacro—I have you to thank for the most bewitching dream of my life.Lou came close to perceiving a sorry truth: in nothing was she so akin to Nietzsche as in her passion for half-spoken words that denied as well as implied their unspoken half.”

What will become of him? He cannot again devote so much enthusiasm and energy to a cause.¹ A second love is no love. And will anything come of this one? Besides, there is subtle charm to the fact that one often does not clearly understand what he is saying and so supposes more behind it than is there.² Snailie [apelidinho mongolóide entre a puta e R.] will laugh and say pure envy is speaking out of me. Perhaps—”² O limitado Rée

¹ Os maiores livros de Nietzsche ainda estavam todos por ser escritos.

² Já devemos congratular este simplório pela astúcia de entender que havia algo que não podia entender na filosofia nietzschiana…

And I’m somewhat jealous too meanwhile, naturally—understandably. . . . Just you wait, Snailie. [Smeagol] . . . Now that you’re friends again with Nietzsche, enough! More you don’t need, do you hear, Snailie?” Patético.

É a historiografia dos fortes? O que é ‘fortes’?

III. “A PITY FOREVER”

TALK HAD set them asunder; talk brought them back together. Morning, noon, and night the two talked—in the pine forest, on an inn terrace beneath lindens, along precipitous chamois paths, in her room and in his. They talked of unholy things—of squeamishness about suffering as inhibited delight in it (‘we did not dare look at each other afterwards’) and, over a cognac (‘Ah, how foul it tasted!’, he exclaimed), of his potential for madness. More academically, he argued the original ascendancy of the ‘herd instinct’ over Rée’s constant: egoism. Yet religion was, he later remarked, ‘really our sole topic’. They discussed how each had relinquished his childhood faith—he all at once and effortlessly, she with a painful struggle of mind against heart.”

Odd—how in our talks, without meaning to, we always wind up on the precipice; anyone listening to us would think 2 devils were conferring.” L.

Nietzsche found Lou’s prose sorely wanting yet readily corrigible.”

She labored her diary for his scrutiny too. ‘I have excessive confidence in his power as a teacher’, she entered on August 14. By August 18, however, he has ‘given up on being my teacher; he says I should never have such a prop’ – which on their terms meant never be a woman.”

She resolved on Nietzsche as author, in lieu of woman as such, as the subject of her first full-scale study.” “She had caught him at the ideal moment: in transition – or, as he preferred, transcendence. After 6 years of impassioned positivistic self-restraint, he was about to burst into didactics and song. [?] With his help, she found that he would she himself (sic) a new philosophic purpose in order to deliver himself from the pain of instinctual discord whenever an old one lost its grip on him, and that he would face up to each new purpose as to ‘something cut off from himself and to be endured by him’ – whereas she would struggle painfully toward her one (unspecified) goal felt to be an innermost necessity.”

So ended Lou’s Tautenburg diary. From merely romanticizing his every sign of fondness for her, she had gone on to divinize N. in her own likeness.”

“‘Two things my philosophy forbids me unconditionally: 1. regret, 2. moral indignation. Do be sweet again, dear Llama!’ Llama stayed sour, and Nietzsche shortly reported to Overbeck: I have the Naumburg virtue against me, there is a real break between us – and even my mother so forgot herself with one remark that I packed my things and left for Leipzig in the morning.’ He was to specify thereafter: ‘My mother called me a disgrace to my father’s grave.’

I have no call at all today for praise or blame – a further reason to write no letters.”

FNL “Read Sanctus Januarius once in context! There stands my entire private morality as the sum of my requirements for existence: they prescribe only an ought, in case I do not want to myself.”

Lou at all odds read Sanctus Januarius – and blithely took the passage exhorting an estranged friend to be one with candor and good grace for a message to Rée. § Rée looked just a bit contemptible to Lou after Tautenburg – and felt rather more so. On a note of apology, he promised N. a frank talk in Leipzig. Under the same cover he announced that Lou had won him over to N.’s view that egoism had been celebrated before coming to be reviled: he was back at playing second fiddle, only now under Lou’s baton.”

“‘stellar friendship: our earthly ways have parted, but let us trust that, though we may yet become earthly enemies, our celestial orbits will cross again sometime’ Science. N. unquestionably had Wagner on his mind when penning this passage (though Hofmiller, without dissenting, located the germ of it in FNO, 14/11/81) – but R. may have already been at the back of his mind then and certainly was in 9/1882).”

the oldest signification of ‘good’ was distinguished, powerful, rich, and of ‘bad’ lowly, weak, poor: this was Rée’s one new Nietzschean thesis since his Ursprung.” Ao que consta, Lou ‘convenceu’ Rée de que a filosofia de N. era mais correta que seu ponto de vista liberal-pragmático.

With that, Rée was ready to crawl contritely out of the Trinity.”

as I have lost my natural sister, a preternatural one is due me.”

Between times, Lou was again N.’s self-willed schoolgirl. They discussed her plans for a study of religious history as well as her draft sketch of his life and works.”

Rée era o passivo da não-relação.

I do not like feelings where they reconverge in their circulation, [?] for that is the point of false pathos, at which truth and integrity of feeling are lost. Is this what is estranging me from N.?” Ficou xonadinha e não quis dar o braço a torcer.

Lou “Maia”: ela e o véu – e nada mais!

Dedicatória no exemplar de HDH:

Freundin – sprach Kolumbus – traue

Keinem Genuesen mehr!

Immer start er in das Blaue,

Fernstes zieht ihn allzusehr!

Wen er liebt, den lockt erg erne

Weit hinaus in Raum und Zeit –

Über uns glänzt Stern bei Sterne,

Um uns braust die Wigkeit.”

The Columbus theme in Nietzsche’s poetry goes back to his ‘Colombo’ of 1858, one of his many youthful poems about sailing the high seas – but the only actual sailing he ever did was that to and from Sicily in 1882.”

Even writing letters to my sister is no longer advisable – except for those of the most innocuous sort (I sent her another letter full of merry verses lately).” Nietzsche a Overbeck, 27?/8/1883

How shallow people are to me today! Where is there a sea left in which one can still really drown? I mean a person.”

Then he moved on to Columbus’s city, from which he had originally sailed to meet Lou – in the wrong direction. He had come full circle.”

All nearness makes one so insatiable – and in the last resort I am an insatiable fellow on the whole. – From time to time we will see one another again, won’t we?” NR

Mind? What is mind to me! What is knowledge to me! I esteem nothing but impulses – and I would swear we have something in common here.”

de espírito-livre a corpo-livre lá vai um, lá vão dois, três abismos!…

Affects are devouring me. Dreadful pity, dreadful disillusion, dreadful feeling of wounded pride – how can I stand it any longer? Isn’t pity a feeling out of hell? What should I do? Every morning I despair of lasting the day. I no longer sleep – what good does 8 hours’ walking do! Where do I get these violent affects from! Oh some ice! But where is there ice left for me? This evening I’ll take opium till I lose my mind.”

A cat’s character: that of a beast of prey posing as a domestic animal. Nobleness as reminiscence about association with noble people; strong will, but with no great object; without diligence or cleanliness, without civil probity; cruelly misplaced sensuality. (…) Capable of enthusiasm for people without love for them, yet love for God: need for effusion (…) only some basic mishap in your upbringing and development has temporarily crippled your good will for this. Just think: that cat-egoism unable to love any longer, that professing nothing together with a feeling for life . . . and then knowledge as a pleasure among pleasures. And if I understand you at all: these are all voluntary and self-imposed tendencies with you – for as much as they are not symptoms”

A MACACA DE ZARATUSTRA: “In her loss of herself she was that strongest offense to him: ‘the caricature of my ideal.’

His sister – who, according to a draft to Malwida, ‘regards Lou as a poisonous reptile to be destroyed at all costs’Só porque uma mulher não presta, não quer dizer que sua inimiga preste.

Souls such as yours, my dear sister, I do not like: and I like them least when they are morally bloated.”

For heaven’s sake, what do these little girls of 20 think who have pleasant feelings of love and nothing to do but be sick now and again and lie in bed?”

Formerly I was inclined to take you for a vision, for the earthly apparition of my ideal. Observe: I have poor eyes. . . . Had I created you, I would have given you better health, to be sure, but first of all some things that matter far more

Twins spiritually, they were sexually the titillating reverse. Only the same taboo on both sides brought their mating to a stalemate as its sexual motive loomed lurid to them both” mating!

I tense all my fibers for self-mastery – but I have lived in solitude and fed on ‘my own fat’ too long, so again I am the more readily racked by my affects. Could I but sleep!” NO

Today something occurred to me in passing that made me laugh hard: she actually treated me like a 20-year-old student – a quite permissible approach for a girl of 21 – like a student who had fallen in love with her. But sages like me love only ghosts. Woe if ever I love a human being – I would soon go to ruin. Man is too imperfect a thing.”

But Lou, what letters you write! Little vengeful schoolgirls write that way: what use have I for such paltry stuff? Do understand: I want you to raise yourself before me, not lower yourself still further.”

In Lucerne I gave you my piece on Schopenhauer: I told you that my basic views were in it and that I believed they would be yours too. You should have read it and said no then: much would have been spared me.”

What would you reply if I asked you: are you honest? are you incapable of duplicity? . . . In your mouth, such a poem as To Pain is a deep untruth. In such matters I hate all superficiality. Only a high purpose can make people of your sort bearable to others.”

No, my dear Lou, we are nowhere near ‘forgiving’. I cannot shake forgiveness out of my sleeve after the offense has had 4 months in which to burrow into me. . . . Adieu, my dear Lou, I shall not see you again. Preserve your soul from such doings and make good with others (…) Adieu, dear Lou, I did not read your letter through, but I read too much already.”

Fast upon his ‘adieu’ to Lou, and just 9 months after meeting her, he delivered the first book of So Spoke Zarathustra, written in a trance, as if from inner dictation, in 10 ‘absolutely serene and fresh January days’.” A melhor contribuição (maculada, fenomênica concepção) desta mulher ao mundo!

Now on February 13, 1883, his first Zarathustra was ready for the printer – ‘in just the holy hour in which Richard Wagner died’, he later specified.”

My severance from my family is beginning to appear to me as a true blessing; oh, if you knew all I have had to overcome on this score (since my birth)! I do not like my mother, and hearing my sister’s voice upsets me: I have always fallen ill when together with them.”

With spring (…) the second book of Z. emerged.”

As for the typewriter, it is on the blink like everything weak men take in hand for a while, be it machines or problems or Lous.” NLisb.

Things are moving again. My sister wants her revenge on this Russian – well and good, only so far I have been the victim of her every initiative. She does not even notice bloodshed and the most brutal possibilities hardly an inch off.” NO – poderia estar falando da bestialidade alemã de décadas à frente, sem qualquer reparo!

And do not worry about my false footing with my sister; the truth is that all my footings so far with everyone have been false: she was at least as much affronted as I was, with good right too, and if now she means to work it out for Lou to be sent back to Russia, she will be doing more good if she succeeds than I with my asceticism. Of a sudden Dr. Rée steps into the foreground: to have to relearn about someone with whom I shared love and trust for years is frightful.” NIda O.

From all that I have now learned – of far too late! – these 2 persons, Rée and Lou, are not worthy of licking the soles of my shoes. Excuse the all too human metaphor! (…) Schopenhauer-style ‘pitying’ has so far always done the top damage in my life”

About suicide – a thought that every lengthy letter from N. in over half a year has expressed – I feel quite as you do: nothing can make it acceptable except desperation.” OGast

I would delight in giving you a lesson in practical morality with a few bullets: maybe in the best case I could manage to deter you once and for all from dealing in morality, which calls for clean hands, Dr. Rée, not clammy fingers!” NR

Ao irmão de Rée, teria dito algo que se aproxima, na tradução, a macaca fétida e esquálida com enchimento (falsos peitos). Adorável!

Enmity is incompatible with my whole philosophy and way of thinking”

RE-JOYCE WITH YOUR INNER POSSIBILITIES!

o rato roebens (rói bem!) a (consciência da) roupa do rei de remorsuras e inteleitos

mas ao pai de todos os reis, a punição mais severa –

a impossibilidade da reconciliação com um seu igual em temperamento.

…posto que se aproveitam de minha nobreza!

I no longer know how to live; it is on my mind continually.”

Se misturar com a ralé, Nietzsche, é da vida! – segue o jogo… Cada um à parte, com sua parte.

Never before did I hate anyone – not even Wagner, whose perfidy went well beyond Lou’s. For the first time I feel humbled.” Imagina-te filho de um Wagner, e não de um pastor que morreu sem dar trabalho…

long a stranger to practical life, I act 49 times out of 50 on a motive no one seeing me thinks of, so that I almost always arouse misunderstanding and wind up my own victim.”

engolindo e vomitando sapos como devora-se o pão de cada dia, mas não a ponto de estar cego a quem diabos sou ou devenho…

Such pain (it was as if a knife had been put to all my sore spots at once!) is a high distinction. My body and soul are so constituted that I can suffer frightfully in both: and as for my soul, I was last year like someone who for many, many years running had experienced nothing: whence my soul was without any skin or natural protective device.”

Given her energy of will and originality of mind, she was headed for something great; given her practical morality, though, she may well belong rather in a penitentiary or madhouse.” O clubinho das Quartas-Feiras não deixa de ser ambos: por fora, ‘something great’ (de acordo a pseudo-historiografia do séc. XX), porém um asilo ou penitenciária até a medula! Nada menos que profético, meu caro e jamais superestimado ídolo!

you cannot imagine how this madness rages in my day and night.”

Ajude-me a sobreviver mais 15 meses! = foi ele, mas poderia ser eu neste fim de maio, o segundo maio da pandemia!

The separation from you threw me back into the deepest melancholy, and the whole return trip I was lost to evil black sentiments, including true hate for my sister, who for one year now has deprived me of all self-control with ill-timed silence and ill-timed talk”

He nonetheless left for Naumburg [cidade das duas víboras-de-família] a few days later – and there, in a month of being tirelessly chided and taunted, the crisis passed. Lisbeth had found ‘something absolutely distracting’: anti-Semitism, the highest lesson she had drawn from the Trinity fiasco. That month Naumburg celebrated her engagement to Bernhard Förster, who was laying plans for Aryan colony in Paraguay.”

By April he had broken with Lisbeth again – this time ‘radically’, for ‘between a vengeful anti-Semitic goose and me, conciliation is impossible.”

Despite all this forfeiture, and for all his show of anguish and fury, he surmounted the sentimental casualty of ‘82 more rapidly, more fully, and more healthily than either of his 2 erstwhile consorts.” [!]

IV. LOU WITHOUT NIETZSCHE

– His is a beautiful mouth.

– But, Miss Salomé, how would you know? His mouth is overcast by a formidable moustache.

– Yes, but when he opens his mouth (and how often I did speak with him!) I see his lips perfectly.

too odd a girl to be easily made out . . . a likable, winning, truly feminine being who renounces all womanly resources in the struggle for existence and instead takes up men’s weapons with a certain harsh exclusiveness. Sharp judging and, as it turns out, condemning of everything; no trace of mercy, so dear to woman; clear resoluteness in every word, yet her character only appears the more one-sided for being so resolute in its one direction; music, art, poetry are discussed, to be sure, but gauged by a strange standard: not pure joy over their beauty, pleasure in their form, comprehension of their substance, poetic enjoyment with heart and soul, no – only a cold, too often negative, corrosive philosophizing about them.” Ludwig Hütter, filósofo alemão, resumindo o caráter e a mente inócuos da ‘valley girl’ Lou a Malwida

Fidelio was ‘not bad’ – to cite one small example.” (Ignora-se se se refere a Rée ou Lou – mas faz diferença?)

I dislike that skepticism which picks holes in everything and yet can offer nothing positive.”

Deussen¹ was, like Romundt, an old friend of N.’s, and Stein a new enthusiast – the one sort being then about as rare as the other.

¹ FN, Genealogy, III:17, called Deussen ‘Europe’s first real expert in Indian philosophy.

Nie.’s occult sway over ‘our friends’ brought home to her his superiority as nothing else could – to the detriment of her chosen alternative to him.”

The Danish cultural historian Georg Brandes, later N.’s 1st notable publicist, evidently escaped detection.” (Aludindo provavelmente a sua possível origem judia – e Paul Rée era um anti-semita!)

In the spring of 1883 Lou and Rée urged a friend of Brandes, the brilliant young sociologist and ardent Nietzschean of the first hour Ferdinand Tönnies, ‘with friendly-violent insistence’ to join them on a trip to the Engadin.”

Paulsen, outro amigo do “círculo”, a Tönnies: “though I by no means like leaving you alone to the Rées and Nietzsches, I much enjoy conversing with Rée but do not expect I could live close to them. There is something morbid there…”

Lisb., 1/9/1900: “I believe Georg Brandes also first heard his name [N.] from me, in the winter of 1879/80 at Friedrich Paulsen’s house”

Tödo mundo cai no cönto dessa sereia: “She is really an altogether extraordinary being: so much cleverness in a 21-year-old girl would almost make your flesh creep were it not for her truly tender disposition and utter demureness. She is a phenomenon that must be seen from close up to be believed. And a single look suffices to annihilate any thought of a ‘woman of loose ways’, as the preacher says: cut off both my hands if I am mistaken!”

On July 26 Tönnies struck the first sour note by complaining of senility as he turned 28.”

There, Lou forgave Tönnies only pro forma and would not see him alone, much less let him call her ‘dear Loulou’ as of old.” HAHAHAHAHA! O irônico é que Tönnies não cometeu nenhuma gafe ou indelicadeza (“dar em cima dela”, seria a 1ª suspeita de quem lê), não nesse sentido: para Lou e Rée, que o incumbiram de uma missão – ver Nietzsche e convencê-lo a arranjar as pazes entre os 3 – ele fracassou além do permitido ao sequer ter conseguido tocar no assunto durante sua visita. Diz em carta que “os olhos semi-cegos porém penetrantes do meu interlocutor me preveniram de qualquer iniciativa”.

He bought Lou a copy of Zarathustra I and read to her from it. She was not a pleased father.” Hahahahaha!

N.’s mid-summer fury [nas cartas cheias de invectivas, a ela, a Rée, ao irmão de Rée e à mãe de Lou! – sem falar das piores ainda, de Elizabeth] had left Lou doubly apprehensive of forcible repatriation” A família Nietzsche era tão influente a ponto de sujar a honra da virgenzinha e torná-la persona non grata na Alemanha? Ou Na Europa inteira, já que esses pseudo-intelectuais faziam viagens quase toda semana para diferentes pontos da Itália, principalmente… Aqui entendo o sentido: a mãe de Lou seria convencida a cortar as ‘finanças’ da idle girl…: “The point was to acquire a profession in any case and maybe even a livelihood just in case.”

Desnecessário dizer que ninguém do “círculo” apreciou o hoje imortal 1º volume do Zaratustra. O próprio circunspecto Peter Gast teria dito, tolamente: “Eu acho que a doença afeta sua escrita”.

Sua tática defensiva (permanecer fora da Prússia por 18 meses e estabelecer-se profissionalmente) era válida somente contra a família Rée; mas ela se preocupava sumamente com a sua. Meio século depois ela ainda insistiria: ‘Eles tentavam me deserdar de volta para casa’ – acrescentando, incoerentemente, que sua família concordara, então, com seus planos de publicar um livro como meio de obter uma ‘permissão de residir no estrangeiro’.” “Im Kampf um Gott [o wannabe-book] Um esforço por um Deus, um romance à dupla chave [double clef, seja lá o que isso significa] –, recounted Lou’s Nietzsche experience not only disguised, but modified in accordance with her attendant hopes and fears. Her narrator-hero was Kuno (Nico), a preacher’s son who, having lost the paternal Faith in his youth, seeks to override the resultant ‘inner conflict’ by setting himself successive intellectual tasks contrary to his inclinations.” E essa BABOSEIRA vem da pena de quem achou Zaratustra ruim? Ok.

Lou’s allowance from home may have been cut in 1883 (in any case Rée escravoceta paid most of their way).”

No “romance” a personagem louaniana recusa uma proposta de Kuno em casamento; Kuno sai da cidade aliviado; Lou comete suicídio envenenando-se! Patético. E depois o romance se prolonga, com Kuno voltando e conhecendo uma filha sua com Lou, crescida, de quem esconde a identidade, e com quem tem um caso. Nauseante. Três vezes patético!

Through Margharita’s inner misgivings over her cat-egoism, Lou was retracting her final, self-justificatory letters to N.; through Margharita’s noble shamming of depravity, Lou was roundly refuting N.’s final indictment of her; through M.’s suicide, Lou was living up to a remark of N.’s, proudly noted by her, about how a nature as ‘concentrated’ as hers really ought to issue in a deed.” Parabéns a Binion por analisar essa merda com tanto esmero – páginas e páginas!

More immediately it was a secret message to N. (like ‘Märchen’s love-recognition at Nico-end’): the declaration of a love that could never be. In the spring of 1884 the hapless lovers communicated indirectly, probably through Romundt. N. learned that he had ‘actually done her much harm’ the preceding summer as also that she was in Meran with Rée and about to publish ‘something on religious affects’. She on her side heard that N. was ready to resume relations.”

she was in Munich afterwards with Stein, whom she engaged to plead before N. for a reconcilement – and mention her novel to him. Then Stein visited Sils for 3 enchanting days beginning August 26. He not only mentioned the novel, but also, N. told his mother, ‘spoke with the highest regard of Dr. Rée’s character and of his love for me – which did me much good.’ As for the plea, it went unheard, having perhaps been inaudible.”

Lou was back in Berlin by December, when her novel appeared. It brought Henri Lou, (?) besides rave reviews, a satchel-load of fan mail. One enthusiast declared: I and a whole circle of kindred spirits to whom I took your confession wish to express our warm and sincere gratitude’Zzzzzz…

My friend Ebbinghaus called it ‘nun’s fantasies’.” Deussen

Overbeck himself judged it ‘the most astonishing book I have read this year.’ He subsequently sent it to N.’s old friend the classical philologist Erwin Rohde, who ‘read it with much interest. For all its great faults (its bodilessness, ghostly spirituality, etc.), it is enticing by virtue of the pure ardor and genuine sentiment bursting forth throughout.’N. também leu o livrito.

A mulher deseja se tornar independente, então ela começa a esclarecer o homem acerca da ‘mulher enquanto tal’: isso é um dos piores progressos no enfeiamento geral da Europa.” Além do Bem e do Mal

Considero o verdadeiro amigo das mulheres aquele que assim as aconselha hoje: mulier taceat de muliere (mulheres devem silenciar sobre a mulher)!”

quando a mulher tem tendências intelectuais, amiúde ela não é sexualmente saudável”

alguém de gênio é insofrível quando lhe faltam ao menos duas coisas: gratidão e asseio”

quem, para salvar sua reputação, jamais sacrificou, pelo menos uma vez, – a si mesmo?”

Eterno masculino” (cunhado por Goethe): a característica de quem sabe, reconhece e exalta as mulheres mais nobres.

Toda sua seção sobre as mulheres em Beyond está repleta de Louísmos virados contra Lou, muito além de seus desertos [Aqui não fica claro o que eu deveria traduzir por ‘well beyond her deserts’ – As puerilidades e futilidades da mulher em geral, de Lou Salomé? Dos aforismos sobre o feminino que Lou tinha elaborado e que N. corrigiu com paciência?] [ou carências?] (ecoando, entretanto, [O que é que ‘ecoava’? o deserto, ou os ‘louísmos’ de N.? ou os louísmos da própria Lou?] o discurso zombeteiro da mulher como ente muito mais talhado para gerar um filho que para competir com o homem): foi sem dúvida a pior conseqüência intelectual de seu encontro.” Se Binion diz!

Convencer o homem a tê-la em alta consideração; para em seguida, implicitamente, acreditar na estima que o homem nutre por ela: quem sabe melhor que a mulher realizar essa mágica?”

alternativa:

Convencer o homem a tê-la em alta consideração; inconscientemente, acreditar na própria nobreza como coisa dada: quem melhor que a mulher para fazê-lo?”

ou ainda:

Convencer o homem de que ela vale muito; acreditar no homem: não é este o truque supremo da feminilidade?”

…depois conferimos o aforismo 148 nas traduções já existentes em Português para uma pós-avaliação!

Mais abstrata é a verdade que se quer ensinar, melhor se deve cativar os sentidos com ela.” Algo de que Heidegger certamente é incapaz…

As colossais expectativas depositadas pela mulher no ato sexual e seu pudor concomitante frustram desde sempre toda a sua vida sexual.”

one should talk only about what one knows firsthand”, assim resenhou N. o livro de Rée sobre a consciência, hahaha!

Rée then separated after all from his soeur inseparable: ‘86 found them living, as Lou then put it, ‘at opposite ends’ of Berlin ‘like children mad at each other’. (…) Besides, Rée had had enough of chaperoning Lou, and Lou enough of his chaperoning.”

The previous fall Rée had again failed his examination for a university lectureship, this time in Strasbourg, whereupon he had commenced studying the natural sciences with a view to grounding his moral philosophy in them” O nível do cidadão…

Mais meia dúzia de velhos babões pediram a mão da russinha em casamento, blá, blá, blá…

Finally, after returning from a few weeks in Bavaria spent principally with Jenia, Lou received a proposal from Fred Charles Andreas, a prodigious philologist [define it!]; the engagement followed secretly on November 1, 1886.”

Afterwards he studied medicine, zoology, and mineralogy at Halle and Göttingen, and at 22 he took a doctorate in oriental philology at Erlangen.” Morou muitos anos na Pérsia: “Only when he injured his eyes deciphering inscriptions in bright sunlight did he return to Europe – as courier to his royal patron, himself en route to Wiesbaden for eye treatment.”

By ‘87 he had mastered Greek, Latin, Pahlavi, Sanskrit, Old Norse, Aramaic, and Hebrew, in addition to Javanese, Dutch, German, French, the Scandinavian tongues, English, Hindi, Arabic, Turkish, Armenian, and just about every dialect of Persian, from Afghan to Baluchi (including Dravidian Brahvi) to Ossetic to Kurdish. Furthermore, in each case he had an expert’s knowledge of the corresponding literature, religion, and folklore, as also of the history, geography, and archaeology. He deciphered inscriptions with surpassing ease, memorizing even as he deciphered. (…) His special concern was how dead languages sounded, particularly how sounds relates to writing and how dialects emerge, then vary; he intended to do a great book on all this once he was settled professionally.” Mas vacilou e o pai da Lingüística foi Saussure e não ele!

POR ISSO NÃO GOSTO DE PSICANALISTAS BIOGRAFANDO: “Whereas he called himself Charles, Lou called him Fred (in writing, mostly ‘F.’), and soon after their engagement he Germanized his given names to Friedrich Carl. This hints at Nie.. So do his age and profession, his interest in Zarathustra, even his eye trouble – and a friendship with Erwin Rohde.”

Done with Lou as far as he knew, N. turned against R. in July 87 with The Genealogy of Morals, subtitled ‘a polemical piece’. In the preface he declared his arguments of 1876-86 against Rée’s moral theory to have been just that, pretending, however, to have drawn them from an age-old theory of his own about to be expounded in full for the 1st time – whereupon he presented them newly consolidated, sharpened, rectified, amplified, supplemented, and cleansed of Darwin’s and Bagehot’s traces. By predating this theory before his acquaintance with Rée, he was extirpating Rée from his past. He was also repudiating Rée the positivist par excellence when now he represented the scientific ideal as a derivative of Christian asceticism, Europe’s mortal malady, and repudiating Rée the rationalist par excellence when now he treated thinking as instinctual like everything else in life, only surreptitiously so. Thus confuted, R. became for him ‘congenial Dr. Rée’ again. And then, while in Ecce Homo he claimed to have meant himself by his Human, All Too Human tribute to ‘one of my friends, excellent Dr. Rée – fortunately too fine an animal to . . .’, (!) he also supposed that a subsidy remitted to him by Deussen from ‘unknown Berlin admirers’ came out of Deussen’s own pocket and, he told his mother, Rée’s.”

Genealogy does retain Bagehot’s distinctive frame of reference – nature’s huge enterprise of making the human animal law-abiding – but no hint at a natural selection of those primitive tribes having the hardest cakes of custom. As for Darwinism, the old ‘herd instinct’ gave way to the slavish principle of strength in numbers.”

Carta a Rée de 1877: “I ever more admire how solid your exposition is on the logical side. Yes, I can do nothing like that, at most sing or sigh a little – but prove! for the good of the head! That you can do, and that is of 100x more consequence.”

Rome viewed the Jew as something against nature, an antipodal monstrosity so to say” Genealogy of Morals

the big news in The Genealogy of Morals, crucial to its whole argument, is the world-historical role of the Jews, a sly priestly folk with a genius for rancor, who, subjugated by Rome, incite the slaves of the Empire to moral revolt against their masters, thereby determining a unique historic reversal of values with modern nihilism as its final consequence – pending a transvaluation of values.”

O mestre deveria aprender ao inverso: compaixão pelos escravos e suportar o ressentimento dos escravos.” Sempre achei que a forma mais cristalina desse axioma está contida não na Genealogia, mas no Crepúsculo dos Ídolos

Mulheres… todas gostam de mim – esse fato é de há muito conhecido: exceto as abortivas, as ‘emancipadas’, que não têm o que é preciso para gerar descendência.” Ecce Homo

Nem se eu enlouquecer eu mando cartas pra vocês!

Rée took his medical degree in 1890, then set up in Tütz as a medical saint. Living alone in a hut on the family estate, he tended the community free of charge for 10 years without a break. He would carry bread and wine to poor patients beneath his priestly mantle and readily finance trips to the distant clinics. He came to hate Lou, and he dismissed N. as all ‘morbid vanity’ and ‘raving’ in ‘clever’ and ‘beautiful’ phraseology. He was preparing a supreme opus, Philosophie

He was still deriving transcendental concepts such as ‘justice’ from selfishness progressively rationalized – still writing history a priori, only now without wasting labor on corroborative research. His philosophy, once daring, was now dated: like his counterpart the Count, he had outlived himself – and not only philosophically.” Acabou com o jumento!

He died on October 28, 1901”

Tönnies também possui um artigo devastador, chamado simplesmente ‘Rée’.

As for Malwida, Hütter recollected that, when he asked her about Lou in 92, she ‘replied – gruff, embittered, deprecatory (not at all like herself) – <I was deceived by her. She let me down>, something like <unworthy>. I said no more…’

V. THE WAYWARD DISCIPLE

With Fred she proved frigid: the marriage could not be consummated.”

She ruled out divorce because of ‘the bond, the word… – they retain their sting: he is still alive, he is, exists, and you have abandoned your freely chosen task!’”

[1890] Throughout most of Europe, Realism had already yielded to Naturalism on stage and in letters a decade or two earlier. That is, the inescapable banalities of social life had yielded to its inextricable problems, the pointless norm to the pointed extreme, occurrences and recurrences to situations, data to theses. Flaubert having shown that adultery was as dull as marriage, Ibsen and Strindberg were now showing that marriage was anything but dull given its inherent perils, including adultery – and dullness. In Germany, though, where Realism had been best known in translation, Naturalism was naturalized belatedly – on the stage for the most part, and with a strong admixture of dialect, reverie, and rhyme. Just so it created a scandal: on October 20, 1889, the Freie Bühne’s first domestic offering, Vor Sonnenaufgang by the unknown Silesian dramatist Gerhart Hauptmann, drew riotous cheers and jeers for blending didactics, lyricism, and crudity.”

As mulheres foram até hoje tratadas como pássaros pelo homem” Beyond Good and Evil

She advocated the emancipation of women, but with the proviso that new, self-given obligations and interdictions should replace the old, man-given ones.”

Though Lou’s Ibsen book was extravagantly acclaimed in its time, its big talk about ideals – about self-liberation versus self-alienation through ideals, and about self-sacrifice for ideals or for want of them – rings false in ours.” “she discussed neither Ibsen’s plays nor even his characterizations, but his characters themselves, quite as if they were real people” “Lou could develop no farther as authoress, feminist or female except as Nietzsche’s ex-disciple.”

Following Nietzsche’s breakdown, Lou filled in her old sketch of him and brought it up-to-date as she pored over his life’s work. The result was the first significant treatment of him in print: 10 precursory articles of 1891-93, elaborated into Friedrich Nietzsche in seinen Werken¹ of 1894.” “Other Nietzscheana prior to Lou’s were crackpot adulation or defamation.” “N.’s writings emerged as symptomatic expressions of self-induced nervous derangement at distinct stages of its development toward insanity. This thesis, startling for its time, was damning for N. in effect and in after-effect, confused as were Lou’s intent and argument respectively.”

If one has character, one has an ever-recurrent typical experience.” BGE

In point of fact N.’s insanity was due to a brain ailment of physical origin, hence was not mentally self-induced, and there is no correlation whatever between the onsets of his malady, his intellectual self-renewals, and his alternations between felt instinctual harmony and felt instinctual chaos. He does seem to have induced and relished many a crisis, only not knowingly. Lou, however, lacked a conception of unconscious purpose”

When speaking summarily, Lou let nothing philosophical survive N.’s self-renewals beyond his philosophical personality itself.”

Evidently she took his Zarathustra IV (1st published in 1891) for his ‘last work’, written ‘on the threshold of madness’ (1890a), only to learn belatedly that it was actually completed in 1885” HAHAHAAHAHA!

Para a loira burra russa:

suprahomem – misticismo

vontade de potência – ( ) (não escreveu sobre)

eterno retorno – idéia fixa

transvaloração de todos os valores – blá, blá, blá (é tão idiota que seria humilhante proceder a este résumé

Her first large-scale autobiographic hoax was, then, an approximation to that great coveted but forbidden spiritual and carnal union between them, rendered celestial and eternal by being depicted only dimly and solemnly and without temporal beginning or end.”

Within N.’s old circle Erwin Rohde, after deeming L.’s first articles on N. incomparably fine and deep, now told Overbeck that she was ‘above all a literary parasite who would just like to live off N. a while as off a suitable substratum while also putting her own person to advantage, and this not so tactfully or nicely.’

her reflexions and constructions about N.’s illness are sufficient in themselves to rule out any really intimate association or communication.”

In July 1893 Peter Gast, in his introduction to a reedition of N.’s Human, All Too Human, upbraided L. for her latest articles: he threw back her charge against N. of mystical madness, refuted her on point after point beginning with N.’s having come to positivism through Rée, and denounced her trickery about how long she knew N. – all this too late, however, to affect her book.”

Mr. and Mrs. Förster had founded their colony – ‘New Germania’ – in Paraguay early in 1886. In 89, facing financial ruin, Bernhard took his life; Lisbeth carried on alone, slowly retrieving the deficit. She returned to Germany in the fall of 90 for 18 months to boost subscriptions, then definitively in September 93 to cash in on her brother’s growing fame. She wrested his literary estate from Gast’s hands, then from her mother’s proprietorship. In February 94 she founded the Nietzsche Archiv in Naumburg with Gast’s help – only to turn Gast out that very spring. For she intended using the Archiv to represent N.’s life and thought in the way of her neo-Germanic propaganda, anti-Semitism and all. Her very own first project was known in Archiv parlance as ‘the biography’.”

In 1900 the Archiv began publishing N.’s letters: forged ones to Lisbeth reviling Lou and Jews plugged untoward gaps. A year later The Will to Power appeared, a concatenation of N. scraps presented as N.’s supreme work – as if to render Lou’s study obsolete. Lisbeth meanwhile more than once called Lou a liar in print – notably in 99 concerning Lou’s pretended conversations and correspondence with N. about the eternal recurrence. In 1904 the volume of the Archiv biography covering 82 appeared. By this account, Lou approached N. as a would-be disciple, but fast showed herself to be intellectually unfit and only out for an amour, so N., who really just wanted a secretary anyhow, sent her packing. L.’s book, ‘utterly false and untrue’, contained ‘conversations never held, excerpts from imaginary letters, and events that never took place.’ It was ‘an act of revenge upon sick N. due to wounded feminine vanity’ – and was ‘perhaps meant to win back Paul Rée’s alienated affections’ to boot.”

Unfortunately for Lou, the mud slung at her was made up of pure grains of truth – or rather, fortunately for her, the pure grains of truth were all mudded over. So, speciously wondering that anyone could regard her book as directed against N., she dismissed the Archival as beneath her dignity to read, let alone refute”

Her ethereal, ageless romance with N. having been refuted, she made him over into a nasty suitor – indeed a vengeful spurned man.”

In this contest between fabler and forger, the one sure loser was N. himself.”

P A R T T H R E E . W O M A N H O O D

I. RITES OF LOVE

IN 92 Lou Andreas, 31-year-old virginal wife, and Georg Ledebour, a Marxist journalist and lecturer 11 years her senior, fell in love.” “She insisted on working things out her own way. For months thereafter she lied to the 2 overwrought rivals by turns until she no longer heard what they growled or hissed back at her. She grew numb and skeletal.” “Ledebour married one of his pupils in 95—one of approximately Lou’s own age and social standing whom he had known, like Lou, since 92. She made him a tender companion through a stormy career and—following Hitler’s advent—a long exile.” “Lou’s Ledebour affair paralleled her Nietzsche hoax as her sorriest off-paper attempt since girlhood to impress fantasy upon reality. Even so, it was her farthest advance toward womanhood to date—a roundabout advance as if to a 2nd adolescence, this one compelling. Her first documented amour since her marriage, it was also her last with an older man: thereafter, while remaining a child-wife at home, she resumed her maidenly coquetterie abroad with new earnestness.”

Lou also made acquaintances fleetingly with August Strindberg, tenuously with the lesser playwright Otto Hartleben, and abidingly with the Danish translator Therese Krüger. And early in 92 she met Frieda von Bülow, soon her closest friend.” “A most possessive friend, she nonetheless had mixed, unstable feelings toward Lou, who was unfailingly devoted to her.”

Her next votive offering, Von der Bestie bis zum Gott (From Beast to God), was a delectable scholarly study of how deities, on losing their following, turn satanic and how, conversely, frightful beasts work their way up through totemism to fusion with tribal fathers, then withdraw to the wilderness as divinity sets in.”

Having found Vienna enchanting at first sight, Lou now found it doubly so. Schnitzler was then, on turning 33, a physician who dabbled in letters; only later that year did his drama Liebelei invert the formula overnight.”

II. SUPER-LOU AND RAINER

At Wassermann’s for tea on May 12, Lou was confronted with a veteran poet of 21 who, with huge soulful eyes, ‘narrow shoulders, thin neck’, ‘receding chin and almost no back to his head’, looked to her like a ‘sickly aristocrat’.”

She was far from suspecting his genius. And no wonder, for he was then in his artistic incunabula, which were all sensibility, sentiment, and fancy, in rich effusion.”

(…)

P A R T F O U R . M A T U R I T Y

(…)

II. A PERSONALIZED FREUDIANISM

Puro lixo e devaneio.

III. THEORIZING FOR FREUD

(…)

IV. LIVING FOR FREUD

(…)

V. ASIDE FROM FREUD

At Alvastra in ‘11 Lou seduced Poul (sic) Bjerre after having befriended his wife, an invalid, and laughed down his marital scruples (…) he too had once written on Nietzsche as a mad genius, but expressly to eschew reductive exegetics.” “About then Ellen Key ran into Bjerre, who inquired whether Lou still took Freud so seriously—and Ellen, reporting to Lou, added that Bjerre had just brought out a fine book exposing Freud’s exaggeration of sex.” “Lou’s next was Viktor Tausk, her classmate in Vienna, a Croation (sic) ex-jurist come lately to medicine and psychoanalysis.”

P A R T F I V E . O L D A G E [ O F A H A R L O T ]

I. REVAMPING THE PAST

Reaffirming her individuality by this same token, she treated Freud’s work as a contribution to her existence rather than the reverse.”

By and large, Lou treated other celebrities just like Tolstoi in not letting on how well or ill she knew them and as if her knowing them were a matter of course—though in fact she ransacked her ‘Celebrities’ file to compile 2 chapters teeming with them.”

II. “HOMECOMING”

As the pain eased over the months, she went back from 100 to 125 pounds even on a limited calorie diet—one permitting her chocolate at night in lieu of bread by day.” “Later that year she was laid up in plaster with a broken foot. Her proud calligraphy was reduced to a pencil scrawl—as during her prostration of 2 years before, only this time definitively, for her eyesight was failing.” “Another year or so and her chronic heart ailment had set in for the duration, followed by cancer in a breast that was successfully amputated in mid-35 after she had put her papers in final order and taken leave of the world.”

III. A RETROSPECT

Inclusive as were her cultural concerns, her concerns were that exclusively cultural: nowhere do her own ample annals disclose that, for instance, her life in Germany began under Bismarck and ended under Hitler.” Uma imbecil fora do tempo, mas não atemporal.

a moral monstrosity”

distraught fabler”

post-elaborated beyond recognition”

BEYOND FRAU LOU

Lou changed off fictionalizing techniques continually, but I could not grasp the sense of the changes.”

The stock subjects of intellectual history were extraneous to Lou, who went the Zeitgeist’s way with no guidance from the Zeitgeist. Commonly ideas and their ilk are chronicled as if they developed somehow one from the other or else in response to conditions and events of public life; they developed neither way, however”

* * *

APPENDIX B

How I would deal with a man who spoke that way about me to my sister there is no doubt. For I am a soldier and always will be, I can handle weapons. But a girl! And Lou! I did not at all doubt but that she would at some time cleanse herself of those ignominious deeds in a heavenly way. Dirt! Any other man would have turned away from such a girl with disgust: I too felt disgust, but overcame it again and again. It moved me to pity to see a nobly endowed nature in its momentary degeneration; and, to tell the truth, I spilled countless tears in Tautenburg—not on my own account, but on Lou’s. This trick pity played on me. I lost the little I still possessed: my good name, the confidence of a few people—perhaps I shall yet lose a friend: you (…) Dear friend, I call Lou my sirocco incarnate: not one minute have I had with her that clear sky that I need above me, with or without people. She combines all the human qualities repulsive and hateful to me, and since Tautenburg I have for that very reason put myself to the torture of loving her! (…) I thought you had persuaded her to come to my help: now I see that she is out for amusement and good mental entertainment. And when I think that questions of morality come in there too I am, to put it mildly, revolted.”

Listen, friend, to how I see things today! She is an utter misfortune—and I am its victim. In the spring I thought I had found someone able to help me: for which not only a good intellect but a first-rate morality is needed. I discovered instead a being who wants to have fun and is shameless enough to believe that the most distinguished minds on Earth are just good enough for her fun. As a result of this mistake I more than ever lack the means of finding such a person. I am writing this in clearest weather: do not confuse my sense with the nonsense of my recent opium letter. I am certainly not crazy, nor do I suffer from delusions of grandeur. But I should have friends who warn me in good time about such desperate things as those of last summer. Who could suspect that her talk of ‘heroism’, of ‘fighting for a principle’, her poem ‘To Pain’, her tales of struggles for knowledge, are simply fraud?”

It was a completely futile waste of love and heart—though in truth I can afford it. . . . Lou debases the whole dignity of our striving: she should have nothing further to do with your name and mine. I no longer understand you, dear friend. How can you stand being near such a creature? For heaven’s sake, pure air and highest mutual esteem!”

CONHAQUE E ALL-STAR PRETO: SONHOS DE UM EX-FUTURO PROFESSOR

5 de agosto de 2008

Algo me aflige. E não é como antigamente. Subitamente sinto-me atrofiado: faz tempo que não utilizo polegar e indicador para escrever (a dupla dinâmica). E já há um tempo o ruído do ônibus da madrugada me seduz. NÃO É COMO DAS OUTRAS VEZES!

Não quero mais compartilhar esse excerto – como faria em janeiro, em julho, dia 4 de agosto…

Do que eu preciso? A solidão é a companhia pela qual meu coração neste segundo bate forte. As asas libertadoras da moral dos pais.

Estou farto de não poder caminhar, fumar e ser livre. De escrever o que devia FAZER.

Pouco valor tem a forma. E o conteúdo – se mentira. Passemos à natureza:

Rotina, tempo, submissão – 3 problemas.

Contingência, desamarrar-me, voar.

Neste verbo há algo de encantador: na minha insônia, muito mais. Quero a bem-aventurança – e nada de herança. De que me vale a avareza?

Ninharias. Eu, podendo, atirava fora a TV. Lembrei-me há 10 minutos do Carlos Gomes. A cibercultura –outrossim a Morte de GAIA (o que fazer?).

Quero caminhar até saber o que fazer. Já NÃO DEPENDO DE NENHUMA PARAFERNÁLIA ELETRÔNICA, NEM STRICTO SENSU… Que diabo é o latim?

Eu sou, de fato, MANÍACO?

Vêm meus surtos piorando?

Poderá ser uma virilidade extrema que a sociedade mata. Mas encontro chaveiros esparsos, se as portas estão trancadas!

Ludibrio… com a linguagem.

A resposta da RUA está na CASA.

Uma geladeira dispondo de conhaque; tênis e meias sempre embotados. A esquina, moradia. EU DEMANDO SOLIDÃO. SOLIDÃO INCLUSIVE OBJETAL.

MEA CULPA

Originalmente publicado em 1º de fevereiro de 2009 – com alterações

Tive meus anos de 2005, 2006 e 2007 pautados pelo liberalismo econômico mais ortodoxo. Relacionei-me com veículos de comunicação, pessoas e defendi idéias que não queria – não quereria, é dizer, se pudesse medir as conseqüências hoje. Me defrontei com muitas instituições, programas, crenças e vidas. Gerei polêmica, gerei tumulto. Em sala de aula ou em ambientes de trabalho. É verdade que, receber, eu jamais recebi por isso um só tostão. Até em paradas de ônibus na calada da noite eu me engalfinhei com desafetos (nem que apenas imaginários). Claramente havia uma atmosfera que me infectava, um acontecimento político escandaloso, a desilusão do passado (do infrutífero século XX), um curso superior errado, o impulso por ser contrário ao vigente, personalidades de cuja paralisia eu precipitadamente me alimentava.

Poderia elencar as principais figuras vivas, e os principais projetos em que me engajei (me enredei, vi depois) neste período, plantando desesperança e querendo colher a realização da liberdade: Diogo Mainardi, e sua sedutora e espetacularizante retórica – hoje eu não sei quem é esse homem, o que ele escreve ou deixa de escrever; Ga***** ***** – que me achem, esses indivíduos, no Google, se puderem –, o “presidente inteligente popular amigão” que atualmente enxergo lá embaixo como tendo sido uma trava temporária (ele era presidente de uma ‘limitada’ de adolescentes faz-de-conta, não se formava por incompetência, apenas puxava o saco de algumas patricinhas, era somente uma daquelas crianças rejeitadas que cresceram com seu amor pelos videogames e pelo Tio Sam sem saber o preço de uma amizade); Ra***** *****, um antiquado um pouco mais genioso que a rede de amigos geeks¹ ao seu redor, que pensa em “entabular diálogo” como “impor o meu falo”; professores muito… pessimistas; blogs em que trabalhei “querendo raciocinar em conjunto”, mas em que descobri o sobrepeso da minha opinião pessoal, dentre os quais o Abrigo Polar, o Horário de Brasília, As Fantas, o Bicarbonato de Sódio. Mi******, talentosa mas desorientada, R*****, Ma*****, um maluco ou outro da internet, Peu L*****, o adulterador de textos, Ca****, a chefe invocada, M***** S****, a de humor contagiante, colegas de ex-faculdade (ou ex-colegas de faculdade), todos me passam batido. Tem ainda o demoro.com, os jornais em que estagiei como clandestino. Seria impossível lembrar de tudo de uma lapada só.

¹ Cabe aqui esclarecer por que utilizo geeks e não nerds, uma etimologia arruinada que confundiria meu leitor – enquanto ser pensante eu ser considerado na maioria dos círculos jovens como nerd, com ou sem óculos, é auto-explicativo o bastante. Meu conceito de nerd/geek é: aceitar o mundo adulto só no que ele tem de eufórico: o aumento de poder, o carro, a bebida, as mulheres, as festas, as compras, poder olhar de olhos caídos alguém na rua e rumar para casa. Mas recusar as responsabilidades. Às vezes o nerd lê quadrinhos demais e esquece que por trás de toda a tecnologia do fabrico e a aparência há o fator humano e que nem tudo é uma rodada no Outback. Como o tio Ben do Homem-Aranha já dizia… (a frase todo mundo sabe) Porém, ninguém aqui quer saber o que implica o trabalho. Quando você cresce e seus amigos não, fica essa dificuldade de definição: o que há com eles? É precisamente isso: um estranhamento inter-geracional, porque você amadureceu mais depressa.

Este artigo não pode se resumir à modalidade acusatória. Também trago uma receita para um melhor entendimento de onde se pisa: 1) caminhar muito ao ar livre, se possível debaixo de sol forte e com roupas pesadas. Ou melhor: tentar os mesmos trajetos em diferentes horas do dia. Quando se está um pouco bêbado e se passa por uma cidade suja, escura, desolada e insolúvel não se acredita mais no capitalismo. 2) de vez em quando desligue a música e a TV e coma uma refeição em silêncio!

Continuando o que ia dizer, 2008 foi o ano da virada. E este texto é só mais uma pedra.

O MELHOR GOLE D’ÁGUA

Originalmente publicado em 22 de janeiro de 2009

Hoje eu compreendo o sentido de três mudanças na minha vida: ter sido expulso do Colégio Militar; ter rompido com a quase totalidade dos meus colegas de curso; não ter me casado. Quando Nietzsche formulou o conceito de Deus ex machina¹ ele escrevia a serviço do cristão Richard Wagner. O Deus ex machina, se fosse atualizado, seria entendido como parte do indivíduo e de sua força – o sabor da roda do acaso. Sinto que estas três linhas divisórias da minha vida foram de obtenção inconsciente. Mas é o inconsciente nossa verdadeira fatalidade.

¹ Não “formulou”, mas utilizou de forma muito característica em seu primeiro livro. – 01/01/21.

Não houvesse sido inconseqüentemente submetido a processo disciplinar na escola-quartel em que estudava aos 14 anos, provavelmente hoje eu teria profunda ligação com amizades daquele tempo. Faria parte de um círculo razoavelmente sólido na Universidade de Brasília. Gosto de pensar que sou um barco à deriva ao invés de uma ilha, então minha base fluida me permite conhecer novas águas. Hoje eu entendo a modalidade de comportamento daqueles garotos, uma vez crescidos, como não tendo sido alterada mesmo após tantos anos. Sinto uma diferença muito dilatada entre nossos pontos de vista. Eles são minha antinomia: os filhos, os profissionais e os cidadãos que eu jamais seria. Conversas tediosas, rotina hedonista (cujo sinônimo mais próximo é “pessimismo”: falta de capacidade e de claridade mental para suportar a dor e até querê-la, como nascedouro de novas vitórias), projetos ligados ao dinheiro e falta de discernimento psicológico. Sem dúvida esta última característica é a que mais me irrita: não conseguem compreender as atitudes dos outros (eu posso estar feliz com a cara mais séria!). Tal deficiência é óbvia, pois seus universos são como a viseira de um cavalo.

O mesmo problema – exatamente o mesmo – se verifica entre novos jovens. Não tão novos assim: parecem cópias dos primeiros. Ao entrar no curso de sociologia, procurei avidamente me entrosar. Conhecimento e reconhecimento instantâneos. Estava caindo na mesma cilada de quatro anos antes sem perceber. Mas novamente houve uma interferência do que eu posso chamar de “o manobreiro-eu”, sua parte mais colada à essência, sua personalidade verdadeira, que opera sua casa-das-máquinas. Contra os incuráveis hedonistas – perguntem-nos por que bebem tanto, o que querem esquecer, por que preferem a palavra “solução” a “problema”! – encontrei a solução da mímica: me tornei o superlativo do beberrão. O que aconteceu depois disso foi a quebra de um dente da frente numa escada e o dano moral. Finalmente o operador se recostou aliviado e emitiu um suspiro: seu pupilo absorveu o recado. Pude iniciar meus rompimentos no campus: uma série que ainda não acabou. Disposição havia, mas faltava o motivo: um para cada um, como seria desgastante! Mas, ao fim, bela manobra! Infelizmente, depois de baixar a poeira, percebi que algumas cabeças permaneciam fiéis. Mas eram fidelidades que doíam. Querer-se todo para si: esse é o extremo do amor! O próximo trabalho, em curso, está sendo revolver essa gente, que também me faz sentir apequenado. Já não basta a carência de rivais dignos, para injetar um pouco de graça? O que há no momento são mil sombras indiferentes e alguns adolescentes que ainda me incomodam por estarem do lado que se chama de “os amigos”: não há grupelho mais propenso a destruir o que um tem de mais valoroso do que esse. É preciso tomar muito cuidado com cada coisa que deles se ouve e com cada postura que eles sub-repticiamente nos incitam a tomar.

Meu plano inicial – e falo de outro tipo de relacionamento agora, ocorrido cronologicamente entre esses dois primeiros marcos citados – era terminar a faculdade de jornalismo já despachando num jornal e me casar. Havia pressão da namorada para que isso acontecesse, e como ela era “o bem mais precioso” eu tinha de me esforçar. Uma vida inteira ao lado de quem se ama, a segurança sexual almejada pelo homem, quem sabe daí a vôos mais altos: lindos filhos, a propalada vida do bem-estar. Era o vírus do hedonismo, do ser humano sempre apático diante do que a vida tem para oferecer, esse querer-se enclausurar num conto-de-fadas, que me atacava outra vez. Como o ferrão de uma abelha, ou a agulha de uma injeção, de quem espera a anestesia, a sonolência, a amnésia profunda. Eu havia me esquecido que o amor perverte mais do que a amizade, é a amizade que dorme consigo na cama! A amizade de papel lavrado. A amizade não é o problema. Mas ser a amizade errada, e não sabermos onde raios se encontram as certas. Parece que não há naturezas como a minha. É esse o preço a se pagar por se desejar um pouco de desafio, querer tomar um gole d’água gostoso, e não porque se diz por aí que beber água faz bem para a saúde? Que bem é esse? Viver mais enquanto se nega a viver? Minha potencial noiva se apaixonou por outro e o sonho americano foi pulverizado. Aos 20 anos, eu confesso que sei demais: muito mais do que jovens hedonistas, cuja preguiça me cansa. É preciso aprender, tolinhos, que o gole d’água só é gostoso quando se está com sede…